A HISTÓRIA NÃO PAGA DIVIDENDOS – por Carlos Loures

Imagem1 (4)É interessante verificar que algumas das mais agudas críticas ao sionismo vêm de judeus. Hannah Arendt, Idith Zertal, professora de História e Filosofia Política na Universidade de Basileia, nascida antes da fundação do Estado num kibutz, Shlomo Sand, professor da Universidade de Telavive, são três dessa mentes brilhantes que analisam a questão judaica com objectividade e isenção.

São poucas, as vozes que, vindas da Palestina, defendam a causa palestiniana com objectividade e isenção. Compreendo que seja difícil ser isento quando vemos as nossas casas bombardeadas, as nossas crianças assassinadas, a nossa terra ocupada – mas aos palestinianos pede-se esse supremo acto de heroísmo. O fundamentalismo islâmico está a ser o maior aliado dos agressores. Subverte a realidade – transforma criminosos em vítimas e as vítimas em gente que parece merecer o que lhe acontece. A criação do Estado de Israel foi um erro da diplomacia britânica. Porém, hoje a nação judaica é um facto consumado. Milhões de pessoas a povoam. A sua destruição, como propugnam os fundamentalistas islâmicos, seria um crime. E saldar um erro histórico com um crime, não é aceitável – a história não paga dividendos..

Mas se não os paga a palestinianos, muito menos os pagará aos sionistas que usam os cadáveres dos seis milhões mortos no Holocausto para justificar os seus crimes .- como se a Humanidade houvesse contraído para com eles uma dívida eterna. Antes de mais, não foi a Humanidade ou os palestinianos os responsáveis pelo Holocausto, foram os nazis, com o consentimento da maioria do povo alemão. Sendo que alemães   eram também muitos dos que pereceram nos campos de extermínio. No seu livro Como foi inventado o povo judeu, Shlomo Sand vem repor na ordem do dia um tema que tem sido abordado em registos que percorrem toda a paleta cromática das opiniões, das posições ideológicas, das crenças religiosas. O livro de Sand, foi originalmente editado em hebraico Matai ve’eich humtsa ha‘am hayehudi? (Quando e como foi o povo judeu inventado?). Foi em 2008 e a edição valeu ao autor insultos e ameaças.

São três autores importantes na desmontagem da lenda sionista – Arendt explicando que, banalizado o mal, pessoas normais se transformam em monstros, Zirtal chamando a atenção da recorrência do Holocausto no discurso político do Estado de Israel, Sand demonstrando que não há uma etnia hebraica e que o judaísmo é apenas uma religião. O que torna ainda mais monstruosa a criação do Estado de Israel – em nome de uma lenda, um povo foi desapossado do seu território. Para um não crente a Bíblia, neste caso a Torah, é apenas um livro de histórias E essas histórias têm assumido ao longo dos séculos funções normativas das relações sociais. A submissão das mulheres é no texto bíblico um dado adquirido  Assim como a igreja está submetida a Cristo, também as mulheres devem estar em tudo submetidas a seus maridos … (Efésios 5:24). Sabe-se como Maomé se inspirou nos livros sagrados dos cristãos na criação do Corão. A submissão feminina no Islão vem do livro com às três religiões de Abraão.

Também vemos textos ditos feministas que dizem que a mulher tem o direito de se vingar de milénios de repressão sexista. O que dissemos para os judeus, julgamos ser válido para a luta feminista. A mulher tem o indeclinável direito à plena igualdade perante a lei. A culpa da repressão sexista não é exclusivamente dos  homens – vemos nas sociedades islâmicas mulheres a participarem na repressão da liberdade feminina, apedrejando presumíveis adúlteras ou exigindo que as filhas sejam sujeitas à excisão genital. O sexismo é uma doença social e não um crime exclusivamente masculino.. O fundamentalismo islâmico e o radicalismo feminista são inimigos das causas que procuram defender. A História não é uma conta bancária onde o sofrimento de gerações passadas possa ser capitalizado no presente. A História não paga dividendos.

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