A ESTUPIDEZ É UM CÃO FIEL – 31 – por Sérgio Madeira

imagem163[1]

Capítulo trinta e um

Manuel fez um sinal para o empregado de mesa que veio tomar nota dos pedidos. Um chocolate quente para Cecília, uma água tónica para António, um uísque novo e sem gelo para o pianista.

– Vejo que se têm adaptado bem à vida de Porto Santo…

– Pior vai ser readaptar-nos à vida de Lisboa – gracejou Cecília – Manuel sorriu:

– É verdade, isto é muito calmo – e acrescentou voltando-se para António – quando não há crimes. O Alfredo telefonou-me há coisa de uma hora – tinha registada uma chamada vossa, mas tinha o telemóvel desligado, pois estava a dar uma aula. Tentou ligar-vos…

– Pois foi, deixámos os telemóveis no quarto…

– Pediu para ligarem, seja a que horas for.

– Logo que chegarmos ao quarto, ligaremos.

Cecília perguntou:

– Conhece o Alfredo há muito tempo?

– Vai para 40 anos – e logo acrescentou –  Conhecemo-nos em Moçambique.

– Na tropa? – perguntou António.

– Ele na tropa, alferes médico; eu era civil – e esclareceu – não sou português. Ele, eu, o Francisco Costa e a Maria, formávamos um grupo…

– Os três mosqueteiros… disse António.

Manuel pareceu surpreendido:

– O Alfredo contou-lhe?

António fez um sorriso que podia ser tomado por uma aquiescência e lançou outra carta:

– Há crimes que não podem ficar impunes…

Era a frase com que Alfredo começara a conversa no «hospital». Conversa que Arnaldo interrompera e que, apesar das tentativas de António, o médico nunca quisera reatar. Manuel, ainda com um ar de surpresa a pairar no rosto, respondeu, quase murmurando:

– É verdade. Há crimes que não podem ficar impunes…

Leave a Reply