APRESENTAÇÃO de “GALILEO – ENTRE DISTÂNCIAS E APROXIMAÇÕES”, de HELENA BRANCO – por ESTER VAZ – no CENTRO DE ASTROFÍSICA da UNIVERSIDADE DO PORTO

Centro de Astrofísica da Universidade do Porto

Planetário do Porto – Centro de Ciência Viva

15 Fevereiro 2017, 18 horas

Sessão inaugural da exposição “Galileo – Entre distâncias e Aproximações”

uma obra de Helena Branco

Cumprimento o Professor Doutor João Lima, director do Centro Astrofísica da Universidade do Porto, entidade que gere o Planetário do Porto – Centro de Ciência Viva e o Dr. Paulo Pereira, designer deste planetário, pelo acolhimento e orientação deste evento.

Cumprimento também as pessoas amigas e conhecidas que, generosamente, se juntaram a nós nesta cerimónia de comemoração dos 453 anos do nascimento de Galileo Galilei (1564-1642) com uma exposição  evocativa de Helena Branco que estará patente até ao dia 28 Fevereiro 2017.

Não sou historiadora nem crítica de arte, sou sim observadora e apreciadora crítica de afetos e sentimentos. As várias formas de expressão pela arte sempre me deslumbraram mas, acima de tudo, o que tem aguçado o meu sentir são os meandros dos bastidores da obra feita, ou seja, vasculhar o invisível dos fazedores.

Foi o trabalho invisível da Helena Branco que despertou a minha atenção para Galileo Galilei.

Galileo Galilei nasceu em 1564 e morreu em 1642.

Foram os seus últimos 26 anos de vida (1616-1642) que mais agitaram as mentes humanas, ora as mentes viciadas num ciclo de escuridão ora as mentes sedentas de conhecimento. Galileo foi condenado pelo Tribunal do Santo Ofício por afirmar que o Sol é o centro imóvel do Universo e que a Terra se move. Ficou “prisioneiro” da Inquisição na sua casa de campo em Arcetri, Firenze, como garantia de não divulgar os seus estudos sobre o sistema heliocêntrico, iniciado por Copérnico.

Fixei-me numa afirmação de Galileo, no seu tempo: “quem não conhece a verdade é estúpido, quem conhece a verdade e a nega, é criminoso”. Ora nós sabemos que a Inquisição o obrigou a abjurar (negação do que antes tinha afirmado) sobre a sua teoria comprovada do sistema heliocêntrico. Então como é que Galileo resolveu esse seu sentimento de humilhação às suas ideias e manteve forças para prosseguir os seus estudos e convicções?

Alguns escritos dizem que Galileo, no ato da abjuração, ou seja, depois de cantar a palinódia perante o Tribunal que o condenou dizendo que o Sol não era o centro imóvel do Universo, e já à porta de saída desse Tribunal, disse entre dentes E pur si muove no entanto ela se move.

Com essa atitude, Galileo construiu o corredor da liberdade para o conhecimento e para a ciência. Foi assim que prosseguiu os seus estudos de física e matemática para comprovar que o que havia abjurado não era verdadeiro. Neste aturado caminho de experimentos e discussões clandestinas, anotou e escreveu a relevância das suas ideias deixando um legado a Andrea Sarti, filho da senhora Sarti, governanta na casa de Galileo e que o acompanhou até à sua morte. Sarti, desde criança, sempre que podia fugia para junto de Galileo com quem conversava. Galileo aguçava-lhe o raciocínio para a lógica das suas descobertas.

Andrea Sarti, que se tornou cientista, mudou-se para a Holanda e, clandestinamente, levou consigo os últimos escritos de Galileo, denominados “Os diálogos sobre duas ciências novas” que foram publicados 5 anos depois. Andrea Sarti foi o maior difusor das ideias de Galileo saltando os “muros” da Inquisição abrindo-se assim as portas à modernidade.

Convenhamos que o reconhecimento da obra de Galileo deve-se  à sua tenacidade, convicção e crença na ciência. Ele usou a inteligência como resposta às condenações do Tribunal do Santo Ofício numa atitude em querer deixar obra que perdura no caos de hoje.

Ora a Helena Branco usou a essência da inteligência e tomou a decisão de arrojar o seu sentir pela obra de Galileo, expressando-o numa tela com cerca de 10m por 1,60m lendo-lhe a sua grandiosidade e humanidade….

Quem conhece o percurso poético de Helena Branco e olha para este seu trabalho pode-lhe parecer imediatamente descritivo. Mas serão os olhos de cada um de nós quem encontrará nele sentimentos desnudados que, por si só, terão significado próprio de poesia.

Helena Branco tem-se revelado na pintura em tela e em xistos, mas também em papel e, pontualmente, em madeira. Acima de tudo Helena Branco redescobre a pujança do objecto numa atribuição de significado.

Eu acompanho a ideia de quem diz que a arte não significa nada. A arte só é arte quando o sentido lhe é dado pelo sentimento de quem a interpreta. Cada um descobre o que quer descobrir. Por isso Roland Barthes afirmou que o significado da arte é plural.

A motivação de Helena Branco para dedicar esta tela a Galileo Galilei foi espoletada pelo poema que António Gedeão escreveu para Galileo.

Depois de muita pesquisa e maturação, Helena Branco eleva a vida e a obra de Galileo Galilei interpretando-as, na tela, como se se tratasse de um percurso poetico de Galileo em Itália. Faz uma interpretação começando pela sua terra natal, Pisa, a Toscana, depois as descobertas de Galileo, o seu apreço pelos grifos na galeria dos ofícios em Florença, pela beleza do rio Arno e a sua ponte vecchio. Helena Branco aponta-nos para a paixão e força de Galileo que, já cego e velho, vê a apoteose do universo em que a Terra não é o centro das coisas.

Num excerto do poema de António Gedeão, podemos ler uma certa ironia no conhecimento científico e, mesmo do senso comum, no século XX:

 

Pois não é evidente, Galileo?

Quem acredita que um penedo caia

com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?

Esta era a inteligência que Deus nos deu.”

Ou seja, o melhor do que vemos não é o que transmitimos aos outros mas o quanto isso toca a nossa percepção.

Cito Antoine de Saint-Exupery “o essencial é invisível aos olhos, e só se vê bem com o coração”.

Estou aqui porque acredito que este projeto tem a beleza e a força estoica de Galileo Galilei na observância e atitude da Helena Branco.

Convido-vos a observar e apreciar esta obra evocativa que tomou um certo percurso.

Matosinhos, 09-02-2017

Ester Vaz

 

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