PALAVRAS DUM CERTO MORTO, de ANTERO DE QUENTAL
Há mil anos, e mais, que aqui estou morto,
Posto sobre um rochedo à chuva e ao vento:
Não há como eu espectro macilento,
Nem mais disforme que eu nenhum aborto…
Só o espírito vive: vela absorto
Num fixo, inexorável pensamento:
«Morto, enterrado em vida!», o meu tormento
É isto só… do resto não me importo…
Que vivi sei-o bem… mas foi um dia,
Um dia só… – no outro, A Idolatria
Deu-me um altar e um culto… ai! adoraram-me,
Como se eu fosse alguém! como se a Vida
Pudesse ser alguém! – logo em seguida
Disseram-me que era um Deus… e amortalharam-me!