URUGUAI E PORTUGAL – 3 – por Carlos Loures

 O Uruguai hoje

Se os portugueses de uma forma geral conhecem pouco o Uruguai, parece que os brasileiros também só conhecem este seu país vizinho porque os ricos iam ali divorciar-se ou casar e passar a lua-de-mel em Punta del Este. E também pela derrota da selecção brasileira, em 16 de Julho de 1950, com a equipa uruguaia no Maracanã no Campeonato do Mundo de Futebo. E este desconhecimento entre portugueses e brasileiros, dois povos com razões históricas para conhecerem bem as suas antigas Província Cisplatina ou Banda Oriental, é generalizado. O Uruguai é um país de que se fala pouco.

Eduardo Galeano, grande jornalista e escritor uruguaio lamenta essa ignorância e diz com ironia -“Nós, os uruguaios temos uma certa tendência para crer que nosso país existe, embora o mundo não o perceba”(…)“Os grandes meios de comunicação, aqueles que têm influência universal, nunca mencionam esta nação pequenina e perdida ao sul do mapa.”

E Galeano lembra que se trata de um país que aboliu os castigos corporais nas escolas 120 anos antes da Grã-Bretanha, que adoptou a jornada de trabalho de oito horas um ano antes dos Estados Unidos e quatro anos antes de França, que teve lei do divórcio setenta anos antes de Espanha e voto feminino catorze anos antes de França. Por outro lado, teve proporcionalmente o maior número de exilados durante a ditadura militar, em comparação com sua população. Cinco vezes maior do que a Holanda e cinco vezes menos populoso. Tem mais terra cultivável do que o Japão e uma população quarenta vezes menor.

O país ficou reduzido a uma população escassa e envelhecida. Tristemente Galeano diz que “poucas crianças nascem, nas ruas vêem-se mais cadeiras de rodas do que carrinhos de bebés”.Ainda assim aponta bons motivos para gostar do seu país: “Durante a ditadura militar, não houve no Uruguai nem um só intelectual importante, nem um só cientista relevante, nem um só artista representativo, que estivesse disposto a aplaudir os mandões. E nos tempos que correm, já em democracia, o Uruguai foi o único país do mundo que derrotou as privatizações em consulta popular: no plebiscito de fins de 92, 72% dos uruguaios decidiram que os serviços essenciais deviam continuar a ser públicos. A notícia não mereceu sequer uma linha na imprensa mundial, embora se constituísse numa insólita prova de senso comum.” Talvez por esses “maus exemplos” tentam desconhecer o Uruguai, apesar da insistência dos uruguaios em afirmar que seu país existe. Por tudo isso, Galeano se orgulha do seu “paisito”, “este paradoxal país onde nasci e tornaria a nascer”.

Eduardo Galeano é, talvez o escritor uruguaio mais conhecido, pela sua intervenção frequente em reuniões internacionais e pelo acompanhamento que faz, com textos, entrevistas, dos grandes acontecimentos mundiais. A sua intensa exposição mediática torna-o numa grande figura da actualidade.

Mas a literatura uruguaia tem outros valores – Bartolomé Hidalgo, Juan Zorrilla de San Martín, Adolfo Berro, Juana de Ibarbourou, Delmira Agustini, Horacio Quiroga. Entre os mais actuais, além de Galeano, sobressaem nomes como os de Juan Carlos Onetti, Mario Benedetti, Carlos Martínez Moreno…

Havemos de aqui falar de literatura uruguaia.

Mas hoje vamos falar de futebol. Vamos ouvir u,a entrevista de Alberto Dines com Eduardo Galeano. Ora do que hão-de falar um brasileiro e um uruguaio? De futebol, obviamente. »O futebol é uma alegria que dói», diz Galeano. Chamo a atenção para o excelente português do grande escritor uruguaio. E acrescento que Alberto Dines é um velho amigo de Portugal. Escritor e jornalista é o autor de Morte no paraíso, a tragédia de Stefan Zweig (1981) e de Vínculos do fogo – Antônio José da Silva, o Judeu, e outras história da Inquisição em Portugal e no Brasil, Tomo I (1992). Foi um dos autores de um livro de biografias em que também colaborei – Oitenta Vidas que a Morte não Apaga, obra coordenada por Fernando Correia da Silva. Aliás, o Alberto Dines é um amigo de longa data do nosso Fernando – isto anda tudo ligado, como disse o Guerra Carneiro, o mundo é pequeno, como se costuma dizer, é redondo, como o provou o Fernão de Magalhães. Redondo como uma bola de futebol..

Amanhã: Conclusão

Leave a Reply