Foi em 4 de Julho de 1776 que treze colónias inglesas situadas no norte do continente americano se tornaram independentes, após travarem uma guerra com a mãe pátria. O conflito surgiu no rescaldo da Guerra dos Sete Anos, travada entre a Inglaterra e a França. A Inglaterra terá figurado como vencedora, mas tal como a potência vencida, ficou num estado financeiro periclitante. Assim toca de levantar impostos e impôr exacções sobre as suas colónias. Uma das decisões tomadas foi a de atribuir o monopólio do comércio do chá à Companhia das Índias Orientais (Tea Act), o que enfureceu os comerciantes das colónias, a começar pelos comerciantes de Boston. Estes exigiam o direito de só pagarem os impostos determinados pelos seus representantes eleitos, e impediram que fosse desembarcado o chá que aguardava nos navios que estavam no porto da cidade. O governador inglês (cujos filhos seriam agentes da Companhia) não deixou que o chá fosse devolvido a Inglaterra, e então os colonos subiram aos barcos (parece que alguns disfarçados de índios) e atiraram o carregamento ao mar. O Parlamento inglês replicou com os Coercive Acts (apelidados de Intolerable Acts) e suspendeu o comércio em Boston até que fosse indemnizada a Companhia. Outras cidades aderiram entretanto ao protesto. Realizou-se o Primeiro Congresso Continental, exigindo a revogação dos decretos contestados, organizou-se a resistência e começou a escalada que levou à guerra da Independência.
Estes sucessos ficaram na memória dos americanos, que valorizam imenso os feitos e a maneira de ser dos seus antepassados, que colonizaram a América e a tornaram independente da Inglaterra. Inclusive foi criado um movimento intitulado o Tea Party que pretende a redução dos impostos, das despesas do Estado (não parece que de todas por igual) e do peso do Estado federal na vida americana. O movimento parece situar-se muito á direita no espectro político, opondo-se por exemplo às recentes reformas na saúde, à intervenção do estado para evitar falências de bancos e companhias de seguros, e defende a liberdade individual e a competição como motores de sucesso.
O facto é que os EUA, nestes duzentos e tal anos de vida, alcançaram um poderio militar e um peso político sem paralelo na história. Intervêm em todo o mundo, apresentam-se em todo o lado como garantes da liberdade e da democracia, mas na realidade têm uma grande quota de responsabilidade em muitos dos problemas que assolam o nosso planeta. Desde a sobreexploração de recursos, a exportação sem peias de crises económicas, até ao apoio a ditaduras vergonhosas e á manutenção de situações de duplicidade espantosas. Como por exemplo a recusa em aceitarem a jurisdição do Tribunal Penal Internacional , ou darem cobertura ao esmagamento por Israel da população palestiniana, com métodos que lembram o tratamento dado aos índios americanos, ao mesmo tempo que acusam a torto e a direito os seus adversários e rivais de violações de direitos humanos, de práticas criminais, de terrorismo, etc.
O seu contributo para a ciência, a literatura e a arte é inigualável. Sem dúvida alguma que derem contributos únicos para o progresso da humanidade. Mas simultaneamente no país verificam-se contradições que parecem insuperáveis. No país mais rico do mundo vive um grande número de pessoas em condições tão miseráveis como as que existem nos países mais pobres. Num país que tem dado contributos únicos para o conhecimento aparecem movimentos como o criacionismo que pretende inclusive que seja proibido o ensino nas escolas da teoria da evolução. Num país que conta entre os seus cidadãos Noam Chomsky, Ralph Nader, ou os já falecidos Martin Luther King, Arthur Miller e Paul Sweezy, que recebeu tantos refugiados políticos progressistas, predomina na prática um sistema bipartidário que permite eternizar políticas capitalistas e imperialistas por todo o mundo. A pergunta, neste aniversário da independência dos EUA, é a seguinte: será realista esperar que, num futuro próximo, os norte-americanos saberão ultrapassar as enormes contradições em que vivem e que cultivam, dentro e fora do seu país?
Colocando o problema de forma exacta, o que esses movimentos querem é que o criacionismo seja considerada uma teoria científica em pé de igualdade com a Teoria da Evolução de Charles Darwin, coisa que só aconteceria se os cientistas enlouquecessem. Mas, mesmo assim, isso fez com que Ronald Reagan se tivesse proposto, na campanha eleitoral de 1980 para a presidência dos EUA, enviar uma expedição à Anatólia a fim de encontrar a Arca de Noé onde, segundo a Bíblia teria sido recolhido um casal de cada espécie que, em conjunto, repovoariam a Terra terminado o dilúvio. Com essa descoberta ficaria provado que Deus tinha criado todas as espécies ao mesmo tempo. Filmes!
Até encontraram a arca, os casais é que estavam todos divorciados. O Noé, esse, dizia aos quatro ventos que não contassem mais com ele para criar o que quer que fosse.