LEI MACRON, O GRANDE MEDO DA ESQUERDA – O TRABALHO AO DOMINGO ESCONDE UM CATÁLOGO DE MEIAS-MEDIDAS, por EMMANUELLE ORY-LAVOLLÉE

Falareconomia1

Selecção e tradução por Júlio Marques Mota

mapa_francaLei Macron, o grande medo da esquerda – o trabalho ao Domingo esconde um catálogo de meias-medidas

 

Emmanuelle Ory-Lavollée,  Loi Macron, la grande peur de la gauche- Le travail du dimanche cache un catalogue de demi-mesures

Revista Causeur,  12 de Dezembro de 2014

Lei Macron

Ainda não se deixou de falar da lei Macron. Esta lei intriga, inflama ou incentiva, faz ranger os dentes, faz rir da desgraça alheia ou cheira a algo de muito estranho. As discussões anunciam-se cerradas, as machadadas sobre este projecto não poderão ser evitadas  que tudo quer fazer, não fará provavelmente coisa nenhuma e que recebe os elogios ou os sarcasmos bem para além da França. Se o projecto estiver na linha daquilo que propunha Jacques Attali ao Presidente Sarkozy – libertar o crescimento-  na sua versão final, certamente que irá faltar muito de audácia.

O governo não pode antecipar precisamente o que dará como resultado esta lei, tipo carrinho para tudo, no plano dos factos e isto por múltiplas razões, mas não deixa de nos marcar encontro para meados de 2015 para confirmar as suas vantagens ou benefícios… Isto não dá cabo do pão a ninguém!

Oh, os hábeis calculadores! Se não damos um pouco de atenção aos meios financeiros, entenda-se, mas uma só vez não faz o hábito, uma pequena música positiva… O efeito conjugado da baixa do euro e do preço do petróleo, poderia bem enviar-nos algumas boas notícias. Mas as suas consequências não são imediatas: o peso dos obstáculos económicos, que esta lei do menino-bonito que é Macron é suposto vir-nos aliviar,    é ainda demasiado pesado e difere pois  de 5 a 6 meses os efeitos positivos esperados…

Resumidamente, quando chegar por fim esta brisa libertadora vinda de algures, não é certo que os Franceses aceitarão tomar as bexigas por lanternas, noutros termos, eles atribuirão todo o benefício desta conjuntura macroeconómica à lei económica Macron. É necessário por conseguinte começar agora por um estar a martelar a cabeça por antecipação e constantemente sobre este tema. Se o trabalho for habilmente efectuado, será então muito natural, quando alguns pontos de crescimento – após a vírgula – vierem surpreender os franceses que já deixaram de o esperar e que passarão a atribuir os méritos a esta lei milagre… Abracadabra!

Destinada  ao  “crescimento e actividade”, a lei Macron, é uma centena de propostas que afectam as profissões regulamentadas, a poupança salarial, os transportes, as cartas de condução, a grande distribuição, o Tribunal do trabalho ou as sociedades de auto-estradas e as pensões de privilégios, entre outras actividades. “Levantar os travões, investir e trabalhar” é a sua coluna vertebral. E para fazer isso, é necessário simplificar: o acesso para as profissões jurídicas, por exemplo, permitindo aumentar o número de consultórios ou de gabinetes,  permitindo associar diferentes especialidades e de baixar as tarifas praticadas. Libertar o transporte gratuito por autocarro através da França, reduzir os atrasos e o custo da carta de condução, controlar e ajustar as tarifas de auto-estrada no quadro do mesmo objectivo que as restantes medidas. Atrair os investidores estrangeiros e renunciar ao delito por entrave que fazia figura do espantalho. Reforma do quadro jurídico das relações de trabalho, especialização dos tribunais de comércio para ganhar rapidez. Outras medidas devem facilitar a poupança salarial. Para o comércio, o texto encara alargar as aberturas ao domingo e intervir também em situações onde a concorrência é posta em dificuldade. Um inventário à Prévert, que fornece uma vasto conjunto de simplificações, matizado com um pouco de controlo. Mas, em última análise, nada ou muito pouco sobre o nosso pesado código de trabalho.

Seja como for, seria necessário votá-la já, esta lei. Mas em vez de praticar a pedagogia para apagar a imagem desastrosa do primeiro portador do projecto – recordem-se: Montebourg em cruzada contra todo aqueles que têm a desenvoltura de ganhar a sua vida – e de explicar claramente aos interessados em que consistem as medidas propostas, é uma mensagem meramente política que emitem Emmanuel Macron e Manuel Valls. Sentindo que as reservas a esta lei vêm do seu próprio campo, Emmanuel Macron acreditou necessário recordar que se tratava-se bem de uma lei de esquerda: como é que, de resto, poderia ser de outro modo, dado que se trata de uma lei de progresso e de liberdade?

Para além dos movimentos de rua que diversos pontos do projecto provocam, as reacções mais vivas cristalizem-se sobre um ponto de detalhe. O trabalho ao Domingo ou a questão de o autorizar, em certas profissões, 7 Domingos de trabalho suplementares por ano. E esta questão divide a França com tanto vigor como o gerado pela presença dos infantários nos lugares públicos, como o abandono das notas na escola, ou como os problemas de filiação. É que o Domingo, é sagrado!

A ironia da história é que por razões éticas, filosóficas, religiosas ou sociais, “o trabalho ao Domingo” reúne numa mesma oposição, todas as cores do tabuleiro político ou social. De Martine Aubry, à quem não escapa nenhum cálculo político, aos defensores “de uma trégua” semanal suposta evitar a extensão da febre compradora de que a nossa sociedade é já a sua presa, passando pelos indignados da regressão social, cada um tem boas razões de se revoltar contra uma tal medida consumista. E tanto mais quanto os  números se contradizem sobre os benefícios esperados.

Diz-se que a verdade sai da boca das crianças… Esta vem também, por vezes, de estrangeiros que, vivendo em França, observam as dificuldades da crise com uma distância bem particular: “Na França dir-se-ia que a ideologia vai bem à frente sobre a realidade económica” dizia recentemente um de entre eles.

Talvez seja assim, mas é uma lei de esquerda e esta vai funcionar: é o Primeiro-ministro que o diz.

Emmanuelle Ory-Lavollée, Loi Macron, la grande peur de la gauche- Le travail du dimanche cache un catalogue de demi-mesures. Publicado na Revista Causeur. Texto disponível em :

http://www.causeur.fr/loi-macron-la-grande-peur-de-la-gauche-30587.html

*Photo: PETIT TESSON-POOL/SIPA. 00699762_000001.

 

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