FALEMOS DA POLÍTICA ECONÓMICA ACTUAL, FALEMOS ENTÃO DE PUTAS – por JÚLIO MARQUES MOTA

Falemos da política económica actual, falemos então de putas.

(CONTINUAÇÃO)

Parte III

2. Declaração do ministro da Economia e das Finanças

O Ministro da economia e Finanças, Pierre Moscovici, manifestou-se também contra a redução da notação da França e lamentou “os juízos críticos e inexactos ” da Agência de rating. Ele salienta a importância das “reformas para restabelecer a economia do país, as suas finanças e a sua competitividade que foram postas em prática ” nos últimos 18 meses do governo “num contexto económico difícil.

Pierre Moscovici destacou além disso que a nova notação “continua a estar entre as mais altas”, já que é o terceiro melhor possível na classificação da S & P e que isso “demonstra os pontos fortes reconhecidos à França”.

3. Declaração do Ministro da renovação do Sistema Produtivo, Arnaud Montebourg, o homem odiado por Bruxelas por defender um proteccionismo soft para a Europa, que não hesita em declarar que “as agências de notação não têm nenhuma credibilidade”:

“As Agências de rating são aquelas que avaliaram e classificaram com o triplo A bancos que foram depois à falência. Por isso, não dou absolutamente nenhum crédito a estas agências de rating, que também vivem de subsídios que lhes oferecem os bancos, que compram as boas notações e que na verdade escondem um certo número de cadáveres nos seus placards”.

4. Declaração de Marine Le Pen “Este acontecimento mata assim o mito comum para a UMP e para o Partido Socialista, segundo a qual a austeridade vai fazer-nos sair das garras dos mercados financeiros e recuperar a nossa liberdade de acção. Pelo contrário, quanto mais caminhamos na via da eurosteridade, mais nós nos afundamos.

5. Declarações de Jean-Luc Mélechon:

“Nenhum dos sacrifícios exigidos ao povo francês comoverá os financeiros. Então, para quê estar-lhes a pagar mais tributo? Porquê oferecer 20 mil milhões de crédito de imposto aos accionistas, sem nenhum controlo fiscal, se isto é para que os cães de fila das agências de notação reclamem ainda mais “

Repare-se que pelo afrontamento contra a política imposta pela União Europeia apenas se manifestam significativamente o partido à esquerda do PS pela boca de Mélechon e de Marine Le Pen pelo partido de extrema-direita, Frente Nacional, afirmando-se esta contra a presença de França no euro. Lamentavelmente foi assim o comportamento dos partidos políticos do arco do poder. Ninguém do governo põe em causa o modelo que nos levou á crise e que também está a projectar a França numa profunda recessão, modelo este no qual as agências de rating desempenham um papel fundamental, o de encostar á vítima à parede e de não lhe darem, depois, nenhuma margem de manobra. Baixa-se o rating, sobem as taxas de juro, quase que mecanicamente, menor é capacidade de resposta do país vítima às criticas que lhe são dirigidas. E a espira recessiva está assim desencadeada. Quem se refere criticamente ao modelo de Bruxelas? Melenchon e Marine Le Pen, apenas. Os partidos do arco do poder enfiam-se num discurso que passa ao lado das razões que levam à baixa do rating e essas razões são basicamente o modelo de política económica e financeira seguida desde há décadas que exige a sua existência e lhe dá um cunho de legalidade e mesmo de necessidade. Mas é curioso lermos o que nos diz Standard and Poor’s:

“a margem de manobra orçamental da França diminuiu, então [que antes] era por ela considerada como alta relativamente aos países comparáveis”. A Agência indica sublinhar “que os poderes públicos dispõem agora de uma margem de manobra reduzida para aumentar as receitas” e, portanto, para reduzir o endividamento do país.

“Nós consideramos que as medidas de política económica implementadas desde 23 de Novembro de 2012 [data em que S & P havia confirmado a notação do país] não reduziram significativamente o risco de que a taxa de desemprego se mantenha acima de 10% até 2016 “, argumenta a agência. Esta também considera “que o actual nível de desemprego reduz o apoio popular para novas reformas estruturais e sectoriais e afecta a longo prazo as perspectivas de crescimento”.

Somos capazes de não estar em desacordo com isto que Standard and Poor’s afirma, o que não podemos é estar de acordo com a sequência e muito menos com um modelo que através de uma notação das agências ditas independentes, e que pertencem a grandes fundos financeiros, transforma assim problemas conjunturais graves em problemas estruturais bem mais graves ainda, a partir das suas próprias notações, criando-se pois verdadeiros círculos viciosos que só podem terminar ou com a reconfiguração do modelo que não se vislumbra ou com a explosão social, com a sua  destruição, que parece lamentavelmente a via mais provável de quebrar estes mesmos círculos.

E nessa base marcaram a Europa, conforme se ilustra, como zonas diferenciadas de caça, uma vez que são eles que marcam os preços da dívida pública, por efeito da soberania dos mercados, publicamente reconhecida, que os próprios agentes gerem a seu belo prazer.

Antes de vermos a Europa dividida em reservas de caça com diferentes riscos supostos e criados pelos mercados de capitais, vejamos a divisão da Europa por sistemas cambiais e para isso servimos-nos de diversos mapas e gráficos publicados em diversos artigos pela muito neoliberal revista The Economist no mês de Outubro de 2013:

Falemos ... - II

Vejamos agora o peso da dívida relativamente ao PIB pelos diferentes países da União Europeia:

Falemos ... - III

Tornada esta situação clara, vejamos agora o endividamento privado no quadro da União Europeia, ao qual podemos adicionar o endividamento público para termos uma noção do endividamento global de forma imediata no conjunto dos países  citados…

Falemos ... - IV

No gráfico acima é visível, diríamos, o peso das multinacionais em  paraísos fiscais  como o Luxemburgo e Irlanda e bastante menos na Holanda, curiosamente.

(continua)

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Para ler a Parte II deste trabalho de Júlio Marques Mota, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

http://aviagemdosargonautas.net/2013/11/12/falemos-da-politica-economica-actual-falemos-entao-de-putas-por-julio-marques-mota-2/

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