SETE NUVENS NEGRAS SOBRE O MUNDO, SOBRE A EUROPA NESTE FIM DE VERÃO, NESTE PRINCÍPIO DE OUTONO DE 2012.

Selecção, tradução e introdução por Júlio Marques Mota

(CONTINUAÇÃO)

Sexta nuvem

(6) O novo elemento que perturba a economia global – parte II

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6.2 Utilização do RMB nas transacções financeiras

A internacionalização do RMB  faz-se de forma prudente  nas transacções financeiras. Em Agosto de  2010, os estabelecimentos financeiros   estrangeiros, entre os quais os bancos de compensação de Hong Kong   e de Macau, bancos estrangeiros que participam  no programa de pagamentos das transacções comerciais  em RMB  e bancos centrais estrangeiros  envolvidos  nas BSAs com o PBoC foram autorizados a investir sobre o mercado interbancário onshore estando porém submetidos a dadas quotas . Em Janeiro de 2011, o PBoC lançou um programa  piloto autorizando as empresas chinesas a efectuarem investimentos directos no estrangeiro em RMB

Os depósitos em RMB em Hong Kong progrediram rapidamente desde 2010, motivadas pela antecipação  de apreciação  do RMB. Em Outubro de 2011, os depósitos atingiam já 96 mil milhões  (618 milhares de milhões de RMB) ou seja cerca de 10% do total dos depósitos bancários em Hong Kong contra 1% em 2010. Se estes depósitos são principalmente devidos às empresas envolvidas nas transacções comerciais transfronteiriças em RMB ( dois terços dos depósitos) eles estão também  relacionados  com os particulares residentes em Hong Kong. Com o programa “Personal Renmimbi Business” ,lançado em 2004,  os residentes de Hong Kong  podem abrir contas bancárias em RMB  e nelas colocarem somas resultantes de operações de câmbio (limitadas a 20.000 RMB por dia e por pessoa)  ou a colocações  provenientes da China , limitadas a 80.000 RMB por dia e por pessoa.

6.3 Factores políticos e financeiros no IDE da China

Antes de 1999, a  China tinha já liberalizado as  transacções comerciais da sua  balança de pagamentos enquanto que as operações financeiras, principalmente  as saídas de capitais, eram ainda limitadas. Apenas os bancos estatais estavam  autorizados a colocar os seus activos no exterior, num  quadro regulamentar muito apertado  enquanto que os indivíduos e  as sociedades não financeiras  estavam proibidos  de investir no exterior. O IDE  chinês começou a crescer no início de 2000, sob o impulso da estratégia das autoridades chinesas destinadas a conquistar o mercado mundial. Tratava-se  sobretudo de  incentivar a actividade das  empresas chinesas  no exterior a fim de melhorar o acesso aos recursos (naturais e mão de obra) para aumentar a competitividade do país. Esta abordagem  inscrevia-se    nas  preocupações do governo chinês  em  garantir o acesso aos recursos naturais e para manter as quotas de mercado da China no que se refere às suas exportações.  De um ponto de vista macroeconómico, desde 2005, num contexto de valorização gradual do renminbi (RMB) e de excedentes significativos  da conta corrente foi operado  um abrandamento das  restrições sobre as saídas dos fluxos de capital para assim reduzir a pressão para a apreciação da taxa de câmbio do  RMB e manter as  reservas estrangeiras em  níveis mais sustentáveis.

Com a implementação da estratégia de conquista do mercado mundial, os bancos chineses puderam   conceder créditos para o financiamento “de projectos  chave no exterior, apoiados  pelo Estado”. A partir de 2006, os particulares  também foram autorizados a investir no estrangeiro no âmbito do Programa Nacional de Investidores institucionais Internos Qualificados (QDII) 1, mas sempre sob a restrição de quotas. O fundo soberano chinês,  China Investment Corporation (CIC), foi criado em 2007 e foi equipado com USD 200 mil milhões, dos quais 90 mil milhões foram destinados às  compras de títulos e de investimentos estrangeiros directos. Os primeiros investimentos do CIC foram no  fundo Blackstone (3 mil milhões) e no Morgan Stanley (5 Milhares de milhões de  USD) resultaram em significativas perdas com o aparecimento da  crise financeira de 2009. Desde então, o CIC dispõe de  400 mil milhões de dólares em  activos sob a sua gestão e incide na sua estratégia  em  investimentos no sector dos recursos naturais através do apoio aos projectos de IDE das grandes  empresas pública chinesas. Por fim,  desde o início de 2011, as empresas chinesas estão autorizadas a fazerem  investimentos directos no exterior em RMB, no quadro do  processo de internacionalização da RMB desencadeado  pelas autoridades chinesas.

Razões financeiras também podem igualmente explicar o recente aumento da quota de IED nos activos estrangeiros da China  (de 5% em 2005 para 8% em 2010), em detrimento do investimento em carteira (de 10% para 6% no mesmo período). Esta orientação reflecte a necessidade das autoridades chinesas de  diversificarem os  seus activos e reduzir o risco de exposição para os títulos do Tesouro americano. A China é o maior credor externo dos Estados – Unidos (excedendo o Japão desde 2008) e detinha, em Fevereiro de 2012, 1 179 milhares de milhões de  USD em  títulos do Tesouro americanos, que representam 31% dos títulos americanos detidos pelo  estrangeiro.  A China alargou a sua estratégia  de investimentos, passando de estatuto  de credor dos  soberanos estrangeiros através da  detenção  de títulos do Tesouro americano ao estatuto  de proprietário de empresas estrangeiras no quadro dos  seus investimentos de participação. A China tornou-se mais activa nos  seus investimentos no exterior através da sua participação na gestão das empresas estrangeiras.

No entanto, as motivações  políticas subjacentes a estas iniciativas de IDE destinadas a reforçar a presença chinesa no exterior, levantam algumas preocupações.  Os investimentos no exterior da China são apoiados principalmente pelo governo, as suas motivações podem levantar a suspeita de serem mais políticas  do que económicas.

As ligações políticas com o Estado  chinês conferem às  empresas públicas que investem no estrangeiro a liberdade de  aumentarem  a sua presença no exterior, em detrimento às vezes da  sua própria rentabilidade. Mesmo se um grande número de empresas chinesas   investem  no exterior não são  empresas públicas, são empresas ajudados pelo governo, com um acesso privilegiado aos empréstimos concedidos pelos maiores bancos estatais chineses, geralmente referidos como os  “Big Four”, ou seja:  Banco Industrial e Comercial da China,  (Industrial and Commercial Bank of China), Banco da China  (Bank of China), Banco da Construção da China  (China Construction Bank) e Banco Agrícola da China  (Agricultural Bank of  China).

Depois de referenciados os dados que reputamos fundamentais para se perceber este ponto 6, retomemos então a temática das nuvens negras sobre o mundo neste fim de Verão, princípio de Outono.

Vários especialistas esclarecidos e perspicazes alertaram para um fraco apoio face à  economia global — os enormes excedentes na balança corrente da China, alimentados através da compra de títulos do Tesouro, ouro, etc. — podem  estar a desaparecer  agora. É um aspecto da imagem da China (um cenário que tem sido bem coberto nos noticiários  e merece muita atenção). Se isto continua como alguns prevêem, isto então vai mudar o mundo.

Para uma explicação, veja-se Russell Napier, de  CLSA, 14 Setembro  2012:

Talvez não seja nenhuma surpresa   tem sido a China que criou a maioria da moeda adicional criada a nível planetário nos últimos cinco anos, apoiada nos seus fortes excedentes comerciais.

Agora, no entanto, alguns analistas estão a comunicar que a torneira da moeda na China  está a ficar seca  e isso poderia desencadear o próximo e mais importante choque deflacionário.

De acordo com o estrategista da  CLSA Russell Napier, disse em  Hong Kong, na semana passada, que desde 2007 a China tem sido responsável pelo aumento da massa monetária em sentido amplo  em cerca de  40% – 45% do seu crescimento nas 16 principais economias mundiais. O crescimento da sua massa monetária    leva a que esta agora seja 14,49 milhões de milhões de dólares  quando era de 5,47  milhões de milhões  em 2007.

Nos Estados Unidos por outro lado, apesar das  várias rondas  de  Ben Bernanke  em termos de quantitative easing, no mesmo período, M3 representa  apenas 10,4% do crescimento total.

O crescimento prodigioso da oferta de moeda  na China tem sido a contrapartida  dos seus fortes excedentes comerciais. Na verdade, a China tem tido e de forma consistentemente excedentária a sua conta de capital e a sua conta corrente  em que,   afim de manter o valor da sua moeda subavaliada   acumula cerca de 3 milhões de milhões  de dólares mais uma  montanha de reservas  Isso levou a grandes quantidades de dinheiro novo que está a ser  criado, com o banco central  a imprimir  yuan (US:USDCNY) como trocar contra a moeda estrangeira aos seus detentores nacionais.

A mudança é agora que os excedentes da China já não se podem olhar como se olhavam dantes, como excedentes garantidos,  nem mesmo a expectativa do aumento continuado  da força do yuan.

(continua)

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