OS HOMENS DO REI – 17 – por José Brandão

D. DINIS (reinou de 1279 a 1325)

 

D. Dinis nasceu a 9 de Outubro de 1261. Foi o primeiro monarca português livre das preocupações de guerra com os Mouros, a quem seu pai acabara de conquistar o reino dos Algarves, assim definitivamente demarcando o espaço territorial do reino.

 

Na Corte em que fora educado projectava-se um pouco da cultura que seu pai trouxera de França, onde vivera e casara. A Corte pulula de intelectuais. Privilegia-se o duelo da palavra em vez do duelo da espada. O rei é um intelectual.

 

Com D. Dinis inaugura-se um novo período da nossa história. O território está já delimitado, abrem-se novos horizontes de esperança e de paz.

 

D. Dinis, coroado rei aos 18 anos, em 1279, tendo casado em 1282, por conveniências de política externa, com D. Isabel, infanta de Aragão, ainda criança menina de 12 anos, teria de esperar pelo menos seis anos para consumar o matrimónio que lhe desse em prole legitima o herdeiro da coroa.

 

Para além dos filhos legítimos, D. Constança que casou com D. Fernando de Castela, e D. Afonso, sucessor do trono, D. Dinis conseguiu farta descendência ilegítima, das muitas damas que conheceu. De entre elas celebrizou-se D. Grácia Anes, senhora de linda figura e extremosa afeição, cujo filho tido de D. Dinis, D. Pedro Afonso, nascido depois de 1280, em Torres Vedras, ficou célebre pelos seus talentos de grande escritor, certamente herdados do avô paterno.

 

Criando no ano de 1290 em Lisboa uma universidade que mais tarde (em 1307) transferiu para Coimbra, e cultivando pessoalmente as letras com esmero, a ponto de nos deixar um cancioneiro de sua composição, que realmente lhe dá direito a ser qualificado entre os mais célebres trovadores de Portugal, D. Dinis inaugurou uma era de verdadeira evolução no movimento intelectual do nosso país.

 

Simultaneamente a indústria, o comércio e a marinha encontravam nele mui zeloso protector.

 

D. Dinis viu os últimos anos do seu reinado perturbados por desavenças de família que deviam amargurá-lo profundamente. Parece que já em 1314 havia sinais de rivalidades entre seus filhos, e principalmente despeitos no herdeiro D. Afonso e no irmão deste, D. Pedro Afonso, por verem D. Afonso Sanches, seu irmão bastardo, na dignidade de mordomo-mor de el-rei. Com efeito, naquele ano fez D. Dinis larga distribuição de mercês por seus filhos.

 

D. Afonso, herdeiro do trono, de seu natural impetuoso e arrebatado, pretendeu que seu pai lhe largasse o governo do reino, e neste desígnio procurou entender-se com D. Maria, rainha de Castela. Apesar da proibição de D. Dinis, conhecedor do mau propósito do filho, este foi em 1319 encontrar-se com a rainha de Castela, donde ela escreveu ao monarca português a fazer-lhe a indecente proposta de ceder o mando a D. Afonso. D. Dinis repeliu a afronta, mas fê-lo em termos atenciosos, para não acirrar mais o filho. Tentava este justificar o seu procedimento atribuindo falsamente ao pai a intenção de transmitir a Coroa a D. Afonso Sanches.

 

Continuou o infante D. Afonso a espalhar intrigas e falsidades sobre os propósitos do pai, que os desmentia nos mais decisivos termos. Inventou-se até que D. Dinis suplicara ao papa João XXII que dispensasse no defeito de ilegitimidade, para que D. Afonso Sanches pudesse alcançar a sucessão do reino, atoarda que o pontífice desmentiu indignadamente em bula dirigida aos estados eclesiástico e secular de Portugal.

 

Chegaram as indisposições a tal ponto que no 1.º de Julho de 1320 mandou el-rei publicar um extenso manifesto, no qual recordava os benefícios que prodigalizara ao filho e exprobrava-lhe a ingratidão com que lhe assacava acusações caluniosas.

 

Entre 1320-1324 é tempo da guerra civil entre D. Dinis e seu filho D. Afonso IV, visto este, apoiado por alguns nobres, alegar que o pai queria deixar o trono a seu filho bastardo, D. Afonso Sanches, irmão ilegítimo de D. Afonso IV.

 

Conflitos tristíssimos eram estes de mão armada, suscitados por despeitos e ambições inerentes ao génio altivo e irrequieto dos revoltosos.

 

Assim se erguiam, esquecidos dos laços de sangue que os prendiam, o irmão contra o irmão, e o filho contra o pai.

 

Reprimindo os abusos da nobreza, já na desmedida supremacia que esta pretendia assumir com respeito às prerrogativas régias, já nos injustos vexames com que ela se dispunha a oprimir o clero, D. Dinis sabia igualmente coarctar as ambições da Igreja. E enquanto o papa Clemente V, abolindo a ordem dos cavaleiros do Templo, se propunha lançar mão dos bens que estes possuíam em Portugal, o ilustre monarca tinha artes de iludir diplomaticamente o ambicioso intento do pontífice instituindo em 1319 a ordem de Cristo e transferindo para ela os próprios Templários com seus antigos bens e rendimentos.

 

 

Em 1321 dá-se o assassinato do bispo de Évora pelos partidários do príncipe D. Afonso. O rei havia conseguido, por seu intermédio, uma bula papal que excomungava todos aqueles que incitavam o príncipe à violência.

 

Finalmente, no princípio de Maio de 1322, estabeleceu-se a concórdia. El-rei acrescentou as rendas de seu filho, e largou-lhe o senhorio da cidade de Coimbra, vila e Castelo de Montemor e os Castelos de Gaia, Feira e Porto, fazendo o infante homenagem de os ter da mão de el-rei e deles fazer paz ou guerra a seu mandado.

 

 

No ano seguinte (1323), o infante, sempre impulsivo e rodeado de maus conselheiros, renovou as hostilidades, partindo de Santarém para ir tomar Lisboa. D. Dinis, antes de ir ao encontro do filho, mandou exarar em instrumento público as queixas que tinha dele, e enviou-lhe parte, que sob pena de sua maldição não fizesse tal jornada.

 

As forças de el-rei e as do infante foram encontrar-se em Alvalade, onde soavam já as trombetas e se despediam dardos quando apareceu a Santa Rainha, que pôde serenar os ânimos e estabelecer a concórdia.

 

 

A Rainha Santa evita batalhas nos campos de Alvalade e consegue fazer as pazes entre o pai e o filho.

 

Bem difícil e dolorosa lhe foi a pacificação das contendas internas entre o filho e o marido bem-amados. Por duas vezes – em Sintra e depois em Alvalade – teve de intervir para impedir o ódio explosivo do herdeiro do trono contra o pai, que ele julgava querê-lo substituir na herança pelo bastardo Afonso Sanches, e teve de acalmar no rei o seu ressentimento contra o filho revoltado.

 

D. Dinis morreu em Santarém a 7 de Janeiro de 1325. No convento de Odivelas, que fundou, pode-se ver ainda hoje o moimento em que jazem as cinzas deste monarca.

 

Domingos Jardo, Afonso Sanches e conde D. Pedro foram homens do rei D. Dinis.

 

 

Domingos Jardo (1240? -1293)

 

Domingos Anes Jardo, nascido na Jarda, Belas, foi chanceler de D. Dinis, bispo de Évora entre 1284 e 1289 e bispo de Lisboa entre 1289 e 1293.

 

Estudante em Paris, foi capelão mor de D. Afonso III e sucessivamente bispo, por influência de D. Dinis, que por ele intercedeu junto do Papa Nicolau IV.

 

Afonso III tão bem compreendera a nova missão da realeza, que um dos seus primeiros cuidados foi dar esmerada educação intelectual a seu herdeiro D. Dinis, procurando para ele um sábio mestre – o doutor Domingos Jardo.

 

Natural da povoação de Jarda, Domingos Jardo desde cedo recebeu educação apurada, tendo estudado na Universidade de Paris. Regressado ao reino, foi chamado por D. Afonso III para ser seu capelão-mor e membro do seu conselho. O seu filho, D. Dinis, fê-lo chanceler-mor do reino, e contribuiu para a sua elevação à cátedra episcopal, primeiro em Évora (1283), onde permaneceu até 7 de Outubro de 1289, data em que o papa Nicolau IV o transferiu para a diocese de Lisboa.

 

D. Domingos Jardo foi o real preceptor de D. Dinis. Era bispo de Évora quando foi escolhido para mestre do infante.

 

Ascendeu a bispo de Lisboa e fundou o Hospital de São Paulo (actual Convento de Santo Elói, em Lisboa), destinado não apenas ao ofício divino, como também ao fomento das letras, de que o reino tanto carecia; diz sobre isto Frei Francisco Brandão, na «Monarquia Lusitana», que os grandes talentos de letras que houve em Portugal nesta época se ficaram a dever à protecção do bispo lisboeta.

 

Senhor de grandes haveres, legou ao seu seminário bens de raiz para que fossem instruídos teólogos e, além dos destinados ao Latim e ao Grego, outros escolares de Direito Civil e Canónico.

 

Depois da sua ascensão ao trono, 1279, o seu antigo discípulo, D. Dinis, fê-lo seu chanceler-mor, sempre ouvido pelo moço rei em problemas de administração e, decerto, como outros membros do alto clero, no da fundação dos Estudos Gerais de Lisboa em 1290, futura Universidade.

 

Outra história tem a ver com a fundação de um hospital para leprosos. Em 1220 a Ordem de Malta tinha uma almoinha, ou horta, com casa em «Santo Lázaro» nos arredores de Lisboa e onde se presume que já lá viviam alguns leprosos daí o nome dado ao local. Foi o Hospital de S. Lázaro fundado, fora e ao Nordeste da cerca Fernandina da cidade, e o terreno que lhe ficava ao Norte, era o Campo do Curral, mais tarde denominado Campo de Santa Ana.

 

 

Era formado por uma cerca murada, com uma capela dedicada a S. Lázaro e rodeada pelas habitações dos gafos ou leprosos.

 

 

Julga-se, que este Hospital foi criado em 1289 por D. Domingos Jardo, pelo facto dele ter deixado no seu testamento, avultados bens a esta leprosaria e, também, por ser voz corrente, que o túmulo existia ao lado esquerdo da porta do Hospital, à entrada, e contíguo à parede da Igreja. Mas o que é certo, é ter-se verificado mais tarde, que esse túmulo, encimado por uma lápide com letreiro em letra poncial, dizia respeito a um seu pupilo, criado e educado em sua casa, e não ao próprio Domingos Jardo.

 

Em frente da Igreja, num largo, havia uma cruz em volta da qual se enterravam os leprosos que ali faleciam. Este Hospital era administrado pelo Senado, ou Câmara Municipal, embora sob a direcção da Coroa e, parece ter sido fundado pala própria Câmara nos princípios do Século XIV, para recolher os leprosos que infestavam a cidade de Lisboa e só esses.

 

Faleceu em Lisboa, em 16 de Dezembro de 1293, tendo sido sepultado na Capela do Sacramento do Convento de Santo Elói, que ajudara a fundar.

 

A seguir: Afonso Sanches

Leave a Reply