Seleção e tradução de Francisco Tavares
Nota de editor
À manipulação efetuada pela direita e a extrema-direita espanholas sobre as palavras do ministro Garzón e o pedido da sua demissão, curiosamente juntaram-se os presidentes socialistas de Castilla-La Mancha e de Aragão, respetivamente, Emiliano Garcia Page e Francisco Javier Lambán. Sobre a atuação destes últimos relacionada com matadouros nas suas Comunidades nos fala o artigo de Dani Domínguez que agora publicamos.
5m de leitura
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O que Page e Lambán não contam sobre a indústria de carnes
García-Page e Javier Lambán encontraram-se no meio de controvérsias relacionadas com dois matadouros localizados nas suas comunidades.
Publicado por em 14 de Janeiro de 2022 (original aqui)

Emiliano García-Page, o presidente de Castilla-La Mancha, do PSOE, disse que o tamanho não importa. Referia-se às macro-fazendas e à controvérsia em torno da deturpação das palavras do Ministro dos Assuntos do Consumidor, Alberto Garzón. O tamanho não importa, diz ele, sobre as gigantescas quintas onde o número de animais amontoados no seu interior são a causa do problema do bem-estar animal ou da poluição do solo e da água devido às toneladas de purinas produzidas no interior. E numa altura em que o seu próprio governo proibiu novas aberturas ou ampliações no território de Castilla-La Mancha até 2025.
Noutras ocasiões, a dimensão foi importante para o presidente de CLM; por exemplo, quando se trata de decidir se se pode ou não dizer mal de uma empresa. Aconteceu em Março de 2018, quando García-Page pediu para não se falar mal da Incarlopsa, o fornecedor de carne de Mercadona, sediado na sua comunidade. A razão: o número de postos de trabalho que a empresa tem em Castilla-La Mancha.
O governo García-Page, na realidade, nunca gostou que se falasse mal da Incarlopsa, nem mesmo que isso seja feito pelos veterinários da Junta para denunciar irregularidades. Aconteceu em 2016. Dois funcionários do departamento veterinário do Ministério Regional da Saúde denunciaram que o matadouro de Tarancón (Cuenca), pertencente à Incarlopsa, estava a violar os regulamentos de bem-estar animal, uma vez que os animais não estavam a ser devidamente atordoados antes do abate, o que é exigido por lei.
Estas considerações não agradaram à Incarlopsa e a própria empresa solicitou à Junta de Castilla-La Mancha que retirasse ambos os veterinários das suas funções. “Surpreendentemente, a Administração apressou-se a cumprir este pedido através de medidas de precaução”. As aspas pertencem ao Tribunal Superior de Justiça de Castilla-La Mancha, que dois anos mais tarde acabou por condenar a Junta por despedir dois veterinários que tinham simplesmente feito o seu trabalho. Tanto a Incarlopsa como a Junta foram igualmente condenadas a pagar as custas judiciais.
Entre 2016 e 2017, a Incarlopsa doou 400.000 euros à fundação Impulsa, a entidade que gere a publicidade para o governo de Castilla-La Mancha. Um ano mais tarde, García-Page pedia que ninguém falasse mal da empresa.
Lambán e o alegado mafioso da carne
Nesses anos, a carne também fazia negócios em Aragão. Agosto de 2017. Um grupo italiano de carne tinha praticamente tomado a decisão de criar um macromatadouro em Binéfar, em Huesca. O presidente socialista [da comunidade] de Aragão, Javier Lambán, anunciou alguns dias mais tarde que a declaração de interesse regional para o projecto ia ser aprovada. Acrescentou ainda que a empresa seria elegível para subsídios agro-alimentares, bem como os ligados ao INAEM. A empresa criaria “mais de 600 postos de trabalho directos” e investiria 70 milhões de euros, como se afirmava no próprio website do Governo de Aragão.
O projecto, além disso, beneficiou o presidente da câmara da cidade, também do PSOE. Alfonso Adán, o presidente da câmara da cidade, admitiu que a sua companhia de seguros fez negócios com o matadouro, embora nunca tenha explicitado o montante de dinheiro que recebeu pelo trabalho. A Câmara Municipal tinha de tomar a decisão nessa altura de conceder ou não uma bonificação de 50% no imposto sobre construções, instalações e obras (ICIO), o que significaria uma poupança para os talhantes italianos de quase 400.000 euros. Após a revelação dos negócios do Presidente da Câmara, que não tencionava abster-se na votação, a votação foi adiada e finalmente rejeitada por não cumprir os requisitos.
E havia mais beneficiários. De acordo com o que o jornal Público noticiou na altura, o trabalho imobiliário foi atribuído à presidente do agrupamento regional do PSOE, Rosa Altabás; parte do terreno em que iam estar localizadas as instalações foi adquirida ao pai do vereador Txema Isábal*. O PSOE, contudo, mantém que Isábal foi muito combativo contra a instalação do matadouro na cidade; e a segurança foi contratada ao número 2 da polícia local, Antonio Díez, que até patrulhava as instalações do matadouro vestindo um uniforme de uma empresa de segurança.
À frente deste projecto estava Piero Pini, um magnata da carne que estava a ser investigado na Polónia sob acusações de fraude pelas suas actividades comerciais no país, como noticiado pelo jornal Público. Estes factos eram do conhecimento da administração aragonesa.
Algum tempo depois, em 2019, Piero Pini foi preso pela polícia húngara e esteve em prisão preventiva de Março a Dezembro do mesmo ano acusado de fraude fiscal. O procurador húngaro pede que ele e o seu filho Marcello cumpram três anos e meio de prisão. Nas últimas notícias que se conhecem, Pini foi novamente preso na Hungria no ano passado por alegadamente ter subornado um advogado.
Embora Piero Pini tenha sido o impulsionador do matadouro em Aragão, a empresa que o dirige está em nome de outro dos seus filhos, o que serve de desculpa para os socialistas aragoneses.
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O autor: Dani Domínguez é licenciado em jornalismo pela Universidade Complutense de Madrid e mestre em Comunicação Política. Redator de La Marea e coordenador do suplemento #yoIBEXtigo. Com enfoque nas grandes empresas.