NINGUÉM OLHA PARA ELAS por Luísa Lobão Moniz

olhem para  mim

“Olhem para mim” é o que todas as crianças querem sentir quando nascem e crescem.

Durante muitos anos ninguém “olhava” para as crianças, porque haviam de “olhar”? Eram consideradas seres que nasciam para ajudar os pais a perpetuarem os seus modos de vida e, por isso, quando atingiam os 6, 7 anos de idade começavam a trabalhar, tal como os seus pais. Eram homens em miniatura que trabalhavam nos campos, nas fábricas, nas minas. Ninguém “olhava” para elas. Eram mão de obra barata e silenciosa.

“Olhem para mim”, são tantos os sinais que as crianças dão e que os adultos não reconhecem como uma chamada de atenção para a sua identidade.

Batem-nos nas costas e dizem “estou aqui” e a resposta é “já sei”. Dói-lhes a barriga sem razão em termos de saúde, mas com razão afectiva, “lá estás tu outra vez…”, dizem-lhe.

bia leitura

 

Batem no irmão porque têm ciúmes, o irmão mais novo veio tirar o espaço e a atenção que era só para elas, “ são tratados da mesma maneira, não sei porque se porta assim …”

O mesmo se passa nos infantários e no 1º ano de escolaridade quando os educadores têm que dar mais atenção a um dos colegas.

Choram por qualquer arranhão nos joelhos, sem importância, mas com a importância suficiente para dizerem “Olhem para mim”. Na escola fazem queixinhas dos colegas porque querem o afecto dos professores.

Mas os adultos só as vêem, na verdade não “olham” para elas.

Os adultos ouvem-nas, mas não as escutam. Não falam com elas, dizem palavras, e…palavra por palavra “então vou para o computador”. O computador dá-lhes oportunidade de repetir o jogo, os adultos, muitas vezes, exigem o que elas não podem dar porque ainda não têm as competências necessárias, mas os pais não “olham” para elas.

Quando são bebes é frequente ouvir “ Oh, ela já é muito teimosa”

Quando têm 2,3 ou 4 anos dizem “Não está quieta, desarruma tudo de propósito”, “só quer vestir o que entende e se não lhes fazem a vontade começa a fazer uma birra que  nunca mais acaba.”

Como estão no caminho certo estas crianças que reclamam que as olhem e que as escutem!

Como conhecer melhor a “minha” criança?

As crianças têm sentido crítico e sentimento de justiça que se modificam consoante a idade.

“Olhem para mim” tem sido uma constante na vida das crianças.

Muitas vezes, quando lemos um conto dos irmãos Grimm, sentimos os medos, as angústias, a alegria do “mau” ter sido castigado.

Durante a leitura das histórias tradicionais, as crianças soltam os seus sentimentos, os seus medos, identificam-se com certas personagens, geralmente as “boas” e as que são “injustiçadas”.

Não é por acaso que as histórias dos irmãos Grimm têm sido contadas através dos tempos!! São histórias recolhidas pela voz dos “antigos” que tinham o hábito de se juntarem, no fim do dia de trabalho, para transmitirem aos mais novos os valores culturais da sua comunidade.

As histórias começam sempre por “Era uma vez” para que as crianças sintam que os temas que são tratados não pertencem só ao tempo presente, que “Olhem para mim” tem sido uma constante na vida das crianças.

Ao ouvirem os contos não se sentem sozinhas com os seus problemas, percebem que há sempre uma maneira de os resolver, mas que é preciso encontrar esse caminho que as levará para mais perto do bem-estar.

Cada vez se torna mais difícil dar a atenção necessária às crianças. A vida fora de casa decorre envolta num turbilhão de acontecimentos e de preocupações.

Pobreza, riqueza, / emprego/desemprego, / álcool, drogas / falta de esperança, / família monoparental, família nuclear/ família alargada, /……..

Onde está a família que era o porto de abrigo para todos? Arrisco a dizer que é na  família, em muitos casos, que se assiste a maior negligência, a maior violência, ao maior mal-estar e neste ambiente quem Olha para Mim?

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