A IDEIA – LIMA DE FREITAS E A SURREALIDADE DO GRAAL – A PALAVRA PERDIDA DO MESTRE MAÇOM – por António de Macedo

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Os simbolismos maçónicos detectáveis nas obras de LF começam por ter a sua origem, naturalmente, nas proporções numéricas e geométricas da Naometria, ou seja, na “conta, peso e medida” do Templo de Salomão.34 Diz-nos o relato bíblico que o rei Salomão mandou vir de Tiro, na Fenícia, um hábil construtor, Hiram Abiff, que se encarregou de todos os trabalhos para a construção do Templo.35 Hiram — emblemático ancestral da operatividade maçónica — separou os obreiros em aprendizes, companheiros e mestres, com progressivos graus de competência, de responsabilidade e correspondentes escalões de salário.

Cada grau tinha a sua palavrachave, que permitia a cada obreiro receber o salário que lhe competia no final do dia de trabalho. Três companheiros quiseram obrigar Hiram a revelar-lhes a palavra-chave do grau de mestre, para poderem lucrar os respectivos benefícios; recusou, e os três traidores assassinaram-no, e uma vez que Hiram não desvendou a palavra-chave, esta perdeu-se, tornando-se na misteriosa Palavra Perdida, o Verbum dimissum de que nos fala o alquimista italiano Bernardo Trevisano (1408-1490) no seu notório tratado alquímico intitulado precisamente Verbum dimissum.

Entretanto a lenda foi assumindo outros coloridos e outras proporções, e a Perdida Palavra Maçónica (Mason’s word) passou a ser algo de mágico que concede o dom da clarividência e da precognição (second sight) aos seus reais detentores, os Irmãos da Rosacruz (brethren of the Rosie Cross)36, tornando-se ao mesmo tempo um novo Santo Graal que todas as fraternidades herméticas esperavam encontrar e cuja procura constituía o fim dos seus trabalhos e a razão de ser da sua existência.37

Esse e outros segredos maçónicos disseminam-se misteriosamente na obra de LF.

Diga-se sem titubeios e com verdade que não foi por mero acaso que eu e LF laborámos, em simultaneidade de anos, na Loja Quinto Império, denominação apropriada à programátca dos Mitolusismos tão cara a este artista simultaneamente noético e pneumático, “iluminador da Palavra Poética”, como lhe chamou um estudioso da sua obra.

Ajunte-se, para informação e reflexão das mentes afectas aos ritmos do céu e da terra, que na Loja Quinto Império se ritualizava o Rito, ou Regime, Escocês Rectificado (R.E.R.), de ancestrais raízes esotéricas e iniciáticas, inspiradoras de Martinez de Pasqually e dos seus discípulos Jean-Baptiste Willermoz e Louis-Claude de Saint-Martin, Rito de uma Maçonaria regular na qual laborava também o maçom António Telmo, que nos oferece estas luzentes notas sobre LF: Imaginando a Terra e o seu Céu como um Templo, e devemos fazê-lo para compreender alguma coisa sobre o destino e o fim da Humanidade, Portugal, visto como um rectângulo, é interpretável como um tapete no centro do mundo. // O Tapete desenhado por Lima de Freitas para as lojas maçónicas do Rito Escocês Rectificado é, igualmente, formado pela soma de dois quadrados, e, como não obedece nas suas proporções “ao que é de regra”, coisa que o ilustre pintor não desconheceria, é de todo nforme” (Sab 11, 17), e que a divina Sabedoria “ordenou todas as coisas com medida, e número e peso” (Sab 11, 20).possível que tenha estudado pela mesma geografia e encontrado, depois, a mesma relação que venho propondo.38

E, mais adiante, Telmo insiste em advertir-nos que LF “conhecia por dentro as regras das proporções”: Como sabeis, Mestre Lima de Freitas era um geómetra de alta sabedoria. Ele conhecia por dentro as regras das proporções. Desenhou o tapete da Loja na forma deum quadrado longo, exactamente composto por dois quadrados equilaterais. Dentro deles figurou os nossos emblemas misteriosos.39

Tive oportunidade de conviver com este histórico tapete durante uma fase dos meus trabalhos de Loja, trabalhos que sempre se pautaram — e pautam — pela regra: ora et labora, insígnia do maçom místico que reparte a sua elevação entre o oratório e o laboratório.

A arte de LF sempre foi uma arte figurativa, como a arte surrealista, e não apenas uma arte de clarões de forma, luz, cor, textura, movimento, dinâmica, sem figura reconhecível que tais estremecimentos suportasse.

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NOTAS

31 Génesis 28, 10-12.

32 E disse o que se sentava no trono: Eis que faço novas todas as coisas (Apocalipse 21, 5).

33 1 Reis 7, 13-22.

34 O poeta, historiador e arqueólogo alemão Simon Studion (1543-1605) escreveu uma obra apocalíptico-profética chamada Naometria (1604), com uma numerologia baseada nas descrições bíblicas das medidas do Templo de Salomão, com previsões sobre eventos futuros da história da Europa inspiradas nessas medidas. — Por sua vez, no livro bíblico da Sabedoria diz-se que a mão todo-poderosa de Deus criou o mundo a partir “de matéria

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