FRATERNIZAR – 515 anos de idolatria, de hipocrisia, de falsa misericórdia – por Mário de Oliveira

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O novo cálice de ouro da Misericórdia do Porto

A Misericórdia do Porto acaba de celebrar 515 anos de existência. O evento faz a manchete do semanário da respectiva diocese. Uma manchete cheia de idolatria, de hipocrisia, de falsa misericórdia. O pico da celebração que se iniciou, como é típico da rotina eclesiástica, com uma missa (mais uma!), no caso, presidida pelo bispo António Taipa e concelebrada pelo capelão-mor da Misericórdia, P. Américo Aguiar, foi a mostra, em primeira mão, do novo cálice de ouro que a Misericórdia acaba de mandar produzir, como obscena expressão da sua idolatria, da sua hipocrisia, da sua falsa misericórdia.

A missa episcopal foi o começo do evento povoado de gente graúda. Trata-se, como se sabe, de um rito litúrgico, mecanizado do princípio ao fim. Não tem um pingo de criatividade humana. É sempre a mesma cassete. Tido como o supra-sumo do cristianismo, no dizer da liturgia católica e da teologia dos sacramentos. Na realidade, não passa de um rito cheio de nada que tem o triste condão de anestesiar as pessoas e de as manter, por toda a vida, nas suas rotinas. Tudo, do princípio ao fim, é faz de conta. Por mais pompa e circunstância com que o rito se apresente. As pessoas saem sempre piores do que entraram. Saem vazias de sentido. Ou, então, animadas de um sentido sem sentido, porque completamente fora da realidade histórica.

A missa é o antípoda das Comidas de Jesus. Tal como o corpo de cristo é o antípoda do corpo de Jesus. É o culto do mito, o culto sem cultura, sem realidade. É vaidade, hipocrisia, idolatria. Quem a frequenta nunca regressa dela mais humano. Sempre regressa mais hipócrita, mais fingido, mais emproado, mais fora da realidade. A realidade é a nossa vizinha, o nosso vizinho, é a outra, o outro distinto de nós e que vive paredes-meias connosco no mesmo planeta. E com quem nunca conversamos, nunca queremos que frequente a nossa casa, menos ainda, a nossa mesa. E foi também assim esta missa dos 515 anos da Misericórdia do Porto, outros tantos anos de idolatria, de hipocrisia, de falsa misericórdia. A que a presença do Bispo Auxiliar do Porto emprestou ainda mais vaidade, mais hipocrisia, mais falsa misericórdia.

Aos irmãos (nas Misericórdias sem misericórdia, muita vaidade, muita hipocrisia, muita idolatria, aos membros, chama-se-lhes “irmãos”!!!) que se aposentaram, foi-lhes entregue, na ocasião, um livro. Já aos que completaram 25 anos como colaboradores ainda activos – pelos vistos, aquilo é vitalício, tamanhos são os proveitos de diversa ordem que a Misericórdia garante a quem a integra! – foram entregues pinos de prata, uma caricata expressão de vaidade e um sinal exterior de riqueza, a revelar que a Misericórdia do Porto não deixa os seus créditos por mais alheias. E, por fim, todos os presentes na sessão foram, depois, visitar a exposição instalada na galeria dos benfeitores, onde figura, em grande destaque, o novo cálice de ouro da “Santa Casa da Misericórdia do Porto, produzido à memória de todos aqueles que ao longo dos séculos doaram bens a esta instituição”. As aspas acabadas de utilizar aqui, indicam que se trata de uma citação do texto da manchete que ocupa a quase totalidade da primeira página da VP, de 26 Março 2014!!!

Mas o mais revelador da celebração dos 515 anos estava ainda para vir e aconteceu, quando o Provedor em funções, António Tavares, explicou aos presentes como nasceu o novo cálice de ouro. “O cálice de Arouca, uma peça de referência no acervo artístico da Misericórdia, doado pelo Padre Manuel Cerqueira Vilaça Bacelar, vindo de um dos conventos extintos em 1834, parecia merecer um parceiro mais contemporâneo.” E assim se decidiu fazer, ou não fosse verdade que ouro atrai ouro, cálice de ouro atrai cálice de ouro. Aliás, sem ouro/Dinheiro, nem sequer haveria cristianismo, tão pouco haveria Santa Casa da Misericórdia do Porto, muito menos haveria toda esta hipocrisia e toda esta ostentação dos ricos, a coberto da “Santa Casa da Misericórdia”. O que o nome esconde, nunca chegaremos a saber, porque qualquer máfia que se preze, abate na hora aquele dos seus membros que puser a boca no trombone!

Pois bem, quando a Misericórdia do Porto decidiu meter mãos à obra, eis que sucedeu um milagre! “No processo preparatório de constituição do Museu, a limpeza do cofre do Arquivo Histórico revelou a existência de alguns envelopes, uns do século XIX, outros do século XX”. O que continham eles? Ouro, senhoras, senhores! Os envelopes continham ouro, “na forma de alianças anónimas de casamento e de outras peças de ourivesaria.” É a partir deste ouro anónimo e outro que se lhe juntou – a Misericórdia é rica e muito cobiçada pelos homens que fazem do Dinheiro o seu deus cristão – que se produziu o novo cálice.

Esqueceram-se, por certo, os que assim agiram, que já nos remotíssimos tempos do Moisés bíblico, o seu irmão Aarão, sacerdote (o embrião da Máfia que é o judaísmo como sistema e que tem continuidade bem sucedida no cristianismo do actual papa Francisco), fez, na ausência daquele, um apelo aos hebreus no deserto, para que se desfizessem dos seus adereços de ouro e lhos entregassem. E não é que aqueles ex-escravos foram pela sua cantilena, como hoje os fiéis vão pela cantilena de párocos e de pastores protestantes? Nasceu, então, o célebre bezerro de ouro, o único deus que os sacerdotes e pastores dos sistemas de poder – o cristianismo é o mais conseguido até ao momento! – reconhecem, cultuam, impõem aos seus fiéis. Desta máfia cristã, sacerdotal e eclesiástica, faz parte – e que parte! – a Santa Casa da Misericórdia do Porto e os seus irmãos.

Ah! e que foi feito dos pobres, de que ela se serve para encobrir os seus crimes? Nesta celebração dos 515 anos de existência, ninguém deu por eles. Só são tidos e achados, quando convém limpar a imagem da Misericórdia e, se for caso disso, proceder à lavagem de dinheiro sujo. Tudo no segredo dos deuses e a coberto de certas acções de bem-fazer. Uma crueldade santa e cheia de misericórdia, perdão, de idolatria, de hipocrisia, de falsa misericórdia!

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