Novas Viagens na Minha Terra, Série II, Capítulo 70. Por Manuela Degerine.

Um Café na Internet

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Num Jardim da China


          Há livros que nos transformam. Não somos os mesmos após a leitura, crescemos, tornámo-nos mais justos, mais inteligentes, percebemos que, até ali, não percebíamos… Li recentemente um destes livros. “Dans un jardin de Chine” (“Num jardim da China”) foi publicado em França pelas edições Picquier no ano 2000 e faz a síntese de um saber que Jacques Pimpaneau construiu ao longo de décadas no estudo dos textos clássicos.


           Até aqui eu arrumava os objectos chineses da colecção Calouste Gulbenkian numa banalidade da qual a passagem por Macau, Hong Kong e China me saturara, de que as lojas me haviam definitivamente afastado ao ponto de, quando visitava o Museu, atravessar a sala com paragens apenas nas vitrinas de objetos japoneses, vendo no resto a única falta de gosto cometida pelo esteta arménio. No Museu Guimet de Paris, perante muito maior diversidade, eu seleccionava o verde céladon, as figuras funerárias, enfim, tudo o que, para mim, escapava aos estereótipos…E não atentava no resto.


        Havia contudo lido alguns textos clássicos, visitara os jardins de Suhzu e Hangzhu, vira as proeminências rochosas de Guilin e Yangshuo, sem que tudo isto se aglomerasse na evidência: para além de constante nas artes decorativas, o jardim é um pináculo na arte de viver. Este jardim pode aliás, numa sinédoque, reduzir-se a um vaso, a uma pedra mas, quando pertencia a magistrados, aristocratas, grandes proprietários, tornava-se um espaço rodeado por altos muros dentro do qual se concentrava a Natureza ideal, constituída por lagos, rochedos, flores e plantas com valor simbólico, árvores anãs ou de tamanho natural, todas podadas com formas e proporções rigorosas… Pequenos edifícios com terraços, varandas, vestíbulos, amplas aberturas, ligados por pátios, pontes, portas, permitiam a fruição simultânea do ar livre e de todo o conforto. O jardim era o espaço da vida familiar, era o referente da poesia e da pintura, era ponto de encontro entre estetas que ouviam o jardim, olhavam o jardim, partilhavam poemas ou pinturas sobre o jardim… Era o espaço da perfeição. 

Leave a Reply