Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
Kurt Von Schleicher : a última possibilidade da república de Weimar contra Hitler
Woyzeck, Kurt Von Schleicher : la dernière chance de la République de Weimar contre Hitler
L’Espoir, 5 de Junho de 2014
Propomos-vos a partir de hoje uma série de textos sobre Kurt Von Schleicher, o último chanceler alemão antes da ascensão ao poder de Adolf Hitler. Trata-se de uma biografia de Von Schleicher que nunca foi traduzida em francês de que Woyzeck nos propõe uma tradução inédita. Apesar da brevidade da sua passagem à frente dos destinos da Alemanha, o interesse de Von Schleicher reside na sua compreensão do impasse económico constituído por uma política de rigor e por querer aplicar uma política de expansão económica efectuada pelo Estado e apoiada pelo Reichsbank.
“A perspectiva de resolver a sua mais difícil tarefa do momento, ou seja, a travagem do partido do NSDAP parecia-lhe favorável nesse período . ”
Von Papen torna-se o precursor de Hitler
(primeira quinzena de Janeiro de 1933)
Kurt von Schleicher entrou neste novo ano de 1933 com a decisão de defender a aplicação dos seus dois compromissos aos quais tinha consagrado até agora todos os esforços: contribuir para o desmantelamento do NSDAP graças às actividades de Strasser e continuar a constituir um eixo defensivo que reunisse numerosos partidos, sindicatos e a sociedade civil. Ao mesmo tempo, as linhas directrizes da sua política que tinham sido estabelecidas sob a sua orientação cuidada estavam em marcha e deviam em breve funcionar como linha de condução governamental em todos os domínios.
Na sequência dos anúncios feitos na sua declaração radiodifundida de 15 de Dezembro de 1932, tinham sido tomadas medidas para construir uma legislação social adaptada à situação de então, para modernizar a política económica com a nomeação do novo ministro da economia, Warmbold, uma política que encarava igualmente uma nacionalização da indústria do ferro e do carvão.
Ao lado de um aprofundamento da luta contra o desemprego, a política do chanceler Kurt von Schleicher previa medidas para realizar a política de colonização a leste bem como para criar uma organização caritativa para a juventude alemã. Trabalhos preparatórios que prevêem a instauração de uma milícia foram postos em prática, na sequência do acordo neste sentido da conferência mundial para o desarmamento que teve lugar a 11 de Dezembro de 1932 em Genebra.
É por conseguinte difícil seguir a crítica segundo a qual o último chanceler da república de Weimar teria falta de objectivos políticos precisos relativamente às medidas de governo. É necessário e correcto subscrever a ideia segundo a qual as concepções de políticas que Kurt von Schleicher defendia e pretendia aplicar não eram conhecidas nessa época senão por muito poucas pessoas, pois se o fossem teriam encontrado certamente os apoios de importantes camadas sociais da população. Neste contexto, a sua vontade de alterar a composição do gabinete aparece como sendo bastante simbólica quanto à orientação geral da política governamental que queria seguir. Desejava assim trocar certos ministros procedentes do gabinete de von Papen por personalidades não filiadas em partidos políticos e que eram próximos das tendências moderadas dos partidos de extrema-esquerda e extrema-direita. Apesar de todas as dificuldades e dos reveses ocorridos nas primeiras semanas do seu mandato de chanceler, Kurt von Schleicher está ainda ao princípio de Janeiro de 1933 seguro de que a situação global do Reich se possa estabilizar nos meses seguintes, por exemplo, de agora até à Primavera. São as afirmações do presidente do Reich, Hindenburg, segundo as quais os primeiros sinais de inversão da situação da economia podiam aparecer assim como os sinais relativos ao apaziguamento das relações com as potências estrangeiras que reforçaram o optimismo de von Schleicher.
Mas muitos eventos que se iniciaram deste este Janeiro de 1933 foram ao encontro destas expectativas e esperanças. Desde o início do mês, divulgou-se uma notícia muito má. O admirador de Kurt von Schleicher e seu mais fiel aliado, Hans Zehrer, informou que uma entrevista secreta se iria verificar em breve entre von Papen e Adolf Hitler. Kurt von Schleicher primeiramente nem quis acreditar. Até porque a amizade entre esses dois homens se tinha danificado seriamente nos últimos tempos, ele não deu crédito a uma tal conduta por parte de von Papen.
A reunião, que teve lugar em 4 de Janeiro, na casa do banqueiro Kurt von Schröder em Colónia, encontrou um eco muito amplo na literatura secundária. Isto é o que geralmente é tido como um evento decisivo no desenvolvimento das quatro semanas que se seguiram e que teve como resultado final a ascensão de Adolf Hilter ao poder. Podemos até mesmo considerar esta reunião como o acto marcante do nascimento do ‘Terceiro Reich’.
Não é fácil saber de onde provinham as primeiras instigações relativas a estas reuniões. As hipóteses contradizem-se. Em todos os casos, foram von Schröder, que já tinha feito a propaganda política nos círculos da indústria a favor de Adolf Hitler e do partido nazi, e Wilhelm Keppler, o encarregado das questões económicas de Hitler, quem estabeleceu os primeiros contactos. Ele então perguntou a von Papen em 16 de Dezembro de 1932 se este último estava pronto para uma troca com Hitler. Von Papen respondeu positivamente, mesmo se estranhamente parecesse que não tenha dado nenhuma importância ao pedido que lhe fora feito e que por isso mesmo não pensou mais nisso. Esta é a razão devido à qual ele não informou von Schleicher. No entanto, também não o informou no final do mês de Dezembro, das modalidades deste encontro, que permaneceu estritamente confidencial.
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