A ALEMANHA, O SEU PAPEL NOS DESEQUILÍBRIOS DA ECONOMIA REAL- O OUTRO LADO DA CRISE DE QUE NÃO SE FALA UMA ANÁLISE ASSENTE NA DIVISÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO[1] – I . A ALEMANHA: CONTAS EXTERNAS E FINANCEIRIZAÇÃO POR PROCURAÇÃO, por ONUBRE EINZ – I

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Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

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A Alemanha, o seu papel nos desequilíbrios da economia real- o outro lado da crise de que não se fala

Uma análise assente na divisão internacional do trabalho[1]

Uma colecção de artigos de Onubre Einz.

I . A Alemanha : contas externas e financeirização por procuração

Disponível em: http://usacrise.com/wordpress/?p=28.

 

Começamos uma série de artigos  sobre a Alemanha, examinando as suas contas externas. Esta decomposição permite destacar as diferenças marcantes entre a situação dos Estados Unidos e a da Alemanha.

Os EUA literalmente sacrificaram o bom comportamento das suas contas externas em nome de um modelo de crescimento através da desindustrialização do país e da financeirização da economia. A Alemanha tomou o caminho inverso. Esta  manteve as contas externas em equilíbrio e uma forte base industrial que se está agora a enfraquecer devido à passagem dos produtos Made in Germany aos produtos Made by Germany.

E, contudo, uma leitura cuidadosa dos dados publicados pelo Bundesbank complica um pouco as coisas. A Alemanha não é um país onde se verifique uma correlação estreita entre o crescimento do património acumulado pelas famílias  e o desenvolvimento de um enorme mercado financeiro. A Alemanha é um país que se financeiriza subtilmente; Pela nossa parte a expressar esta  realidade dizemos  que ela se financeiriza por procuração sem procurar explicar os seus porquês.

Somos assim levados a duas direcções:

  1. a interrogarmo-nos posteriormente sobre o modelo de crescimento alemão e examinaremos se os traços do capitalismo americano não estão presentes de forma discreta no modelo de crescimento alemão. A presença dessas características pode ser um sinal de um inevitável declínio.

  2. podemos assim preparar o caminho para uma importante questão, sobre a possibilidade de uma mudança do capitalismo para novos horizontes geográficos; Este é o problema subjacente a este novo blog.

Usamos os dados do Bundesbank para reconstituir as contas externas da Alemanha. O Bundesbank decompõe as contas externas da Alemanha utilizando a grelha International Financial Accounts (IFS) do FMI. A balança de pagamentos é apresentada por rúbricas de acordo com um esquema ternário habitual: importações, exportações, saldo da balança. Por outro lado, o Bundesbank não dá o detalhe das contas financeiras em on-line, só coloca os saldos. É uma pena, porque o exame de detalhes das contas financeiras não é tão preciso como gostaríamos.

Os dados publicados não são destinados ao público em geral: expressos em dados mensais, é necessário fazer um grande trabalho de compilação para os anualizar.

Estas deficiências de algumas estatísticas alemãs não nos impedirão de tirar conclusões picantes sobre o modelo alemão de crescimento.

A – Os dados gerais.

Onubre Einz - I

A evolução  geral das contas externas  revela uma situação apenas oposta à dos EUA.

A balança de pagamentos anual é excedentária desde 2001, depois de duros anos após a reunificação em que esteve deficitária.

Como se mostra bem, a situação financeira da Alemanha inverteu-se. De importador de capitais durante a década de 1990, a Alemanha tornou-se um exportador de capital após 2001. No gráfico acima, a evolução  expressa pelas curvas  mostra claramente que ocorreu uma mutação após 2001.

Depois desta data, a Alemanha parece estar a converter os importantes excedentes da sua balança de pagamentos em exportação maciças de capital. O saldo das contas externas ilustra este facto. É muito ligeiramente deficitário desde essa data.

Convertendo os seus excedentes da balança de pagamentos, a Alemanha tem pois participado muito fortemente para a financeirização da economia global, mundial, da década de 1990.

O total do capital líquido exportado (entrada de capital – saída de capital) subiu para -1607 milhares de milhões de euros, enquanto que o montante total do saldo da balança de pagamentos é  de 1410 milhares de milhões de euros de euros.

Essa participação seria maior se em vez do saldo dos fluxos financeiros tivéssemos detalhes sobre as suas saídas e entradas brutas.

B – balança de pagamentos ou das contas externas

1º  a balança comercial.

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A balança comercial mostra que as exportações alemãs são muito dinâmicas. Mas as importações não o são menos. O movimento de alta das importações e exportações, rompido pela crise do milénio foi retomado logo a seguir em 2001. O elevado nível de importações e de exportações, no final da década (1998) foi ultrapassado em 2007; a crise aguda de 2008-2009 não interrompeu o desenvolvimento do comércio externo alemão que voltou a crescer depois de 2010.

A força industrial da economia alemã é ilustrada na balança comercial e esta continua a crescer desde há vinte anos. Este saldo contraiu-se em tempos de recessão, mas retomou imediatamente após. Este é o caso, após a crise do milénio, bem como após a crise aguda de 2008-2009.

O comércio alemão hoje parece estar a trinfar da crise. E a economia alemã, que o sustenta parece estar a fazer prova de um grande dinamismo demonstrado pelas importações e exportações de mercadorias.

2° A balança de serviços.

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A balança de serviços é o calcanhar de Aquiles do comércio exterior da Alemanha que praticamente não brilha nesta área. Esta é a tradução em termos de comércio da baixa produtividade dos serviços a nível nacional alemão.

Um ponto positivo, a Alemanha tentou preencher o saldo negativo do seu sector de serviços  por um esforço de exportação do seu comércio que acabou por compensar. Enquanto que a década de 1990 é caracterizada por uma deterioração da balança de serviços, após 2001, a Alemanha conseguiu melhorar o seu saldo de serviços aumentando as suas exportações. Resultado? Em 2001-2012, a balança de serviços está em equilíbrio. Os excedentes da balança de pagamentos que podem ser convertidos em investimentos financeiros fora da Alemanha são mais afectados pelo saldo negativo da balança de pagamentos.

3° A balança dos rendimentos de capitais.

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A balança dos rendimentos de capitais fornece uma síntese dos juros ganhos em aplicações financeiras, dividendos de acções e lucros das empresas, formam os IPD.

Os rendimentos de capital têm o mérito de dar uma contribuição positiva para a balança de pagamentos. Desde 2004, o saldo dos rendimentos capital está claramente em excedente.

Antes de 2004, os rendimentos de capital pagos no exterior (são registados com  sinal negativo) – os custos da reunificação obrigam – estavam regularmente acima dos rendimentos dos capitais recebidos pela Alemanha (são registados com o sinal positivo) do exterior. Desde 2004, o saldo dos rendimentos do capital permite que a Alemanha fortaleça os seus excedentes da balança de pagamentos.

4° As componentes da balança de pagamentos.

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O papel proeminente da balança comercial é espantoso, antes e depois de 2001. A forte contribuição da balança comercial para a balança de pagamentos é apoiada pelo excedente dos rendimentos do capital depois de 2004, que conheceram um eclipse durante os anos de 92.

O excedente da balança de pagamentos pode ser convertido em investimento financeiro e sofre a amputação das transferências correntes, que são negativas.

Essas transferências correntes são a síntese das transferências de dinheiro público e privado, entre a Alemanha e o mundo, que incluem o movimento de fundos entre os Estados, entre a UE e a Alemanha, as pensões e os salários. Para uma análise mais completa, veja-se:

http://www.bundesbank.de/Navigation/EN/Statistics/Time_series_databases/Macro_economic_time_series/its_list_node.html?listId=www_s201_b06)

O resultado é um aumento do saldo positivo da balança de pagamentos desde 2002 permitindo à Alemanha a exportação de capitais. São estes capitais que devem ser examinados, considerando os fluxos financeiros.

(continua)

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[1] O título dado à  colecção é da responsabilidade do tradutor.

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