FRATERNIZAR – E MÁRIO COLUNA CHOROU – por Mário de Oliveira

001

Visita-afronta de Passos Coelho

Ninguém me disse, nenhuma tv filmou o facto, mas Mário Coluna, moçambicano de nascimento e jogador maior do Benfica e da Selecção nacional, ao tempo do fascismo e do colonialismo português em África, chorou, ao ver que o primeiro-ministro do antigo estado colonial foi profanar com flores compradas o chão onde jaz o seu cadáver, e dizer umas hipócritas palavras de circunstância às tvs que o seguem como cães fiéis ao dono. Para cúmulo, na presença da viúva e das filhas do casal. É sempre assim, quando um agente do Poder decide autocraticamente invadir o chão de um povo, de uma família, de um ser humano. Porque o agente do poder e o poder, enquanto tal, lá, onde entrarem, sempre invadem, sempre profanam, sempre actuam ao seu jeito mentiroso, hipócrita, assassino. No caso, bem se pode dizer que Passos Coelho matou Mário Coluna, recentemente falecido em Moçambique. Não o fez em vida. Fê-lo agora. Nem depois da sua morte teve respeito por ele. E, sem mais aquelas, invadiu o chão onde jaz o seu cadáver e deixou tudo profanado. Nas mãos dos agentes dos poderes, até as flores, pior, se compradas, são outras tantas armas de caluniar e de matar. Porque o poder nunca levanta ninguém. O poder sempre humilha/subjuga, mesmo quando parece levantar, homenagear. É intrinsecamente perverso. E, por isso, Mário Coluna, cidadão íntegro e humano, incorruptível, chorou. De cólera, a dos justos. E de indignação, a dos honestos. Também de protesto, o dos incorruptos.

 A indignidade institucional aconteceu dia 26 de Março 2014. Para que conste. E ninguém esqueça. Infelizmente, as populações que o poder faz nascer cegas, mantém cegas a vida inteira e deixa que morram cegas, não vêem a realidade. Ficam-se pelo manto. Pela máscara com que o poder sempre se apresenta vestido, para que ninguém veja que vai nu. Passos Coelho, seu agente, é um cadáver político que viaja por todo o lado. Veste fatos a rigor. Perfuma-se a rigor. E as populações que vêem a máscara, não vêem que ele é um cadáver político. Só um cadáver político pode reduzir o País ao estado a que Portugal chegou. Um País que, para sobreviver, tem de emigrar, tem de suportar a fome, tem de abandonar a universidade, tem de frequentar diariamente cantinas sociais, tem de morrer de solidão e de desespero, inclusive, nos hospitais, tem de deixar de dar à luz filhas e filhos. E tornar-se um deserto. Ou um nacional armazém de velhas, velhos, à espera da morte que as, os tire deste degredo.

 ário Coluna chorou. Eu sei, porque mantemo-nos em ininterrupta comunhão. A morte que, recentemente, lhe aconteceu em Moçambique, não é o fim da vida. É a plenitude da vida. Só o poder mata definitivamente. E criminosamente. A morte não. É a vida que inventa a morte, para que cada ser humano que vem a este mundo possa prosseguir vivente para sempre. Inventa a morte, como inventa o útero da mulher e o parto. Não morremos. Damos, por fim, um espantoso salto qualitativo em frente. Tornamo-nos definitivamente viventes, por isso, definitivamente invisíveis. Mas em ininterrupta comunhão, ao modo dos vasos comunicantes. Eu sou, mais todos os outros que me precederam e que se me seguirão no espaço e no tempo. Somos relação. Somos comunhão. Ninguém é uma ilha, ainda que o poder faça tudo para que sim. Mas nada pode perante a morte, invenção da vida! Com a morte, somos finalmente irmãos, vasos comunicantes. Plena e integralmente humanos. Sem nada de poder. Nós, simplesmente. Bendita, pois, a nossa irmã morte.

 A única morte que havemos de temer é a que o poder causa, provoca, faz. Primeiro, em quem se dispõe a servi-lo, como um agente seu, porventura carregado de privilégios, como o primeiro-ministro de um país, ou o papa de Roma, lá em cima, no topo da pirâmide social, com as respectivas populações do pais e do mundo como capacho dos seus pés. A mim, não apanha o poder. Seria o meu suicídio como ser humano. A nossa grandeza, é sermos humanos, não divinos, poder. Por isso, o lema, Tudo pela vida contra o poder, nada pelo poder contra a vida!

 Mário Coluna chorou como só os definitivamente viventes são capazes. Os cadáveres políticos, financeiros, eclesiásticos, nunca choram. Fazem chorar. Tudo neles é putrefacto. Por onde passam, deixam um rasto de morte e de mau cheiro. O poder, todo o poder, é o Lázaro de que nos fala o Livro JESUS SEGUNDO JOÃO, cap. 11 (ainda não conhecem?!). Por mais que viaje pelo mundo, é um cadáver há 4 dias no túmulo e que já cheira mal, muito mal. Os familiares de Mário Coluna tiveram que fazer o frete e prestaram-se àquele triste papel. Foram usados. Traíram a sua própria dignidade e a dele. Regressaram a sua casa menos eles próprios, porque o poder tem esse triste e desgraçado condão. Amesquinha e entristece tudo o que toca. Se beija, o seu beijo é igual ao de Judas. Entristece, deprime, mata.

 Quando eu me transformar em definitivamente vivente, mediante a morte, que nenhum agente de poder pronuncie, alguma vez, o meu nome. Só as vítimas podem, então, dizer o meu nome. Mas, ao dizê-lo, têm de levantar-se em sucessivas conspirações/insurreições políticas. Porque para isso nascemos e viemos ao mundo. Para sermos conspirações/insurreições políticas, até que o poder deixe de ter quem o sirva e, em seu lugar, fique o nada! O meu abraço de comunhão, Mário Coluna, meu irmão!

www.jornalfraternizar.pt.vu

Leave a Reply