DIÁRIO DE BORDO, 6 de Junho de 2012

 

A Espanha, o nosso vizinho, é um dos países da União Europeia em que o regionalismo está mais desenvolvido. O país conta com 17 Comunidades Autónomas, a que se deve acrescentar duas cidades autónomas, que são Ceuta e Melilla, do outro lado do estreito de Gibraltar. Das Comunidades destacam-se a Galiza, Catalunha, Andaluzia e o País Basco, que são reconhecidas na Constituição como Nacionalidades Históricas e têm um Estatuto de Autonomia especial.


Sem dúvida que o avanço da regionalização foi fundamental para o desenvolvimento do país. A Espanha entretanto tem sido mesmo considerada como tendo um nível elevado de riqueza e bem-estar, bastante à frente de Portugal. Contudo não está a conseguir a fugir ás agruras da chamada crise financeira. E as autoridade europeias, formais e informais (das quais a mais notável é sem dúvida a Senhora Angela Merkel, acompanhada pelo seu ministro das finanças Wolfgang Schäuble), estão a pressionar o governo espanhol para que peça ajuda financeira, portanto, que recorra à famosa troika. Mariano Rajoy não se tem mostrado disposto a isto, mas já há indícios de que virá a mudar de opinião. Isto significará a entrada de políticas de austeridade a toda a força. E estas irão bater com toda a força à porta das Comunidades Autónomas, nomeadamente das com maiores poderes atribuídos e maiores défices orçamentais. Não custa prever a agitação que vai haver. Várias comunidades já tiveram de rever em alta os seus défices. Mesmo tendo em conta que o governo espanhol não é tão maleável (para empregar um termo suave) como o português. Outro problema é que a situação dos bancos espanhóis parece ainda mais grave que a dos portugueses (será possível?). E que vai ser preciso muito dinheiro, muito… Rajoy tentou meter o Banco Central Europeu (BCE) a tratar directamente deste assunto da banca, mas recebeu um não rotundo… Estejamos atentos.


Entretanto é importante enquadrar a situação analisando outros factos com que está ligada. No Público de anteontem, 4 de Junho, lemos um texto de António Correia de Campos, A troika gosta de nós, que nos dá a visão de alguém favorável ao acordo com a troika, embora se procure situar numa perspectiva crítica. Numa caixa em baixo, intitulada Ausência de dimensão cultural, refere o tal não rotundo que Mario Draghi, governador do BCE, deu à Espanha, no problema da situação bancária e indica as razões invocadas (esconder inicialmente a situação do Bankia), mas salienta o tratamento dado pelo mesmo BCE à Itália no fim do ano passado, que envolveu um milhar de milhões em créditos bancários temporários a três anos, a taxas muito baixas. Tratamento feito em condições não previstas no mandato do BCE, portanto havendo uma diferença de critério em relação à resposta dada á Espanha.


Em Portugal, a semana passada, recebemos a visita de Filipe de Borbon y Grécia, príncipe das Astúrias, e de Doña Letizia Ortiz (Diário de Bordo espera não se ter enganado a escrever os nomes). Discursando na Câmara de Comércio e Indústria Luso-Espanhola, referiu que Portugal e Espanha vivem num espaço comum, a Península Ibérica, que totaliza quase 60 milhões de habitantes, e que alcançaram um grau de integração muito maior após aderiram à então CEE. Tudo verdade. Depois referiu que a dimensão ibérica irá dar aos dois povos “mais força e maior capacidade para enfrentarem um futuro que se prevê complexo para os dois povos e para Europa”. Terá sido mais ou menos isto. A seguir, o secretário de Estado adjunto para a Economia, Almeida Henriques, disse que a cooperação económica ibérica é um escudo contra a crise. Terão sido proferidas outras declarações no mesmo sentido. Aqui, Diário de Bordo espera que a concorrência entre portugueses e espanhóis, não ocorra em bases que nos deixem mal. E que assuntos como as ligações ferroviárias, os transvases dos rios em Espanha, e outros mais, sejam tratados tendo em conta os nossos interesses. E, já agora, que a dimensão ibérica de Filipe de Borbon y Grécia não inclua pretensões à coroa de Portugal, à semelhança do seu bisavô, Afonso XIII, que parece ter chegado a acalentar essa ambição. 

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