HOMENAGEM A G.F. SACARRÃO – por Maria Estela Guedes

retrato por Dorindo Carvalho

Chamava-se Germano da Fonseca Sacarrão, para decifrar o nome “G.F. Sacarrão”, com o qual o professor assinou as centenas de títulos de artigos e livros que constam do seu currículo científico. Teremos nós, que promovemos esta homenagem, alguma relação colegial com o biólogo?

Talvez, a despeito da atividade literária e editorial em que se movem acima de tudo os seus dois amigos que esta nota de abertura subscrevem. Além da amizade, houve um magistério, próprio não daqueles que muita informação transmitem, sim dos que sabem passar o conhecimento através do exemplo, do desafio intelectual, da partilha de valores culturais e até do riso – ele gostava de contar anedotas.

Tão próximos que somos do Surrealismo, algo teremos enviado dele para o mestre em embriologia, evolucionismo, ornitologia? Talvez. Talvez um fruto da rebeldia ou do acaso objetivo, algo como a surpreendente história da Pega azul, uma espécie asiática, confinada na Europa a um híbrido perímetro luso-espanhol na zona de Barca d’Alva. Quanto menor o espaço habitado, maior o valor científico das espécies, no paradigma evolucionista. Tanto valor tinha a Pega azul, que deu nome a uma revista científica, a Cyanopica.

Tal como o Celacanto, kafkiana personagem do conto homónimo de Herberto Hélder, os lagartos gigantes de Cabo Verde, a nossa salamandra preta (Chioglossa lusitanica) e outras notáveis espécies, a Pega azul, já depois da morte do seu biógrafo, ou ornitólogo, para sermos mais rigorosos, escapou à prisão dos modelos darwinianos e explodiu demograficamente para Sul, tornando-se uma praga. A libertina perdeu o valor que tinha conquistado.

Eis um destino surrealista que decerto o Prof. G.F. Sacarrão, democrata e bem humorado cidadão, teria partilhado connosco e não o inverso, na expectativa de uma bela risada, ele que, sendo evolucionista, nunca deixou de criticar o Evolucionismo, sempre que a isso obrigavam exageros do neo-darwinismo ou escândalos como o de Trofim Lysenko.

Maria Estela Guedes 20.02.2016

Retrato por Dorindo Carvalho

 

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