PALAVRAS DUM CERTO MORTO, de ANTERO DE QUENTAL

Imagem1

 

PALAVRAS DUM CERTO MORTO, de ANTERO DE QUENTAL

(1842 - 1891)
(1842 – 1891)

 

 

 

Há mil anos, e mais, que aqui estou morto,

Posto sobre um rochedo à chuva e ao vento:

Não há como eu espectro macilento,

Nem mais disforme que eu nenhum aborto…

 

Só o espírito vive: vela absorto

Num fixo, inexorável pensamento:

«Morto, enterrado em vida!», o meu tormento

É isto só… do resto não me importo…

 

Que vivi sei-o bem… mas foi um dia,

Um dia só… – no outro, A Idolatria

Deu-me um altar e um culto… ai! adoraram-me,

 

Como se eu fosse alguém! como se a Vida

Pudesse ser alguém! – logo em seguida

Disseram-me que era um Deus… e amortalharam-me!

 

 

 

Antero de Quental,
in Sonetos

Leave a Reply