Vivo de despir as olheiras ao sono. Este trabalho não me deixa
dormir e não há remédio para isto.
Ainda alguém me dará a loucura por pão um dia.
Não é possível que alucine e que obceque tanto
este desejo de ser leve,
de estar longe.
Mas ainda um dia eu terei a asa como vocação,
irei buscar aquela pronúncia nua
e interior das alturas
quando dizemos pássaro ou ave
ou gravitação.
Há uma ambição paciente neste modo de estar,
de querer tocar a vida por cima,
como se nela houvera um cume
ao qual nos é vedado chegar.
(…)
Quero esta humilde e real ilusão,
esta redonda janela intemporal
onde o peso se suspende, flutua
e para onde a vida tende.
(de “Poemas da Ciência de Voar e da Engenharia de Ser Ave”)
Poeta moçambicano. Obteve o prémio nacional de poesia em 1995. Obra poética: “Amar sobre o Índico” (1984), “O País de Mim” (1989), “Poemas da Ciência de Voar e da Engenharia de Ser Ave” (1992), “Os Materiais do Amor seguido de O Desafio à Tristeza” (1996), “Janela para Oriente” (1999).