As comparações homéricas e a dívida pública espanhola, por Edward Hugh – VI
“Nihil sapientiae odiosius acumine nimio“ (Nada é mais odioso para a sabedoria do que a esperteza em excesso)
Petrarch, “De Remediis utriusque Fortunae”
Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
(Conclusão)
Muito Barulho sobre o déficit
Agora, como diz Victor Mallet, a motivação básica por trás dos recentes movimentos dos principais responsáveis da actual administração espanhola parece ser o de começar a trazer este grande monte de dívida em atraso (especialmente aos níveis regional e local) para cima da mesa .
Madrid pretende organizar o pagamento de mais de 30 mil milhões em contas vencidas e devidas pelos serviços de gestão dos resíduos urbanos e por outros serviços dos municípios, uma medida que irá beneficiar os fornecedores, mas também irá ajudar a expor a verdadeira dimensão da dívida do sector público do país.
“Trata-se de restabelecer a ordem, trata-se de saber o que é que há e qual a forma de poder lidar com ela de uma vez por todas”, disse Maria Soraya Sáenz de Santamaría, vice-primeiro-ministro, depois de uma reunião de gabinete na sexta-feira em que se acordou com a primeira parte do programa.
Mas o grande risco que eles estão a tomar em fazer isso é o de aumentar o nível de dívida reconhecida, até para lá da “zona de alto risco” de cerca de 100% do PIB. Quando se adiciona toda a dívida até já estamos na alta faixa da casa dos 80%, e mais dois anos de défice “normal” além de mais verbas para o sector financeiro deve fazê-la passar a barreira psicológica. Naturalmente os investidores estão a perceber isso, até com as “gafes” do primeiro-ministro Mariano Rajoy e com o fim de semana passada em que o spread a anos 10 dos títulos espanhóis relativamente ao equivalente Bund foi superior ao spread italiano pela primeira vez desde o verão passado.
Assim, a Espanha está num mau caminho, com uma dívida reconhecida que está prestes a disparar rapidamente, enquanto a confiança dos investidores na actual administração está já a descer. É chegado o tempo de “mudar de jogo “ (game-changer) e penso assim, pois que, no caso contrário, este carro está prestes a esmagar-se.
Com a cabeça num tormento, às voltas como um leão mantido à distância, temendo os gangues de investidores e os bandos de traders sobre títulos a apertarem o seu círculo matreiro para o ataque final, prontos para que tudo acabe, Angela esforçou-se por todo o lado à procura das regras, das normas e dos pactos que poderiam salvar o seu exército assediado. Sem qualquer sucesso, o seu carro bateu numa rocha que, como aconteceu a oeste de Grosseto em que se destruiu o infeliz Costa Concordia, juntamente com seu capitão, pois não estava em nenhum mapa conhecido porque não tinha sido previamente avaliada — do mesmo modo, Angela meteu-se a toda a velocidade por essa louca vereda que apenas conduz a um destino pré-determinado: a história e o esquecimento.
Edward Hugh, Homeric Similes and Spanish Debt, Abril 2012