É nestes termos que o procurador Julius Grinnell se dirige ao júri:
«A lei acha-se posta à prova. A anarquia está em julgamento. Estes homens foram selecionados, escolhidos pelo grande júri (câmara de acusação) e inculpados, porque eram dirigentes. São mais culpados que os milhares de homens que os seguem. Senhores jurados, condenai estes homens, fazei deles exemplos, enforcai-os, e salvareis as nossas instituições e a nossa sociedade.»
Estava dado o mote.
Parsons, Engel, Fischer, Spies, Lingg, Schwab e Fielden são condenados à morte por enforcamento, enquanto Neeb é sentenciado a 15 anos de prisão.
Debaixo das mais rigorosas prevenções, quatro forcas são montadas num pátio da prisão de Chicago.
Às 11 h 30 m do dia 11 de Novembro de 1887, Parsons, Fischer, Spies e Engel são conduzidos a esse pátio. À tarde, morrem estrangulados por uma corda brutal que lhes asfixia o direito à vida.
Lingg, que também deveria ser enforcado nesse dia, preferiu tomar nas suas mãos o direito de morrer, deflagrando na boca um pequeno cartucho de dinamite que lhe faz explodir a cabeça.
No dia anterior, Engel tentara também pôr termo à vida na sua cela, bebendo uma garrafa de láudano, mas não conseguiu o seu intento.
Fielden e Schwab tinham visto as suas penas comutadas em prisão perpétua, enquanto Neeb cumpria os 15 anos a que tinha sido sentenciado.
Nem um só condenado cedera um milímetro na sua verticalidade. Todos se mantiveram firmes na determinação de enfrentar com dignidade este destino trágico da morte no cadafalso.
«Virá o dia em que o nosso silêncio será mais poderoso que as vozes que nos estrangulais hoje», articulou calmamente Spies no momento em que lhe tapavam o rosto com uma máscara.
«Hurra! à Anarquia. Este é o momento mais feliz da minha vida», exclamou Fischer com a corda já à volta do pescoço.
«Deixem que a voz do povo se faça ouvir!», são as últimas palavras de Parsons.
As mulheres que lhes estavam ligadas por alguma afeição jamais deixaram de os apoiar e encorajar nestas horas dramáticas.
«Se de mim depende que o Albert peça perdão, que o enforquem», declarara estoicamente a esposa de Parsons, uma corajosa mulher de descendência negra, indiana e mexicana.
Nina van Zant, uma milionária que durante os julgamentos se enamora de Spies, escreve o seguinte: «Prefiro a censura dessa sociedade moral, que não pode compreender o verdadeiro amor, duplicado pela comunhão de ideias, que aceitaria, elogiando-me, o meu casamento com um velho vicioso e inválido, mas que possuísse grandes riquezas.»
A mãe de Lingg escrevia ao filho: «Depois da tua morte, estaria tão orgulhosa de ti como estive toda a vida.»
Uma tia que o adorava, dizia-lhe: «Querido Lingg, aconteça o que acontecer, ainda que seja o pior dos males, não te mostres fraco perante esses miseráveis.»
Deste modo pereceram os que viriam a chamar-se os «mártires de Chicago». No ano seguinte a American Federation of Labor (AFL) decidiu continuar a luta para conquistar o dia de trabalho de oito horas. Marcou para o 1 de Maio de 1890 a data da próxima manifestação de massas. Entretanto, encontraram-se em Paris os representantes de diversos movimentos operários mundiais para tentar coordenar o combate. Os americanos contaram aos europeus a tragédia de Chicago. Em toda a Europa se decidiu então fazer do 1º de Maio uma jornada de reivindicação à memória dos «cinco mártires».
Apesar da ligeireza do tribunal em aplicar tão severas penas aos réus de Chicago, ficaram muitas dúvidas quanto à verdadeira culpabilidade dos sentenciados pelo Tribunal de Cook County.
A par da indignação que se gerou por todo o Mundo e que viria a culminar na consagração do dia 1º de Maio como Dia Internacional dos Trabalhadores, a justiça norte-americana acabará por reconhecer publicamente a inocência dos oito condenados de Chicago.
Após alguns anos de inquérito, em 25 de Junho de 1893, o governador do Estado de Ilinóis, John Peter Altgeld, vem publicamente admitir que o Tribunal de Cook County cometera um gravíssimo erro judicial ao enforcar os quatro inocentes, demonstrando que no tribunal não tinha havido provas concludentes para a sentença proferida.
A maior parte das provas tinham sido totalmente forjadas — disse o governador do Ilinóis John Altgeld, um liberal, que reabilitou as vítimas, o que lhe deu cabo da carreira. Os testemunhos foram arrancados a homens ignorantes e aterrorizados, a quem prometeram a tortura, se recusassem aceder aos desejos da polícia.
Era demasiado tarde.
Das oito vítimas, apenas três podiam aproveitar a reabilitação.
Os outros cinco já constavam definitivamente da História como os «Mártires de Chicago».
Com este acontecimento a América ganhava lugar de destaque no prestígio sindical. A pátria do Capitalismo era também o local de glória operária a nível mundial.
O período que vai de 1869 até às grandes jornadas do 1º de Maio de 1886 assinala uma página ímpar na história do movimento operário nos Estados Unidos. Os trabalhadores revoltam-se em massa contra a duração desumana do tempo de trabalho e pela conquista de leis que reconheçam e reforcem os direitos de organização.
Entre 1870 e 1880, diversas greves de grande envergadura dão origem a violentas lutas que levarão a recontros armados. Em 1877, durante a greve iniciada pelos ferroviários de Pitsburgo, que se estendeu a toda a rede de dezassete Estados, fortes contingentes de tropas, compostos por soldados e voluntários das milícias patronais são lançados contra os grevistas num confronto de proporções até então nunca verificadas.
Thomas Scott, presidente da Pennsylvania Railroad entre 1874 e 1880, aconselhava: «Distribua durante alguns dias aos operários e aos grevistas uma alimentação de balas de espingarda, e verá como eles assimilam esse pão.»
A batalha das oito horas de trabalho nos Estados Unidos.
Com a criação, em 1880, da Federação dos Trabalhadores dos Estados Unidos e Canadá, a luta pela conquista das oito horas vem encontrar novas energias. De facto, ao estabelecer, em Chicago, que o dia 1º de Maio de 1886 seria o dia marcado para uma grande greve geral pelas oito horas de trabalho, esta Federação estava a dar sinal de partida para o que em breve passaria a ser consagrado como o dia histórico dos trabalhadores de todo o mundo.
É nesta conferência do operariado americano que, pela primeira vez, aparece fixado o dia 1º de Maio como data de manifestação proletária.
Praticamente toda a década de 80 esteve dominada por vasta campanha em favor da obtenção das oito horas de trabalho. Em 1886, muitos Estados praticavam já esse horário, embora não fosse extensivo a todos os sectores da população operária.
Os acontecimentos do 1º de Maio de Chicago surgem no âmbito desta grandiosa epopeia do movimento operário norte-americano. As terríveis consequências da tragédia ecoarão por todo o Mundo, abalando profundamente o operariado dos Estados Unidos.