JOÃO MEDINA, O EXÍLIO E A PROVENÇA – por Clara Castilho

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saudades da provença.Um livro pequenino (no formato), que se lê com o gosto da leitura de quem escreve bem, de quem é inteligente, “professor” na reflexão a que nos induz. Estou a falar do livro “Saudades da Provença” e “A Orelha de Van Gogh”, de autoria de João Medina, das Edições Colibri, e publicados em 2013.

João Medina, professor catedrático jubilado de História na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, nasceu em Lourenço Marques (hoje Maputo), em Moçambique (1939), licenciou‐se em Filosofia na Universidade de Lisboa (1966) e doutorou‐se em Sociologia na Universidade de Estrasburgo (1970), tendo ensinado, de 1970 a 1974, na Universidade de Aix‐en‐Provence (França). Após o 25 de Abril de 1974, regressou ao seu país, ingressou na universidade e foi Director‐Geral no Ministério da Comunicação Social (1975‐1977), regressando depois ao ensino universitário na Facuildade de Le3tars de Lisboa, jubiladando-se em 2008. Ensinou ainda nas Universidades de Colónia (Alemanha), Pisa (Itália), USP (São Paulo, Brasil), Johns Hopkins University e , ptro duass vezes (1993 e 1997) na Brown University (Estados Unidos). Fez conferências nos Estados Unidos da América do Norte, Espanha, Brasil (Universidades de Brasília, USP, Unicamp, Araraquara, Assis, etc.), Alemanha (Bona, Rostock,
Francoforte e Colónia), Itália, França, Moçambique (Universidade Eduardo Mondlane), Israel, etc..

O livro compõe‐se de dois textos sobre a Provença, um diário íntimo de férias passadas em Bonnieux, no Luberon, e uma cena dramática constituída pelo diálogo entre van Gogh e a sua orelha esquerda, antes de a cortar.  Apreciem: “Porque, essencialmente e no fundo, é sempre a mágica Provença, do seu encanto, fascinante atmosfera de solenidade e beleza sem par que aqui me ocupo, mesmo falando dum episódio tão dramático como o gesto alucinado do pintor holandês. (p.7) […] Para me situar na Aix onde vivi os anos derradeiros de expatriação, tenho de voltar à e  encantadora praceta dos Quatro Golfinhos, o meu recanto mais acarinhado durante o tempo que aqui passei, sentando-me de quando em quando no rebordo da fonte desenhada no séc. XVII por Claude Cambot, ouvindo jorrar das bocas dos quatro cetáceos barrocos os fios tranquilos de água, com a sensação de que estava ali, de certo modo, o umbigo do universo ou, pelo menos, o meu meridiano de exilado à espera que em Portugal a Força das Coisas acabasse com a Ditadura e me permitisse retomar o meu destino de pobre lusíada desgarrado, encalhado, aguardando que a maré da História me fosse soltar daquele rochedo amável a que estava atado. (p. 17) […] um dia, ao chegar atrasado a um colóquio do departamento de estudos luso-brasileiros, na Faculdade de Letras de Aix-en-Provence, deparei com expressões de espanto e apreensão nos rostos dos colegas e alunos que me olhavam com especial atenção: só num intervalo alguém me veio comunicar a notícia essencial que até ali m escapara, nesse 25 de Abril do ano de 1974, em Portugal, e que tornaria aquela data inesquecível no rol dos dias apagados que passam. Hesitante entre a certeza de que uma revolução feita pelas forças armadas só poderia ter um sentido positivo e libertador e o receio de que, ao invés, um quartelazo viesse a agravar a situação ditatorial de um país há treze anos desencaminhado numa sinistra guerra colonial em três frentes africanas, a verdade é que uma convicta certeza de que a dialéctica histórica nos forçava a escolher o caminho da Liberdade, aquele que me permitiria, dali a pouco mais de um mês, retomar a carreira que ambicionava no meu país, não naquela pátria emprestada e indiferente aos meus tormentos de expatriado.”(p. 18).

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