SOBRE A UCRÂNIA, SOBRE PERGUNTAS QUE NÃO FAZEMOS, SOBRE RESPOSTAS DE QUE PRECISAMOS – a partir de MAX FISHER E WASHINGTON POST FOREIGN STAFF e de LEONID PEISAKHIN

Selecção, organização  e tradução por Júlio Marques Mota

UM TRABALHO FEITO ESPECIALMENTE A PARTIR DO TEXTO  DE MAX FISCHER, 9 QUESTIONS ABOUT UKRAINE YOU WERE TOO EMBARRASSED TO ASK, E DO TRABALHO DE LEONID PEISAKHIN,  WHY ARE PEOPLE PROTESTING IN UKRAINE? PROVIDING HISTORICAL CONTEXT, AMBOS PUBLICADOS NO WASHINGTON POST
PARTE II
(continuação)

3. Eu ouvi isso mas que isso era porque os ucranianos querem laços com a Europa enquanto o seu governo os quer vender a Moscou. Será isso?

Isto é uma parte da verdade, – muitos ucranianos querem ver o seu país a ser “europeu” em vez de estar ligado à Rússia, e Yanukovych é seguramente um partidário do alinhamento com Moscovo – mas contém também uma espécie de mentira. Sim , cerca de metade dos ucranianos dizem que querem o acordo com a União Europeia. Mas outro terço dizem preferir a integração com a União Aduaneira da Eurásia russo dominada pela Rússia. Então a Ucrânia está mais dividida do que se pode estar a pensar.

Uma ideia sobre as preferências de alianças dos ucranianos:

Ucrânia - II

Aqui está o que devemos entender: a Ucrânia está dividida. Profundamente, profundamente dividida pela linguagem, pela história e pela política. Um terço do país fala russo como sendo a sua língua nativa, e na prática, ainda há mais gente que utiliza  a língua russa no dia-a-dia. As pessoas que falam russo vivem, na sua maioria, numa metade do país; os ucranianos que falam ucraniano vivem maioritariamente na outra metade o. A compreensão desta realidade é imediata quando olhamos para o gráfico acima.

Não é somente a Ucrânia que está dividida em duas metades que falam predominantemente línguas diferentes. Eles têm uma política diferente – e visões diferentes para o seu país. Analise o conjunto dos quatro mapas: os dois primeiros, em cima,  mostram a língua e a clivagem étnica, os outros dois, abaixo, mostram os resultados eleitorais para as eleições presidenciais de 2004 e 2010. As linhas são idênticas!

Ucrânia - III

O gráfico de cima à esquerda: a zona da Ucrânia em que se fala russo está a azul. O mapa de cima à direita: principais grupos étnicos e linguísticos. O gráfico de baixo à esquerda mostra os resultados da eleição presidencial de 2004. O mapa de baixo à direita , os resultados eleitorais das presidenciais de 2010. A metade ocidental do país votou esmagadoramente contra Yanukovcyh; é também aqui, até muito recentemente, que se têm verificado a maioria dos protestos.

A língua russa, a metade oriental da Ucrânia tende a ser, sem uma grande surpresa, mais pró- russa. O Presidente Yanukovych é desta parte do país , tem aí a maior parte de seu apoio e nem sequer falava ucraniano até ter chegado aos  50 anos.

Os protestos pró acordo com a EU  têm-se verificado  principalmente na  zona de língua ucraniana, na metade ocidental. Essa também é a metade que votou esmagadoramente contra Yanukovych em 2010. ( Isto tem vindo a mudar desde a lei anti- protesto , que inflamou a raiva em todo o país com Yanukovych. )

Essa divisão tem sido um desafio para a Ucrânia, uma vez que só alcançou  a independência em 1991. As eleições  foram dividida  quase igualmente entre as duas metades , puxando o país em direcções opostas. Como o cientista político, especialista nas questões sobre a  Ucrânia, Leonid Peisakhin   colocou, ” a Ucrânia nunca foi e não é ainda uma unidade nacional coerente com uma narrativa comum ou um conjunto de aspirações políticas mais ou menos comummente compartilhadas. “

De certa forma, esta crise é sobre a raiva popular contra um presidente que tem  mal  gerido as questões da  economia e cujas tentativas de reprimir protestos têm  caminhado  para o autoritarismo. Mas é também sobre a longa e nunca  resolvida crise de identidade nacional da Ucrânia. Esta história é muitas vezes enquadrada como a Ucrânia está a ser  puxada, para um lado, por  Moscou, e pela Europa, para outro lado. Mas os  próprios ucranianos também fazem muita pressão  : um conflito de   22 anos entre as  duas metades, entre as duas identidades.

Os protestos em defesa do acordo com a UE deram-se principalmente, na metade ocidental, na parte em que se fala a língua ucraniana. Essa também é a metade em que votaram esmagadoramente contra Yanukovych em 2010. (O que tem  mudado desde a lei anti-protesto, que inflamou a raiva em todo o país com Yanukovych).

Esta divisão tem sido um desafio para a Ucrânia desde que esta ganhou a sua independência em 1991. As eleições têm sido praticamente semelhantes todas elas dividindo igualmente o país em duas metades, a puxarem o país em direcções opostas. Como o cientista político especializado  sobre a Ucrânia, Leonid Peisakhin , afirmou ” a Ucrânia nunca foi e ainda não é uma unidade nacional coerente com uma narrativa comum ou um conjunto de aspirações políticas mais ou menos comumente compartilhadas.”

.Em certos aspectos, esta crise é mais sobre a raiva popular contra um presidente do que um falhanço da economia e cujas tentativas de anular protestos está coberta pelo autoritarismo. Mas é também sobre a não resolvida crise de identidade nacional de longo – prazo da Ucrânia. Esta história que é muitas vezes enquadrada, pela forma como a Ucrânia está a ser puxada por Moscovo por um lado e pela Europa , por outro lado. Mas os próprios ucranianos estão a puxar muito a corda: 22 anos de conflitos entre as duas metades e entre duas identidades.

(continua)

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Para ler a Parte I deste trabalho sobre a Ucrânia, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

SOBRE A UCRÂNIA, SOBRE PERGUNTAS QUE NÃO FAZEMOS, SOBRE RESPOSTAS DE QUE PRECISAMOS – a partir de MAX FISHER E WASHINGTON POST FOREIGN STAFF e de LEONID PEISAKHIN

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