Diário de Bordo de 24 de Maio de 2012

 

 

Temos chamado a atenção, neste editorial diário, para a queda vertiginosa a que os direitos dos trabalhadores estão a ser sujeitos. A poucos dias de mais um aniversário do putsch de 28 de Maio de 1926, podemos reflectir sobre a legitimidade que, na presente situação, teria uma intervenção militar (hipótese já abordada pelos coronéis Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Lourenço,  entre outros). Logo vieram com o papão de não ser curial interromper uma legislatura – seria violar a Constituição e acabar com a democracia, disseram.

 

Perguntamos – qual Constituição, qual democracia?  A Constituição ou aquilo para que ela aponta, têm vindo a ser violada pelos governos do PSD e do PS, através de medidas que vão retirando o que o 25 de Abril restituiu. Este Governo tem feito tábua rasa da Constituição, está a tomar medidas ditadas por interesses exteriores. Quando um executivo toma medidas de recorte autocrático quem o modera e corrige?. Uma intervenção militar seria feita para repor a legitimidade constitucional e não para a quebrar.

 

Os militares em 28 de Maio pareciam interpretar o sentido da vontade das maiorias, que estavam contra as lutas sangrentas que se travavam entre partidos. Embora por detrás do movimento que, de Braga desceu até Lisboa, houvesse terratenentes e a Igreja, havia entre os progressistas quem entendesse que era preciso arrumar a casa, repor a ordem constitucional. Só que a casa demorou quase meio século a arrumar… E passados 48 anos a situação era caótica – embora fosse um caos diferente do que se instalara durante os 16 anos da Primeira República.   

 

Em 25 de Abril de 1974, as Forças Armadas derrubaram o regime do Estado Novo e deram oportunidade ao povo para construir uma democracia. Todos, até os fascistas, queriam a democracia. Não falavam era todos da mesma coisa, quando falavam de democracia. A esquerda assumiu uma visibilidade enganadora – participativa, enchia as praças e avenidas em manifestações pujantes, dominava assembleias, criava órgãos de poder popular. Quando, um ano após a revolução, se foi a votos, viu-se que havia mesmo uma “maioria silenciosa”. O PS elegeu 116 deputados, o PPD, 81 e o CDS, 16. O que somava 213 para um total de 250. A esquerda – PCP, MDP/CDE e UDP não chegaram aos 40 deputados. Havia uma esquerda extra-parlamentar, mas em termos percentuais era irrelevante. Tinha por si a razão de não acreditar na democracia representativa, de propugnar pela criação de órgãos de poder popular. Mas era uma minoria. E dividida.

 

Nós os de esquerda, das várias esquerdas, que sempre tínhamos excluído o PS, fizemos as contas contando com o PS e, sendo assim estávamos em maioria. E foi esta realidade que conduziu ao 25 de Novembro, ao fim da Revolução. E é preciso mais uma vez salientar que Revolução não significava o mesmo para todos os que a desejavam. Quem está no meio de uma dúzia de árvores, pode julgar-se numa floresta – cada fracção revolucionária, vivia no meio dos seus pinheiros e julgava-se na Amazónia.

 

Porém, mesmo em 25 de Novembro, quando se disse que a «legalidade democrática fora resposta» e o sonho revolucionário de uma parte dos portugueses foi dissipado a golpes de realismo neo-liberal, não se foi tão longe quanto hoje se está a ir. Porque, mesmo considerando que não existe consenso sobre o conceito de democracia, muito dificilmente se encontra um enquadramento democrático para o que está a acontecer em Portugal. Só se for no quadro da «democracia orgânica» que a “Revolução Nacional” implantou em 28 de Maio de 1926 e Salazar geriu nas décadas seguintes.

 

 

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