Meus Caros
Amanhã é dia de eleições. Nenhum texto nosso sobre esta matéria. Mas deixo-vos aqui um texto, de temática geral sobre a Europa, num momento em que a crise da Ucrânia abre uma nova página amanhã, e esperemos que não manchada de mais sangue do que aquele que já correu por Kiev, por Donetsk e por outros lugares também.
24 de Abril de 2014
Júlio Marques Mota
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Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
A Europa dos Europeus
Não à miragem mercantil, sim à democracia dos povos
Michel Lhomme, revista Metamag, 22 de Maio de 2014
O voto de Domingo é essencial. É essencial que a esta Europa dos Europeus, consagremos todos os nossos esforços de reflexão para assegurar o acontecimento pela livre decisão. O que se realizou até aos nossos dias, não é a Europa dos Europeus. O que se realizou até aos nossos dias, é uma nova organização da Europa, uma Europa para-estatal, exclusivamente no domínio da economia, no domínio da satisfação das necessidades materiais do homem. É uma Europa materialista que enriquece os Eurocratas, empobrecendo o povo. Desde o fim da segunda guerra mundial, o que os Eurocratas empreenderam e prosseguiram com tanta energia e perseverança, é a reconstrução da Europa material. Era necessário sem dúvida fazê-lo porque a Europa foi destruída sob uma chuva de bombas ou pela invasão a Leste do exército vermelho. Mas a reconstrução meramente materialista e económica da Europa apresentava à partida um perigo não apenas teórico mas um perigo de carácter eminentemente prático, um perigo de natureza política: o perigo economicista.
Devemos nós repreender hoje as vítimas desta confusão europeia? Ouçamos as antigas palavras: carvão e aço, liberdade de circulação das mercadorias, de movimento dos capitais, de desregulação financeira, de suspensão dos direitos alfandegários, contingentes e quotas, privatização, moeda única… Falava-se apenas da política comercial, política agrícola, política dos transportes, política social, de política de conjuntura. Nunca se tratava de política, pura e simplesmente de política. Com efeito, no voto de Domingo, é essencialmente disto que se trata: da Europa política.
Não se trata mais do bem-estar material dos povos, não se trata mais da expansão de uma economia moribunda sobretudo face ao progresso social, às possibilidades industriais e comerciais. Para alguns, certamente, trata-se ainda de acreditar e de elogiar os benefícios do futuro tratado transatlântico que, na costas dos povos, sem nenhuma concertação será assinado e precipitará a miséria do povo europeu doravante enfeudado aos diktats das grandes multinacionais, sem nenhuma norma sanitária ou direito social. Mas para nós, antes disso, trata-se de defender e de salvar desde agora uma civilização, as regras morais, uma concepção da vida e da morte e até mesmo uma certa visão do amor, uma posição poética.
Trata-se de dizer não à miragem mercantil. Trata-se de dizer sim à democracia.
Para além da Europa mercantil, do tratado transatlântico, importa sábado à noite levantar, muito honestamente, muito francamente, a seguinte questão: a ideia europeia, a construção europeia como no-la propõem, ou seja, o alargamento sem fim sob o guarda-chuva da NATO foi realmente aprovada, conscientemente apoiada pelos povos, pela grande maioria dos habitantes europeus? Até mesmo os responsáveis das instituições europeias já não se enganam mais. Eles sabem bem que a sua gestão dos problemas já não corresponde às preocupações da vida diária do homem europeu e que, pior ainda, agravam-na, sabem efectivamente que tudo foi decidido nas seus costas.
Trata-se dos homens da grande renúncia.
Antes mesmo que se tenha construído a Europa, o nosso continente possuía um rico património comum de ordem cultural e espiritual, a que as dissensões, as divisões e as lutas frequentemente devidas à paixão nacionalista, por vezes legítimas, não conseguiram mais que esbatê-las mas nunca destrui-las. Não é o momento, esta noite, de aprofundar o que é uma civilização, o que vale o nacionalismo mas sentimos todos nós que se do nosso passado grandioso, tudo se esbate e se perde nas brumas, restam-nos os valores, os princípios, uma ética na qual acreditamos e que nós distinguimos, Europeus convencidos e não cépticos, dos outros habitantes do mundo.
Hoje, é necessário efectivamente fazer o balanço: a integração económica na qual nos empenhámos não produziu nenhum resultado. O malogro da Europa não é por conseguinte somente o malogro económico mas o malogro de uma visão económica que nada produziu ao nível moral, que produziu apenas homens desencarnados que perderam toda e qualquer relação de solidariedade, trabalhadores e desempregados para oferecer os seus braços em saldo e a quem der mais, como salário de miséria em contrapartida. Desse ponto de vista, , o voto de Domingo será também um voto moral e social porque os Eurocratas elogiam a livre circulação dos trabalhadores europeus como factor de uma autêntica integração, como o ABC da interpenetração dos nossos povos. Efectivamente, a Comissão Europeia promoveu sempre os movimentos migratórios e propôs-se mesmo dar a estes movimentos uma amplitude considerável. Os Eurocratas foram também os homens da grande substituição, da troca dos jovens trabalhadores, da abertura sem fim das fronteiras, da baixa dos salários e da supressão programada da Segurança Social e das pensões de reforma.
Foram também os homens da europeização das nossas empresas familiares que quase acabaram em sangue: falências das pequenas empresas sem haver, depois, quem as retomasse, vendas às potências estrangeiras das nossas jóias da coroa, ou seja, das nossas melhores empresas. E no entanto, são estes o s homens que ousam ainda falar da riqueza da Europa e que elogiam mesmo as suas virtudes pacíficas, ocultando magnifica e deliberadamente as bombas sobre a Jugoslávia, os atentados na Itália dos anos de chumbo, a independência ilegítima do Kosovo, as manipulações da Ucrânia. Falam então de uma violência contida sobre o território francês, [espanhol, italiano, grego, cipriota, português, ou ainda outros mais ] à custa de uma futura guerra civil que nos ameaça.
A força do homem europeu é, que isto não desagrade a Spinoza, a força do livre-arbítrio. O livre-arbítrio, está um pouco para o homem europeu como o dom precioso que os Deus depositaram no seu berço. O voto de Domingo oferece uma nova possibilidade ao livre-arbítrio do homem europeu, oferece a este livre-árbitro a possibilidade rara de não se confinar à livre-escolha ilusória do consumidor e do carrinho de compras e. O livre-arbítrio de Domingo, é o livre-arbítrio da comunidade de destino dos Europeus, da aproximação autêntica entre os homens europeus sobre o destino espiritual que lhes é comum. Este destino, a ideia forte de uma autoridade europeia, de um Parlamento europeu autêntico que exprima a preocupação do interesse comum num novo direito europeu a construir, numa assembleia constituinte europeia.
Não é necessário, por conseguinte, dispersarmos as nossas vozes no Domingo. É necessário também escolher. E, depois, Portugal não está só. Desde há dez anos, por toda a parte na Europa, os olhos estão atentos e a resistência dos nossos povos progressivamente mas imperceptivelmente vai-nos aproximando. Certamente, isto não é devido aos progressos da União! Mas, o facto fundamental existe e subsiste: uma certa forma de consciência europeia nasceu e desenvolveu-se, o sentimento de pertencer a uma civilização comum que encarna ideais e valores espirituais e morais comuns. Não é uma consciência de elites, é antes efectivamente uma consciência populista. Mas nós, nunca tivemos medo do povo porque se volta a falar por fim da Europa como política, da Europa moral e filosófica, da Europa poética, de Goethe, Hugo mas também da Europa de Drieu e de Bardèche.
Portanto, vote livremente por esta Europa, não em ressentimento, não com raiva, mas com a alegria, a alegria de Beethoven que saudou, no seu hino, uma nova vida. É do voto no domingo que a Europa nascerá.
Beethoven, disponível em http://www.youtube.com/watch?v=Q1P6Ml5b15I