Selecção e tradução de Júlio Marques Mota
Um olhar sobre a Europa a partir da Áustria
Uma pequena série dedicada aos meus amigos Joachin Becker, de Viena, e Luis Peres que de Viena veio encantado
(1/3) Grande coligação, uma ratoeira para estúpidos – o exemplo austríaco em pano de fundo …
Comício de Norbert Hofer du FPÖ que perdeu a corrida ao cargo de Presidente da República apenas por alguns votos apenas. (Photo : SIPA.00756626_000009)
E se, a favor da crise política actual, os partidos de governo deixassem de se autodissolverem e se unissem? E se, socialistas e Republicanos, em vez de se andarem a insultar com ninharias se associassem para uma grande coligação nacional? A ideia de um grande governo de coligação faz desde há muito tempo quase sonhar muitos eleitos dos dois lados, em numerosas salas de redacção, a maior parte das elites económicas e elevado número dos altos quadros da Administração. Mas, desta vez, o antigo agitador de Nanterre, Daniel Cohn-Bendit, e o jornalista Hervé Algalarrondo (amigo e autor da casa, E.L.) acreditam ter chegado o momento (1).
Em 2017, uma maioria multicolorida (rosa, azul, verde e cor de laranja) poderia bem tomar o poder. Os dois autores desejam-no ardentemente e demonstram-no. A opinião pública cansa-se de ver as alternâncias sucederem-se e com as políticas efectuadas a assemelharem-se e as tentativas de reformas igualmente a encalharem. “A ruptura” de Sarkozy? Um pudim! “A mudança” prometida por Hollande? Bluff! Ora, se no próximo ano Marine Le Pen chegar à cabeça ou mesmo em segundo lugar na primeira volta das Presidenciais, o candidato PS ou LRepublicanos provavelmente vitorioso à chegada não poderá governar sozinho. A sua base eleitoral revelar-se-á demasiado fraca e a sua maioria parlamentar bem frágil.
De quem será a culpa? Não de Sarkozy “o hiperpresidente” nem de Hollande “o candidato normal”, mas desta confrontação estéril entre dois campos parlamentares, tão propensos a cultivar os seus antagonismos e por conseguinte a neutralizarem-se mutuamente. Mas se “a esquerda moderna e a direita realista” (dixit os autores) unissem as suas forças, os recalcitrantes dos dois lados – colbertistas à direita e “contestatários ” à esquerda – perderiam o poder de se andarem a degladiar e numa coligação poder-se-ia ir mais longe nas reformas. Verdadeira martingale política… no papel. Porque os dois autores, assim dispostos a enfrentar dogmatismos e a pregar o pragmatismo, fariam bem melhor em olhar para os resultados reais das coligações (direita-esquerda) que já se realizaram na zona euro desde a crise. Um estudo realizado pelo economista Éric Dor, professor na escola de gestão IESEG, e publicado na revista L’Expansion de Março 2015 passou a pente fino os desempenhos de nove coligações desde 2007. Em média, o seu PIB recua de 0,2 % em ritmo anual, quando o do conjunto dos países da zona euro aumenta 0,2 % no mesmo tempo. As coligações na Finlândia (2011-2014) e nos Países Baixos (desde 2012) não fazem maravilhas económicas. Sem estar a falar da experiência grega entre 2011 e 2015. Somente a aliança CDU-SPD na Alemanha tira realmente as castanhas do seu lume, mas sob o efeito de reformas desencadeadas bem mais cedo e numa conjuntura económica bastante favorável.
Quanto aos resultados eleitorais, vale bem mais passar por cima do fiasco de Mario Monti nas eleições de 2013 na Itália (uma forma de coligação direita-esquerda), sobre a recente penetração de FPÖ na Áustria (dirigido conjuntamente desde 2008 pelos sociais-democratas e pelos conservadores) ou ainda sobre a afronta dada em Março passado pelos Irlandeses com um duo pró-austeridade Fino Gael (centro direita) – Labour (esquerda). De resto, de acordo com um fenómeno bastante perverso, os eleitores tendem a sancionar a segunda força da coligação, a força auxiliar do governo. Na Grécia, os sociais-democratas do Pasok explodiram em pleno voo exactamente depois da sua aliança com a direita de Antonis Samaras; na Irlanda, o Labour acaba de pagar o mais pesado tributo nas últimas eleições. Coligação, uma armadilha para estúpidos…?
Franck Dedieu, Revista Causeur, Grande coalition, piège à cons? L’exemple autrichien en toile de fond… Texto disponível em : http://www.causeur.fr/coalition-autriche-fpo-cohn-bendit-algalarrondo-38352.html#
- – Et si on arrêtait les conneries, Daniel Cohn-Bendit et Hervé Algalarrondo, Fayard, 198 pages, 17 euros. ↩