EDITORIAL – O DIREITO AO LAZER E À PREGUIÇA

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Já por diversas vezes temos aqui citado e referido opiniões do investigador e ensaísta francês  Albert Jacquard (1925-2013), especializado em genética das populações, conferencista e autor de numerosas obras de divulgação científica, competências pelas quais integrou o Comité Nacional de Ética. As suas teses, por vezes aparentemente insólitas, configuravam um discurso humanista destinado a incrementar a evolução da consciência colectiva. Citámos passos de uma conferência que deu há anos em Barcelona, onde defendeu que «a única forma de se acabar de vez com o desemprego era acabar com o trabalho.»

A blague é só aparente. Numa sociedade em que a acumulação de capital não fosse o objectivo central (onde não houvesse capital) e a finalidade da comunidade humana fosse a aquisição de conhecimento, a acumulação de saber, não numa perspectiva de orgulho, vaidade, de culto da personalidade, mas no sentido de dar um contributo tão amplo quanto possível ao, aperfeiçoamento intelectual da espécie, quase todo a produção (alimentação, vestuário, etc.), poderia ser realizada por robots controlado por um diminuto número de pessoas. A quase totalidade dos seres humanos estaria ocupada a fazer aquilo que nos distingue das outras espécies – pensar.

Mas então nós não pensamos?- perguntar-se-á. Sim, claro que pensamos. Porém, como uma ave engaiolada, o nosso pensamento é  incapaz de imaginar uma sociedade sem capital. Glorificamos o trabalho como virtude máxima e a «classe trabalhadora» como única com direito moral ao comando supremo. Dividimos os trabalhadores em «intelectuais» e “braçais» (relutantes em considerar os primeiros como trabalhadores). Antonio Gramsci recusava liminarmente esta divisão- para ele, todo o trabalho era intelectual.

O socialismo procurou dividir o capital de uma forma justa. Mas não existe uma forma justa de dividir a lepra. O lazer criativo, a que podemos chamar preguiça, é algo por que merece a pena lutar. Havemos de aqui voltar a este tema.

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