UNPOPULAR FRONT – 6 DE FEVEREIRO DE 34/6 DE JANEIRO DE 2021 – O QUE É QUE ESTES DOIS EVENTOS TÊM DE COMUM

Feb 6 1934/Jan 6 2021 – What Do The Two Events Really Have In Common?, por John Ganz

Unpopular Front, 15 de Julho de 2021

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

 

Deputados socialistas marcham com grevistas em 12 de Fevereiro de 1934 (fonte  aqui)

Pouco depois de 6 de Janeiro, troquei alguns e-mails com Robert Paxton, autor de A Anatomia do Fascismo, pedindo-lhe a sua opinião sobre o que aconteceu. Durante muito tempo cético sobre a ideia de que Trump era um fenómeno fascista, os acontecimentos de 6 de Janeiro pareceram ter-lhe mudado as ideias. Em especial, ele fez a comparação feita por outros nos dias seguintes – entre os motins de 6 de Janeiro e a tentativa das ligas de extrema-direita e veteranos militares de invadir a Câmara dos Deputados em Paris, a 6 de Fevereiro de 1934.

Esta comparação seduziu-me imediatamente, porque pensei durante muito tempo que a Terceira República Francesa era um acontecimento mais interessante e produtivo para procurar paralelos com o presente do que a República de Weimar ou a Itália pós Primeira Guerra Mundial. Em primeiro lugar, porque a história é menos conhecida nos Estados Unidos, pelo que os seus detalhes e particularidades não seriam rapidamente sujeitos a caricatura. Em segundo lugar, porque a França tinha uma cultura e tradição democrática e republicana muito mais longa, com a qual a extrema-direita tinha de lutar ou cooptar. E terceiro, em parte devido a essa tradição, existe uma grande ambiguidade e debates sobre se o termo “fascista” é mesmo um nome apropriado para a extrema-direita francesa, tal como é o caso  agora nos Estados Unidos.

Um olhar detalhado sobre as crises políticas da Terceira República foi uma das razões pelas quais comecei este blogue e para esse fim escrevi uma série sobre o caso Dreyfus, bem como sobre a crise dos anos 30 que culminou com os motins de 6 de Fevereiro de 1934. Estou a considerar continuar a série através dos anos da Frente Popular e até Vichy, mas pensei que valeria a pena fazer uma pausa e uma comparação explícita entre os dias de hoje e a Terceira República, algo que só até agora tenho dado a entender.

“Multidões” Diversas

Então, quão semelhantes foram o 6 de Fevereiro de 1934 e o 6 de Janeiro de 2021? Começando um pouco superficialmente, há que admitir que existe um paralelismo sinistro: ambos envolvem uma movimentação  de extrema-direita com muitos veteranos militares a tentar atacar o ramo legislativo que estava no processo de reconhecimento de uma nova administração.

Em ambos os casos, as movimentações incluíam uma coligação  de organizações da Direita pertencentes a várias estirpes da extrema-direita ideológica. A 6 de Fevereiro, os tumultos foram orquestrados em grande parte pelas ligas antiparlamentares – Solidarité Française, Action Française, Jeunesse Patriotes, Croix de Feu, para citar algumas. Estes grupos variavam desde oficialmente “republicanos” em termos de ideologia – apelos aos manifestantes incluíam muitas referências a 1789, tal como a extrema-direita americana faz gestos simbólicos a 1776 – até monárquicos; desde os que eram  abertamente antissemitas e xenófobos, até acolherem  judeus e tentar recrutar membros norte-africanos. Alguns deles representavam tradições extremamente antigas da Direita: a Action Française era monárquica  e católica, enquanto outros grupos tentavam claramente imitar o estilo e métodos organizacionais mais recentes dos movimentos fascistas na Europa. Evidentemente, o “republicanismo” professado pela extrema-direita era significativamente diferente do da centro-esquerda: eles desejavam substituir a negociação e a disputa de  “interesses especiais” no sistema parlamentar por uma forte liderança executiva assumida por um líder providencial que criasse a unidade nacional e “salvasse” a França.

Em 6 de Janeiro de 2021, havia também uma gama diversificada de grupos de extrema-direita – Proud Boys, Oath Keepers, Three Percenters, por exemplo – que representavam estirpes mais antigas ou mais recentes da extrema-direita americana, desde o movimento das milícias rurais de longa data aos representantes de grupos neonazis, passando por tentativas mais recentes de organizar um quadro urbano de luta de rua. Os movimentos  em ambos os casos eram bastante “diversificados”, mas uniram-se em objetivos comuns  no decurso dos tumultos. Em ambos os casos, muito poucas das organizações ou membros dos respetivos movimentos se apresentariam abertamente como “fascistas”. E em ambos os casos, havia um núcleo duro de ativistas organizados empenhados em lançar  apelos de propaganda para atrair  uma grande parte  da população simpatizante.

Tradições do Pensamento Conspirativo

Em ambos os casos, os membros destes movimentos estavam incitados pela crença de uma conspiração. Em 6 de Fevereiro de 1934, a multidão estava convencida de que Serge Stavisky, um vigarista judeu com ligações a altos membros do partido Radical (mais ou menos, os liberais de centro-esquerda, os Democratas), tinha sido assassinado para encobrir um amplo escândalo que implicava todo o estabelecimento (pensem em Jeffrey Epstein – não pareceu importar aos manifestantes que figuras proeminentes da Direita estivessem também associadas a Stavisky). O novo Primeiro-Ministro Radical Daladier demitiu  o prefeito da polícia de Paris para dar a aparência de querer reorganizar uma força policial corrupta, mas este polícia em particular, Jean Chiappe, era um caçador de cabeças  vermelhas, bastante  amado pela Direita. Uma vez que o governo radical não tinha uma maioria absoluta e dependia dos votos do partido socialista para manter o poder, a Direita apresentou isto como um prelúdio a um golpe marxista e a imprensa publicou teorias caluniosas e irresponsáveis sobre as maquinações do governo no mês que antecedeu os motins.

Assim, em ambos os casos, os desordeiros acreditavam estar a impedir uma tomada ilegítima do Estado pela extrema-esquerda. No caso de 6 de Janeiro de 2021, o impulso animador dos manifestantes de extrema-direita foi o mito da “eleição roubada” incentivado por Trump, pelos  seus subalternos  e secções dos meios de comunicação conservadores. Em ambos os casos, havia uma cultura pré-existente de pensamento conspiratório na  extrema-direita: voltando à formação da Terceira República no século XIX, a extrema-direita francesa entregou-se às crenças de que os judeus e/ou maçons e protestantes, em aliança com os socialistas e radicais, dominavam a república parlamentar e a manipulavam para atingirem os seus propósitos. Interpretaram as frustrações, insuficiências e falhas da governação republicana como prova da presença de cabalas e conspirações. Estes grupos também partilharam a desconfiança e frustração da direita americana de base moderna para com a corrente dominante dos eleitos conservadores, que acreditavam terem sido corrompidos pela participação no Estado parlamentar.

A revolução bolchevique e a presença crescente de deputados socialistas e comunistas no parlamento acrescentaram à paranoia a possibilidade de uma tomada de controlo dirigida por Moscovo. Claro que a direita americana tem uma longa história de interpretações conspiratórias e paranoicas floridas da política, que remontam pelo menos à Guerra Fria e à Sociedade John Birch e tem apresentado reencarnações correspondentes  nas teorias da Grande Substituição, QAnon, e do Estado Profundo, ambas alimentadas pelos acontecimentos de 6 de Janeiro. Em resumo, ambos os eventos foram o resultado de uma tradição política que desenvolveu um mito sobre a corrupção, a ilegitimidade, e a natureza totalmente maligna tanto dos seus opositores como das instituições de Estado.

No período que antecedeu os motins de 6 de Fevereiro, a direita criou uma atmosfera de histeria que “a esquerda” estava prestes a atacar utilizando tropas coloniais senegalesas e marroquinas que supostamente teriam menos constrangimentos em abater franceses. Houve também rumores de que o governo Daladier estava a preparar processos  secretos para “purgar” os de direita. Tudo isto se assemelha certamente à atmosfera na Direita antes de 6 de Janeiro, onde se acreditava que o massacre ou prisão de republicanos estava a ser contemplado pela administração Biden. Ambas as mentalidades conspiratórias combinavam uma postura “defensiva” e “ofensiva”: a direita tentava ativamente erradicar a corrupção no Estado, mas também supostamente tentava impedir a sua própria destruição nas mãos dos seus inimigos.

Ambas as movimentações politicas  tiveram um apoio significativo do establishment político – mesmo dentro das câmaras que estavam a cercar. Os movimentos supostamente antiparlamentares em França tinham laços com deputados de direita e os seus líderes concorriam frequentemente a eleições e ganhavam. Quando chegaram à câmara notícias de que a polícia tinha aberto fogo sobre os manifestantes, os deputados de direita acusaram o governo de homicídios. É sabido que os desordeiros de 6 de Janeiro receberam um encorajamento significativo de membros do Congresso, muitos dos quais subscreveram publicamente o mito da vitória eleitoral roubada, para não mencionar o Presidente. Em ambos os casos, a natureza externa  ou movimentação “insurrecional” das massas  é desmentida por laços profundos de associação, simpatia, e oportunidade de estabelecer centros de poder político.

Demografia e Sociedade

Vale a pena considerar o contexto social e a composição de ambos os movimentos de extrema-direita. A investigação sobre  o movimento  no Capitólio mostrou que havia  representantes de todas as classes, mas “surpreendentemente das profissionais”, sendo cerca de 40% das pessoas a serem pessoas  “de colarinho branco”, incluindo profissionais e “proprietários de empresas”. Compare isto com um pouco menos de um quarto do total da mão-de-obra americana empregada em “Gestão, profissões profissionais e afins”, de acordo com o Bureau of Labor Statistics. Os desempregados representavam uma quantidade relativamente pequena da multidão, cerca de 9%. A demografia das ligas fascista e de extrema-direita em França nos anos 30 é um pouco semelhante. Eram compostas por todas as classes, mas atraíram um grande número de classes médias e baixas: lojistas, engenheiros advogados, empregados de colarinho branco, proprietários de pequenas e médias empresas, etc.

Os americanos por vezes não são muito bons a compreender a classe social, que não deve ser simplesmente identificada com as atuais circunstâncias financeiras. Enquanto a classe média estava sobre representada no movimento  de 6 de Janeiro, muitos deles enfrentavam dificuldades financeiras, incluindo falências, execuções hipotecárias, e hipotecas fiscais. Isto é interessante de comparar com a Grande Depressão tal como se manifestou em França: mais suavemente do que na Grã-Bretanha, Alemanha ou Estados Unidos e onde não tinha sido a classe trabalhadora mas “comerciantes, artesãos, camponeses e pequenas e médias empresas que “sofreram as maiores perdas proporcionais de rendimento”¹ (“Camponeses” soa muito pouco aos ouvidos americanos, mas deve ser lembrado no caso da França que estas pessoas eram frequentemente proprietárias das suas próprias terras e equipamentos). Estes segmentos sociais de gente de classe média ameaçada e em declínio, outrora a espinha dorsal dos Radicais, foram alienados e assustados pelo movimento Socialista e pela Esquerda, e  foram atraídas por organizações de extrema-direita.

Os veteranos desempenharam um papel proeminente em ambas os movimentos políticos. Segundo o jornal  NPR, 1 em cada 5 arguidos no caso da invasão do Capitólio tinha servido  no exército. O grupo de veteranos Union Nationale des Combattants (UNC) esteve entre as primeiras organizações a apelar a uma manifestação em massa em 6 de Fevereiro de 1934. (De notar que o seu presidente teve de se demitir devido aos seus próprios laços com Serge Stavisky).

Em 1934 os manifestantes inicialmente ocuparam as ruas em reação ao caso  Stavisky, em que Alexandre Stavisky tinha sido acusado de utilizar ligações com o Partido radical para a emissão fraudulenta de obrigações bancárias.

Entre 5.000 e 8.000 membros da UNC, juntamente com um contingente menor de veteranos comunistas, estiveram presentes na multidão estimada de 40.000, mas abstiveram-se sobretudo dos episódios mais violentos, que foram levados a cabo pelos combatentes duros  das ligas. Havia também uma ampla simpatia no vasto movimento dos veteranos pelo antiparlamentarismo e autoritarismo, se não mesmo uma participação direta nas atividades da liga. Mas todos estes eram veteranos da Grande Guerra e tinham um lugar muito mais proeminente na sociedade e política francesas, em resultado do seu número e dos sacrifícios sangrentos que tiveram de fazer nessa guerra.

Escala e Organização

A investigação de 6 de Janeiro estima a multidão que atacou os terrenos do Capitólio em cerca de 10.000 pessoas, com 500 a 800 a entrarem efetivamente no edifício do Capitólio. Este foi um contingente menor do comício no National Mall que pode ter tido cerca de 30.000 participantes. As estimativas da multidão em 6 de Fevereiro apontam para cerca de 40.000 desordeiros, com alguns relatos contemporâneos a dizerem que tinham havido centenas de milhares. A quantidade de manifestantes que confrontaram violentamente a polícia e tentaram entrar no Palais-Bourbon pode ter sido menor do que o total em cena. William Shirer, nos seus relatos de testemunhas oculares de 6 de Fevereiro de 1934, fala em cerca de 10.000 amotinados a tentar invadir a ponte da Place de la Concorde.

Enquanto a investigação de 6 de Janeiro de 2021 mostra que a grande maioria dos amotinados detidos não tinha laços pré-existentes com organizações paramilitares, a multidão em 6 de Fevereiro de 1934 parece ter sido mais fortemente organizada, composta por membros de grupos formais de veteranos ou das ligas de extrema-direita que atraíram simpatizantes. Embora o movimento dos veteranos organizado fosse grande, contando com centenas de milhares, não era uniformemente de direita ou mesmo político. As ligas eram mais pequenas mas ainda tinham números significativos. Antes de 6 de Fevereiro, a Croix de Feux do Coronel De La Rocque tinha cerca de 35.000 membros, a Solidarité Française tinha entre 20.000 e 100.000 membros, e a organização de luta de rua da Action Française provavelmente também contava entre os dez mil. No seu conjunto, as várias ligas antiparlamentares contavam talvez com cerca de 350.000 membros de diferentes níveis de envolvimento  e ativação. Estes podem não parecer números enormes para uma nação democrática de milhões, mas para alguma perspetiva, o Partido Comunista Francês tinha provavelmente cerca de 35.000 membros na altura. Compare isto com os Oath Keepers  que afirmam ter 35.000 membros mas provavelmente tem entre 5.000 a 7.000 e os Prod Boys que talvez tenham mais ou menos o mesmo.

O núcleo  duro em que se podia contar para as  manifestações públicas e a violência de rua era significativamente menor do que o conjunto do grupo  mas eram pessoas altamente mobilizadas: as ligas gostavam de fazer manifestações públicas e desfiles  como os seus primos fascistas na Alemanha e Itália e também se envolviam na violência de rua, que era especialmente proeminente nas manifestações na vizinhança de  6 de Fevereiro de 1934. As multidões em 6 de Fevereiro eram parisienses, não tinham necessidade de AirBnBs ou Hotéis – as pessoas reuniam-se nos seus bairros para lutar mais um dia. A sensação de desordem e ameaça sempre presente da extrema-direita era provavelmente muito mais palpável na França dos anos 30, quando as disputas entre trabalhadores socialistas e ligas podiam ser um acontecimentos noturnos. Embora os manifestantes de 6 de Janeiro fossem marcadamente mais urbanos e suburbanos do que rurais, não se fizeram sentir como uma presença constante nas cidades da América da mesma forma antes ou depois dos motins.

Penso que aqui são necessárias algumas qualificações. A suposta falta de organização e mobilização de massas é frequentemente dada como razão por analistas mais “materialistas” para a grande diferença entre a extrema-direita dos anos 30 e os dias de hoje. Vale a pena notar que isto ignora alguns dos principais determinantes materiais das relações sociais entre meados do século XX e os dias de hoje. Em primeiro lugar, a fim de mobilizar os movimentos políticos de massas naquela época, era necessária uma grande quantidade de organização de trabalho intensivo: a escrita, impressão de folhetos e cartazes de propaganda e distribuição, sucessivos  comícios de massas para impressionar os opositores e potenciais aderentes, a disciplina paramilitar do quadro para manter a organização e a energia, bem como o contacto entre partes díspares do país, etc. Todos estes actos têm os seus análogos na organização industrial das fábricas e na organização militar da Primeira Guerra Mundial, um conflito de que muitos destes atores políticos eram veteranos. Este era o mundo do telegrama, do jornal, da rádio, do revólver, dos comícios de massas, e não o dos meios de comunicação social, das notícias por cabo, e das espingardas   AR-15 de venda livre. A energia e a organização necessárias para alcançar e ativar as massas, bem como para as aterrorizar e intimidar é muito menor no século XXI. Os meios de comunicação social não substituíram totalmente a importância social e política dos comícios de massas e da organização política, mas certamente tornam a sua reunião muito mais rápida e fácil. Enquanto os atacantes do Capitólio não eram em grande parte membros de grupos paramilitares que têm a sua origem no século XX, a grande  utilização dos meios de comunicação social passou a ser a maior determinante da adesão à insurreição .

A intensidade da violência nos dois tumultos foi bastante diferente. Enquanto 5 pessoas morreram durante o ataque ao Capitólio em 6 de Janeiro de 1934, em 6 de Fevereiro de 1934 14 desordeiros e um agente da polícia foram mortos. Mas milhares foram feridos de ambos os lados e houve tiros em massa e em pânico por parte da polícia e o uso de sabres de calvário por gendarmes montados a cavalo.  A polícia utilizou  os tubos contra  incêndios  para afastar as  multidões, mas os métodos modernos  “menos letais” de controlo de multidões não tinham sido em grande parte desenvolvidos na década de 1930. A  diferença na  violência pode talvez ser explicado também pela determinação da polícia em impedir a entrada das multidões nos terrenos do Palais-Bourbon e pela determinação crescente dos amotinados em ultrapassar a polícia, especialmente depois de terem sido disparados tiros.

Consequências e efeitos políticos

O que as duas multidões foram capazes de realizar no imediato foi significativamente diferente. A tentativa de golpe de 6 de Fevereiro de 1934, em que não  se conseguiu entrar no edifício da Assembleia  e foi afastado, teve um impacto direto muito maior no equilíbrio de poder em França. Isto pode ser parcialmente explicado pela diferença nos sistemas políticos: a Terceira República era um sistema parlamentar: os governos, unidos por coligações, podiam formar e entrar em colapso sem necessidade de eleições. Face a demissões ministeriais ou a votos de desconfiança, o Presidente da República pedia aos representantes dos partidos que formassem um gabinete.

Os tumultuosos de 6 de Fevereiro atacaram o parlamento enquanto o futuro Primeiro-Ministro Radical Daladier tentava investir o seu novo gabinete. Durante os tumultos, a Câmara estava em sessão e  enfrentou moções sucessivas de desconfiança, a que  sobreviveu com o apoio socialista. A desordem em curso no país relacionada com o caso Stavisky derrubou o seu antecessor Chautemps. Embora tenha sobrevivido na noite de 6 de Fevereiro de 1934, Daladier optou por se demitir alguns dias mais tarde em vez de lidar com a perspetiva de uma violência contínua. O primeiro-ministro seguinte, Doumergue, embora fosse um radical, um maçon e um protestante, estabeleceu um governo de “tréguas” e satisfez muitos à direita, especialmente com a sua elevação ao gabinete de Pierre Laval e do Marechal Petain. As ligas de extrema-direita continuaram a organizar  manifestações violentas nos dias após 6 de Fevereiro de 1934, mas uma das maiores, a Croix de Feu, parou  explicitamente com o movimento dos seus membros, o seu líder estava temporariamente satisfeito com o resultado. No caso de 6 de Fevereiro de 1934, as manifestações afetaram de facto a composição do governo, derrubando um governo de esquerda, e mostraram que o regime republicano estava enfraquecido e maleável. Mostrou também a complementaridade e a contiguidade das políticas extraparlamentares e parlamentares.

Tal como o que está agora a ser tentado por Trump e outros com Ashli Babbitt, houve um esforço concertado para transformar  em   mártires as vitimas caídas em 6 de Fevereiro de 1934 e fazer da sua memória uma parte permanente da mitologia do descontentamento da direita para com a república parlamentar. Houve um aumento da polarização e radicalização à direita, mas o maior beneficiário foi o grupo que, embora organizado numa base paramilitar, se absteve em grande parte da violência em 6 de Fevereiro: a Croix de Feu do Coronel De La Rocque, que cresceu de 35.000 para meio milhão de membros. Após a proibição das ligas durante a Frente Popular, Croix de Feu tornou-se um partido parlamentar, Parti Social Français, que teve um grande sucesso com os antigos círculos eleitorais  de lojistas e artesãos partidários do Partido radical. Com as suas duas fases distintas, a CF/PSF nunca combinou a dupla vertente parlamentar e extra-parlamentar dos partidos fascistas em Itália e na Alemanha. Os grupos antiparlamentares franceses tinham os seus simpatizantes e colaboradores no Parlamento, mas nunca um único partido de representantes diretos como os deputados nazis ou do partido PNF.

Convencida de que um assalto fascista ao poder tipo à maneira da Alemanha ou da Itália estava a caminho, a Esquerda entrou em furiosa  ação. O chefe da S.F.I.O, Léon Blum reagiu com alarme, escrevendo no jornal socialista Le Populaire: “Não  me coloco  eu próprio   entre aqueles que têm uma ideia exagerada do perigo fascista em França, mas os acontecimentos de 6 de Fevereiro revelaram a existência do perigo; e revelaram que as organizações fascistas eram suficientemente fortes e capazes  para desviarem e explorarem para seu proveito próprio … uma opinião pública perturbada e despertada. “² O Comité de vigilância dos  antifascistas, C.V.I.A., foi formado nos dias seguintes por um grupo da intelligentsia francesa dadas as   preocupações com as pessoas de esquerda. O C.V.I.A. reuniu Radicais Socialistas e Comunistas sob o guarda-chuva da política antifascista e representou o germe da eventual aliança da Frente Popular desses partidos.

A linha sindical  socialista da CGT apelou a uma greve geral a nível nacional no dia 12 de Fevereiro. Os comunistas, ansiosos por se dissociarem após o envio de um contingente à manifestação de 6 de Fevereiro, apelaram ao seu próprio comício no dia 9, que foi brutalmente reprimido pela polícia, que matou seis dos seus membros. Todo o movimento operário e de esquerda se mobilizou então para a greve da CGT no dia 12 e os partidos Socialista e Comunista marcharam juntos em Paris, com Blum  a aparece  publicamente ao lado da  direção do partido comunista. Com isto, foram dados os primeiros passos em direção à Frente Popular.

Em comparação com o movimento operário francês de massas e os seus partidos políticos socialistas e comunistas e não obstante a imaginação febril da Direita, não há realmente nenhuma organização americana de esquerda e de massas organizada para falar e apresentar-se em posição  de força em resposta apo movimento de  6 de Janeiro. Embora a pandemia tenha de fazer parte do contexto, isso não impediu os anteriores protestos de George Floyd. O facto é que não houve uma manifestação de massas democrática e de esquerda contra ao movimentação política de 6 de Janeiro de 2021. Os liberais mais indignados com os acontecimentos de 6 de Janeiro de 2021 são mais propensos a favorecer soluções administrativas e burocráticas para a violência de direita do que a encarar como um problema político que requer mobilização de massas para o contrariar. O perigo e o carácter do próprio evento ainda é uma questão de disputa entre intelectuais de esquerda. É difícil imaginar um equivalente americano do Comité de Vigilância dos Intelectuais Antifascistas. Mas a esquerda francesa tinha acabado de testemunhar duas tomadas de poder fascistas pelos seus países vizinhos e levou a possibilidade muito a sério de isso poder acontecer.

Havia também o forte laço histórico entre a esquerda francesa e a República, que remontava à Revolução Francesa. A ideia da República e o seu ethos de igualdade, liberdade e fraternidade ainda animava um impulso protetor nos grupos que se viam a si próprios como herdeiros da Revolução. A “defesa da República” e a prática de um “bloco de esquerda” tinha sido um princípio concreto de mobilização da esquerda francesa desde as primeiras crises da Terceira República e esse ideal reflete-se ao longo dos discursos e apelos de Léon Blum desde 6 de Fevereiro até à formação da Frente Popular, talvez o último grande exemplo dessa tradição. A Esquerda Francesa pôde e quis reivindicar a República como sua.

As questões de ‘Golpe de Estado’ e ‘Fascismo’

Embora tenha havido uma resposta dramática na altura a 6 de Fevereiro de 1934, mas a atitude de muitos historiadores franceses em relação ao evento soa muito parecida com a contemporânea, assumindo a falta de importância de 6 de Janeiro de 2021 ou como não tendo um carácter fascista. O historiador da direita francesa René Rémond escreveu a 6 de Fevereiro que “não foi um putsch, apenas um motim, apenas uma manifestação de rua que a história teria esquecido e que em breve teria desaparecido da memória coletiva se não tivesse tomado uma viragem trágica”, o que está relacionado com o que tem sido chamado de “tese de imunidade”, ou seja de que a cultura democrática de longa data da França a tornou particularmente resistente ao fascismo. Coisas que parecem fascistas ou pelo menos muito próximas do  fascismo, como Vichy, de facto, não o eram: Rémond caracterizou Vichy, devido ao seu conservadorismo, como “o próprio oposto do fascismo”. ⁴ As discordâncias são profundas e radicais. Enquanto alguns historiadores insistem que o fascismo era uma força menor e alienígena na política francesa, outros, como Ze’ev Sternhell, argumentaram que o fascismo, com a sua  síntese de temas de esquerda e direita, foi essencialmente a invenção da cultura política e intelectuais franceses e e que o fascismo pode ser encontrado mesmo na sua essência antes mesmo da Primeira Guerra Mundial. Certamente a mobilização da extrema-direita francesa e a ideologia ultranacionalista são anteriores tanto ao fascismo italiano como à guerra.

Tal como em 6 de Janeiro de 2021, muito poucos dos grupos e indivíduos envolvidos em 6 de Fevereiro de 1934 se teriam chamado “fascistas” ou “nacional-socialistas”. A extrema-direita francesa teve o cuidado de se distanciar de um conceito “estrangeiro”, particularmente um associado ao inimigo hereditário, a  Alemanha. Mas outras vezes até mesmo a corrente dominante da direita francesa viu com curiosidade e interesse o que se passava na Itália e na Alemanha, especialmente as violentas repressões sobre a esquerda ocorridas durante esses regimes. Mas quando Hitler mais tarde virou a sua atenção para a Direita, os jornais da Direita ficaram um pouco mais reticentes a seu respeito.

Para além das suas óbvias semelhanças de estilo e objetivos políticos, as formações de extrema-direita tornaram-se “fascistas” por causa da Esquerda. Foi em parte uma decisão política rotular as ligas de “fascista”, e associá-las aos ultrajes em Itália e na Alemanha. Ambos atacaram os seus adversários e proporcionaram uma base comum para a cooperação na esquerda como uma coligação antifascista. Mas a palavra teve uma ressonância que não tem hoje: sugeriu não o regresso aos reprimidos, mas uma ameaça viva. A esquerda tinha acabado de testemunhar os seus camaradas internacionais presos e assassinados por fascistas. Eles compreenderam que não se podia confiar nas declarações  públicas de tais partidos. Qualquer coisa que cheirasse mesmo vagamente a fascismo era suficiente para gerar uma resposta enérgica. Ainda que fosse a base da organização política, a classificação das ligas como “fascistas” era igualmente consensual: quaisquer que fossem as reivindicações dos próprios grupos, estes eram movimentos de rua violentos que pretendiam substituir o governo de políticos mesquinhos numa “revolução nacional” com  um regime reacionário centrado numa forte figura à frente do Executivo.

Parece não ter havido um debate contemporâneo à esquerda sobre se a extrema-direita era fascista na altura – esta é considerada pelos historiadores, mais tarde no século XX , uma questão académica . Isto é bastante diferente da situação nos Estados Unidos contemporâneos onde a questão teórica do fascismo no movimento  de Trump  de 6 de Janeiro é uma questão de controvérsia intelectual interminável. Isto deve-se provavelmente em parte ao domínio da vida intelectual americana por académicos para quem tais debates classificatórios são uma razão de ser, bem como à falta de uma imprensa socialista de massas para prescrever uma linha política. Léon Blum não era apenas um político mas um respeitado homem de letras, e os seus editoriais de primeira página em Le Populaire eram considerados não mera propaganda mas uma análise que vale a pena ler em todo o espectro político. Em todo o caso, não existe um Comité de Vigilância dos Intelectuais Antifascistas  americano.

Relacionada com a questão de saber se Fev 1934 e Jan 6 2021 foram ou não fascistas está  a questão de saber se foram ou não “golpes” ou “tentativas de golpes”. A primeira coisa a notar aqui é que nenhum partido fascista alguma vez tomou o poder num golpe de estado. Pelo contrário, eles melhoraram gradualmente a sua posição através da dupla via da política eleitoral e da desestabilização da violência extraparlamentar. Tanto em Itália como na Alemanha, os partidos fascistas acederam à liderança através de disputas parlamentares e negociações com líderes conservadores muito de acordo com os procedimentos e normas constitucionais. Depois de entrarem no governo, conseguiram tomar plenamente o poder, mas o período de “normalidade” constitucional poderia durar algum tempo até que uma crise pudesse ser aproveitada. . . A noção de um “golpe fascista” foi em parte o produto de propaganda fascista e em parte o resultado de uma análise errada pelos seus partidos adversários. Robert Paxton escreve:

O mito do golpe fascista em Itália também enganou a esquerda alemã, e ajudou a assegurar a passividade fatal do Partido Socialista Alemão (SPD) e do Partido Comunista Alemão (KPD) em finais de 1932 e princípios de 1933. Ambos esperavam que os nazis tentassem um golpe de Estado, embora as suas análises da situação fossem, aliás, muito diferentes. Para o SPD, a esperada sublevação nazi seria o  sinal para agir sem o ónus da ilegalidade, como o tinham feito com sucesso com uma greve geral contra o “Kapp Putsch” de 1920, quando as unidades Freikorps tinham tentado tomar o controlo do  governo. Com esse modo de pensar, nunca escolheram um momento oportuno para o contra-ataque em relação a Hitler.⁵

A esquerda francesa também interpretou erradamente o momento de Fev de 1934 como um tal “golpe fascista” e adaptou as suas respostas incluindo a greve geral de 12 de Fevereiro para o contrariar. Mas também desenvolveram uma coligação política de mais longo prazo que derrotou a Direita nas ruas, eleitoralmente, e instituiu importantes reformas sociais e económicas.

Embora na altura a esquerda acreditasse que havia, não houve uma conspiração orquestrada centralmente para derrubar o regime parlamentar em 6 de Fevereiro de 1934. A retórica extrema da imprensa e das ligas, bem como a violência policial que enfureceu a multidão, exacerbou uma situação já de si instável, que depois assumiu proporções de crise. Provavelmente algumas figuras da Direita teriam ficado muito contentes por aproveitarem esta crise e se instalarem se a situação tivesse tomado um rumo ainda mais terrível, mas a polícia e os militares mantiveram-se leais. Pela sua parte, a Direita tentou apresentar os manifestantes como veteranos apolíticos ou franceses comuns zangados com a corrupção, que tinham sido vítimas de uma reação excessiva da polícia.  O mito de 6 de Fevereiro e os seus mártires tornaram-se um importante instrumento de recrutamento para as ligas e a Croix de Feu em particular, embora tivesse derramado o mínimo de sangue, tornou-se a formação hegemónica de extrema-direita nos anos que se seguiram.

Em contraste, os acontecimentos de 6 de Janeiro de 2021 foram muito mais centralmente dirigidos e encorajados por Trump. Foi um esforço mal concebido e sem dúvida  impossível, mas era muito claro quem beneficiaria e assumiria o controlo se a situação se agravasse. Parece agora que Trump acreditava plenamente que este expediente desesperado poderia funcionar. Em retrospectiva, isto parece  uma loucura, mas é possível imaginar um cenário em que Trump tinha subvertido e cooptado com sucesso a polícia militar e federal. De certa forma, 6 de Janeiro de 2021 estava muito mais próximo das apreensões fascistas do poder entre guerras na Europa do que estava a movimentação de 6 de Fevereiro de 1934, porque incluía o governo no poder a tentar fomentar uma crise que lhe permitiria tomar o controlo absoluto. Mussolini e Hitler foram capazes de conduzir e equilibrar habilmente as várias partes dos seus movimentos organizados através destas crises, mas Trump tinha défices tanto de habilidade política, organização, como de consentimento em massa que provavelmente condenariam a tentativa desde o início.

Em 6 de Fevereiro de 1934, a opinião pública – de esquerda, direita e centro – ficou amplamente revoltada com o regime parlamentar, e a extrema-direita tentou situar-se como o mais legítimo representante desta cólera popular. Esta proposta foi imediatamente contestada pela mobilização massiva  da Esquerda. O perigo do evento residia na possibilidade da extrema-direita tomar a hegemonia democrática como o principal porta-voz de toda a nação. Toda a Direita convenceu com sucesso uma parte substancial da população da legitimidade e heroísmo da movimentação de  6 de Fevereiro, algo que, de um modo geral, a Direita não conseguiu fazer nos Estados Unidos em 6 de Janeiro. O mito da fraude eleitoral só foi acreditado por um núcleo duro ideológico relativamente pequeno e já convencido. Numa situação de crise de legitimidade e de dúvida mais ampla, com um movimento que tinha conquistado um maior apoio popular, é possível imaginar um resultado bastante diferente. Ainda assim, não há um consenso nacional sobre o “significado” de 6 de Janeiro e há uma luta ideológica contínua para enquadrar o evento.

A rejeição da natureza fascista e da natureza golpista de 6 de Fevereiro de 1934 e 6 de Janeiro de 2021 dependem fortemente de uma interpretação teleológica dos acontecimentos: “Falhou e foi uma farsa, por isso é absurdo chamar-lhe um golpe de Estado ou um movimento fascista”. Também se baseia numa noção caricatural de tomadas fascistas do poder, com sendo o resultado de um acontecimento único dramático e não de um longo processo de desestabilização, subversão da democracia, e compromissos oportunistas e manobras dentro do establishment. Ambos os acontecimentos não devem ser lidos como refletindo a presença ou ausência de “essências” como o fascismo ou um golpe, mas devem ser lidos, isso sim,  como conjunturas que abrem novas possibilidades políticas, bem como dramatizações e cristalizações que lançam luz sobre crises políticas e sociais em curso. Seja como for que lhe queiram chamar, penso que está claro desde 6 de Janeiro de 2021 que um grande potencial, se não mesmo um ponto final teleológico, da política de direita americana é uma espécie de tentativa violenta contra a ordem democrática.

Por fim, a Terceira República não foi derrubada internamente, mas foi conquistada por um inimigo estrangeiro. Mas a confiança  popular na República foi significativamente corroída nos anos entre 1934 e 1940. Embora as ligas tenham sido proibidas sob a Frente Popular, os seus membros estavam prontos para trabalhar e apoiar Vichy quando esta oportunidade apareceu. Apesar de 6 de Fevereiro de 1934 ter sido indiscutivelmente autodestrutivo para a Direita – a Frente Popular foi ativada e levada  ao poder – o  fracasso e a derrota da Frente Popular intimidaram  a Esquerda e o movimento operário. Poderia argumentar-se que as contradições materiais perturbavam a República tanto quanto a falta de “espírito republicano”: em última análise, era difícil resolver as exigências dos trabalhadores  mantendo a produção de armas necessária para derrotar a Alemanha. Talvez nos Estados Unidos haja algum tipo de nó górdio semelhante de forças produtivas centradas nas alterações climáticas e na economia, o que exigirá uma solução decisiva e criativa para evitar um colapso nacional.

O mito de 6 de Fevereiro de 1934 deu coerência e uma sensação de esprit de corps à direita francesa que persistiu durante os anos da Frente Popular e até Vichy. Embora as ligas tenham sido dissolvidas, muitos futuros Vichyistes entenderam que era o seu batismo de fogo e mantiveram viva a sua memória. Não está claro se Jan 6 de 2021 assumirá um significado simbólico semelhante para a Direita Americana em geral ou se continuará a ser uma questão subcultural. O significado político de 6 de Janeiro assenta  agora sobre se pode continuar a servir um propósito ideológico – para a Esquerda ou para a Direita. Com os seus maiores recursos imaginativos e talentos para a luta ideológica, mesmo no meio do seu declínio popular, a Direita tomou até agora a iniciativa de moldar a memória de 6 de Janeiro aos seus próprios fins.⁶

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1. Millington and Jenkins, France and Fascism: February 1934 and the Dynamics of Political Crisis, p. 34

2.Colton, Léon Blum, pg. 95

3.Millington and Jenkins, pg. 69

4.Millington, A History of Fascism in France, pg. 1

5.Paxton, The Anatomy of Fascism, pg. 93

6.Compare os esforços de Trump para criar um culto em torno de Ashli Babbitt, com as tentativas patéticas, egoístas e, em última análise, autodestrutivas de vários jornalistas que tinham estado em cena para se transformarem em mártires vivos do trauma.


Para ler este artigo no original clique em:

Feb 6 1934/Jan 6 2021 – by John Ganz – Unpopular Front (substack.com)

 

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