O GRITO DE CRIANÇA por Luísa Lobão Moniz

olhem para  mim

Hoje as crianças deviam manifestar-se não num minuto de silêncio, mas de revolta contra a falta de cumprimento  dos Direitos da Criança.

Os casos de crianças mal tratadas inspira-nos um “coitadinha, como pode ser?”. Pois é “como pode ser?”

Pode, pode ser, tanto pode ser, que é!

Muitos são os estudos sobre maus tratos, sobre  insucesso  escolar destas crianças, sobre a falta de cumprimentos das regras sociais, sobre a criação de gangs, sobre o bullying…e de tudo o que sai fora da norma convencional da sociedade a que pertencem.

A esperança de muitos de nós fica-se pelo saber que existem Comissões de Protecção de Crianças e de Jovens (CPCJ), fica-se pelo saber que há um Tribunal de Família, fica-se pelo saber que há algumas organizações não governamentais, como por exemplo, O Instituto de Apoio à Criança que auxilia estas crianças e suas famílias na conquista de uma vida melhor.

Muitas crianças mudaram a sua vida, para melhor, a partir do momento em que o IAC começou a contactar com outras instituições e a criança começa a construir o seu projecto de vida.

Ninguém é feliz se não tiver um projecto de vida que faça com se sinta bem e que seja reconhecido pelos outros.

Eu só existo porque o outro existe., eu só falo porque o outro  me ouve…

A vida é multidisciplicar e complexa e poderão dizer: -Pois é, mas para muitos o projecto de vida resume-se ao “instante” em que o acontecimento disruptivo se vive.

Todas as pessoas tentam encontrar comportamentos e atitudes que as façam ser reconhecidas pelos outros, mas pela positiva, estes são-no pela negativa…

É verdade que muitos escolhem a violência, o roubo, o deambular pelas ruas à procura de droga para consumir ou para vender ou ainda à procura de um lugar sossegado para pernoitar.

Ir à escola, só se for obrigado.

E assim andam estas crianças e jovens pelas ruas, de preferência pelo seu bairro, com bonés e carapuços na cabeça para não se deixarem ver, e não, muitas vezes, como pensamos, para não serem reconhecidos.

As suas existências estão vazias de conforto e de afecto, apenas sentem prazer no instante em que fazem o que o seu estatuto e poder consentem que o façam.

São eficazes num roubo, a uma caixa registadora, e festejam com pancadas nos ombros e nas cabeças uns dos outros. Passados esses momentos de reconhecimento positivo dos amigos a excitação do roubo deixa entrar outra vez o desconforto existencial e a falta de afectos.

A sociedade que diz ” coitadinha, como pode ser?” pede para estas crianças e jovens castigos expiatórios. Acabado o estudo judicial, destes casos, aí vão eles para uma instituição da qual fugirão um dia.

 Agora as suas existências vão cheias de exemplos anti sociais de colegas mais velhos, vão cheias de falsas esperanças vindas dos monitores da instituição, vão cheias de convencimento de que para a próxima ninguém os apanha.

Se calhar até conseguem uma arma até lá chegarem.

Sugiro que em vez de se fazerem discursos sobre o Dai da Criança para serem ouvidos pelos adultos, se ponham colunas de som com os gritos de dor e de morte, com os passos de fuga à polícia, com o tiritar de frio, com o barulho das lágrimas, com o barulho dos pratos sem comida, com depoimentos de crianças sobre as sua próprias vidas embaladas em violência.

Enquanto as crianças sofrerem, forem mal tratadas, mortas, O Dia da Criança, para muitas é um dia em que apenas vêm pessoas mais sorridentes, podem andar de metro sem pagar….e amanhã?

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