CARTA DE BRAGA – “os «coisas»” por António Oliveira

São aqueles que nunca têm posição definida sobre um qualquer assunto.

São aqueles que sempre esperam para ouvir uma qualquer opinião, de preferência de alguém da maioria naquele lugar ou naquele instante, que acenam arregalando o olho a mostrar a concordância, que batem palmas se o ‘compère’ da ocasião o solicita, que saem ordeiramente se lhes dizem que está já na hora.

São aqueles que normalmente apoiam o mais básico, mas também o mais visível, o que grita mais alto, o que aparece quase todos os dias nos ‘manhas’, aqueles que só sabem explicar tudo com um ‘é uma coisa do catano, é o que te digo!

São aqueles a quem se lhes pede para aclararem, dificilmente saem daquela ‘coisa’, porque o pensar está guardado para quando olham a casa do vizinho, ou as pernas da rapariga do ‘shopping’.

São aqueles que não têm partido, mas têm clube, que lêem três ou quatro diários da bola (de preferência os do café onde se sentam para o cafezito da ordem), mas aqueles que se metem nas conversas políticas para dizer ‘já viu a nossa situação?’ ou ‘quanto é que nos cabe?’ ou, mais profundamente, ‘estes, já a gente sabe como são!

Encontramo-los todos os dias, tentando esquivar a máscara, arranjar um ‘truque’ qualquer para se safarem de uma obrigação, passarem à frente se lhes for possível, porque ‘esta vida está cada vez mais difícil!

Convém não confundir os ‘coisas’ com os desamparados da fortuna, dos ‘coronas’, dos parcos empregos e dos parcos salários, das filas da segurança social e das salas de espera dos centros de saúde e hospitais, dos sem-abrigo, porque todos esses carregam, ainda e também, a solidão e o corpo, por nada mais terem.

Mas os ‘coisas’ têm agora uma importância que os ultrapassa. Deles vai depender uma parte fundamental da nossa civilização, daquela que dizem ‘ocidental’, por estarem em jogo as lideranças de dois países-chave para o nosso mundo, os EUA e o Reino Unido.

Trata-se das eleições para a presidência dos americanos e do Brexit para os ingleses, logo a seguir ao mês de Outubro.

Vai discutir-se assim, a continuação da degradação da antiga grandeza dos dois estados, que tem sido posta em questão por dois despenteados mentais, o trump e o boris, reis do populismo autoritário, da liberalização sem fim, das privatizações, da minimização do serviço público e da brutalização das polícias.

Os ‘coisas’ vão ser chamados a decidir, ninguém lhes vai perguntar como nem porquê, porque os despenteados mentais comandam e, para eles, quem comanda manda.

E os dois despenteados mentais são os reis do ‘charco’ em que transformaram a res publica ocidental, por contarem sempre com a abolia e o desinteresse dos ‘coisas’, que só suspiram ansiosos pelo retorno do público aos estádios, a única coisa verdadeiramente preocupante nestes tempos!

Um charco em que parece não haver ninguém para controlar tais despenteados e, se calhar por isso, lembrei-me de Dostoievski, por ter posto Ivan Karamazov a dizer ‘se Deus não existe, então tudo é permitido!

E abalou Quino, o ‘pai’ da Mafalda! Tudo nos vai parecer muito pior por termos de continuar sem ela!

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 

1 Comment

  1. Tudo certo mas não esquecer que a Inglaterra cortou com a UE, havida séculos atrás, quando Henrique VIII, invocando aldrabices, mandou ás urtigas o Papa. Não esquecer que a Inglaterra conduzida por W. Pitt derrotou Napoleão e a sua ânsia de amalgamar os Povos europeus. Não esquecer que a ambicão de hegemonia europeia encabeçada pelo Kaiser morreram graças à sabia resistência politica e militar da Inglaterra e que, muito próximo de nós, o inesquecível W. Churchill nunca deixou de lutar contra um qualquer potentado centro-europeu . Agora, naturalmente, a Inglaterra – e muitíssimo bem – recusou aceitar a fantasia da redução a um poder germano-franco a condução da política e da economia dos continentais europeus. Nós, os portugueses – talvez o único Ocidental em que só há uma Nacionalidade e que temos o maior e mais direto acesso ao Atlântico – também, deviamos fazer o mesmo. CLV

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