CARTA DE BRAGA – “friganismo” por António Oliveira

Encontrei este palavrão num conhecido diário europeu. Procurei o significado por tudo o que era sítio consentâneo e só o encontrei numa coisa chamada ‘Wiki Culturama’ que o apresenta como ‘cruzada contra o desperdício’.

Noutro site encontrei uma explicação complementar ‘frigano é uma adaptação do anglicismo freegan, referindo o adepto de um modo de vida anti-consumista, começando pela comida’.

Voltei à notícia do tal diário europeu e salienta que faz parte do que parece ser uma campanha onde se pretende dulcificar a pobreza, chegando mesmo a ser rotulada de ‘estupenda’ ou de muito pior gosto como ‘curtida

A afirmação vinha vestida de uma banal mas terrível simplicidade, ‘devemos falar em “money anxiety” e não em “precaridade laboral’’, tanto mais que a ‘ansiedade por dinheiro’ já foi reconhecida como tal, pela Associação Americana de Psicólogos’.

Como se pode ter chegado a isto? Como se impôs uma narrativa mediática tão conservadora, para não dizer retrógrada, de que quase nenhum país se safa?

O jornalista e escritor Juan Antonio Molina, propõe algumas questões ‘Como é que a maioria dos cidadãos quererá viver numa sociedade que os faz mais pobres, que os impede de sobreviver com salários de fome, os abandona na velhice, os marginaliza, lhes vê os filhos mal alimentados e nega subsídios no desemprego, enquanto os Estados injectam milhares de milhões nos bancos?

O artigo teria fácil e talvez proveitoso acolhimento em Portugal porque, de acordo com o Retrato de Portugal na Europa, divulgado pela Pordata no princípio do mês, temos o ‘quarto maior consumo privado em percentagem do PIB’ e somos o ‘terceiro país com maior percentagem de trabalhadores com contracto de trabalho temporário’.

Mas há ainda alguém ‘agradecido’ por aquela informação! Uma trabalhadora escreve ao tal diário, para dizer ‘Grata por saber que sofro da ansiedade por dinheiro, em vez de precariedade laboral. Eu pensava que era pobre, mas afinal só estou ansiosa’.

E para aliviar tal ansiedade o mesmo jornal acrescentava mesmo alguns títulos apelativos ‘9 truques para aquecer a casa em vez de ligar a caldeira’ e ‘Friganismo: a última dieta hipster é apanhar comida no lixo

Atendendo ao ‘sítio’ da tal Associação Americana de Psicólogos, espero bem que o seu presidente não seja o patético loiro de Washington pois, como afirmou o filósofo e escritor Josep Ramoneda, ‘a palavra está hoje nas mãos de quem melhor se adapta a uma comunicação simples, efectiva e sem escrúpulos, capaz de hoje esquecer o que disse ontem, explorar os recursos da democracia emotiva, com a apelos a sentimentos eternos, para aliviar a fragilidade do presente’.

Estou convencido que a grande ansiedade por dinheiro existente neste país (não sei se também reconhecida pelos nossos psicólogos), se tenta resolver pelo aumento emocional das apostas na ‘raspadinha’ e no ‘milhões’.

São mais limpos que o tal ‘friganismo’, mas muito mais caros!

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

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