Selecção e tradução de Júlio Marques Mota
A COMISSÃO EUROPEIA É FORTE COM os FRACOS E FRACA COM OS FORTES
Coralie Delaume* , La Commission européenne est forte avec les faibles et faible avec les forts
L’Arène Nue, 11 de Março de 2015
«Queres ou não queres?»: esta poderia ser a pergunta que se gostaria às vezes de pôr aos indecisos da Comissão Europeia. E corríamos o risco de termos como respostas o seguinte: «bem, talvez sim, bem, talvez não». Porque aí estaria um momento em que eles se tornam ambíguos. Vão eles sancionar a França devido ao seu défice orçamental excessivo? Não ainda, parece-nos. Ao fim de de muitos zigue-zagues, Bruxelas decidiu na semana passada atribuir um prazo de dois anos ao nosso país de modo a que possa colocar o seu défice sob a barra dos 3%.
Attention toutefois à ne pas se méprendre. Comme Pierre Moscivici l’a affirmé, « il ne s’agit absolument pas d’une surveillance ». Juste d’une attention appuyée. En outre, il ne s’agit pas non plus d’une punition car « l’Europe n’est pas faite pour punir, pour contraindre ». Non, le Commissaire à l’économie l’assure : il s’agit seulement d’amicales « incitations ».
A França não será sancionada mas continua a ser rigorosamente seguida. Atenção contudo para que não se enganem. Como Pierre Moscivici o afirmou: “não se trata absolutamente de nenhuma vigilância”. Trata-se exactamente, isso sim, de uma atenção apoiada. Além disso, também não se trata de uma punição porque “a Europa não é feita para punir, para condicionar”. Não, o Comissário para a Economia assegura-o: trata-se apenas de amigáveis “estímulos”.
Como se expressam essas incitações, esses “estímulos”? Essencialmente por uma injunção contraditória, que torna ilusório toda e qualquer perspectiva de sucesso. Com efeito, Paris vê-se convidada a respeitar no mesmo tempo os objectivos de défice nominal e os objectivos de défice estrutural. Quanto ao défice nominal, é-lhes pedido que seja colocado em 4% do PIB em 2015, seguidamente em 3,4% em 2016 e 2,8% em 2017. Em termos estruturais, Bruxelas lamenta os esforços de redução insuficientes e deseja que sejam pelo menos de 0,5 pontos de PIB.
Problema: estes objectivos simultâneos entram em conflito. O rácio de 3% de défice público faz parte dos famosos “ critérios de convergência” de Maastricht. A noção “de défice estrutural”, quanto a ela, é mais recente. A incapacidade de numerosos países em controlarem as suas finanças públicas conduziu a Europa de conceder isto: o ambiente degradado, consequência da crise de 2008-2010, torna o restabelecimento das economias difícil. Por conseguinte, decidiu-se igualmente atacar-se “o défice estrutural”, noção estatística um pouco indefinida mas que tem o mérito de ter em conta os efeitos da conjuntura. Em princípio, não se passa a forçar um Estado a praticar mais austeridade se este não for o responsável pelo não respeito dos seus objectivos, e se um ambiente globalmente desfavorável entravou os seus esforços.
É aqui que o cassetete dói. Querer reduzir os dois défices ao mesmo tempo, o estrutural e o conjuntural, infringe toda e qualquer lógica. É querer uma coisa e esforçar-se de a tornar impossível . É dizer que é ao mesmo tempo importante ter em conta a conjuntura e que é igualmente urgente ignorá-la. Um pouco como se alguém explicasse ao piloto de um veículo que o melhor para virar à direita era continuar em frente. Assegura-se assim que vai bater em frente, no muro…
Para além disto, como todos os outros países, a França foi sujeita a uma análise dos seus “desequilíbrios macroeconómicos”, uma outra novidade introduzida em 2011. Este procedimento conduzido a Comissão Europeia a acompanhar também não apenas a dívida publica e os défices públicos dos Estados-Membros, mas também um chamado quadro de bordo composto de indicadores diversos, acompanhados de limiares. Se um dos limiares for ultrapassado, considera-se que o país em análise se arrisca a destabilizar toda a economia da União. Entre estes indicadores está – é uma boa notícia – o saldo da balança corrente. Este não deve exceder 6% do PIB durante três anos consecutivos. Para dizê-lo de uma forma simples, um Estado não pode ter um comércio externo muito florescente sem que isso prejudique toda a UE. É a menor das coisas : em regime de moeda única, um país que acumula excedentes sem que se dê a apreciação da sua moeda para funcionar como instrumento de correcção, fá-lo obrigatoriamente à custa dos seus vizinhos. Na zona euro, os excedentes de uns são os défices dos outros.
No entanto, acontece que há um Estado-Membro que desde há muito tempo tem rebentado o tecto estabelecido, com um excedente regularmente superior à 7% do seu PIB. Este país tem o mais forte excedente corrente ao mundo – está mesmo à frente da China – e o seu excedente comercial bate anualmente o recorde (217 mil milhões de euros em 2014 ou seja 11% melhor que em 2013). A Alemanha, porque certamente é dela que se trata, está sistematicamente fora das regras fixadas por Bruxelas. E com razão : o país não investe. Fazendo assim, não gasta nada, mas destabiliza toda a zona euro zona e hipoteca o seu próprio futuro.
É por isso que a partir de 2013, José Manuel Barroso tinha encarado sancionar a República Federal alemã. Certamente, a ideia foi rapidamente guardada num cofre bem forte e a ideia de a pôr em prática no quadro do aparelho coercivo sobre “os desequilíbrios macroeconómicos “ deixou de ser um tema de interesse. É apenas em voz muito baixinha que a Comissão solicita junto de Berlim algumas correcções. Porque é bem mais fácil incriminar a França pelo seu défice… ou a Grécia pela sua dívida. Quanto à Alemanha, não se saberia impor-lhe o quer que seja, e sobretudo nada que tenha a ver com “as reformas de estrutura”. Depois de tudo isto, como diz Pierre Moscovici, “a Europa não é feita para punir, não é feita para forçar”.
Se isto fosse tudo, seria já muito. Mas há ainda uma cereja sobre este bolo. Ao nível dos rácios destinados a medir os grandes desequilíbrios figura um indicador relativo ao desemprego. Em princípio nenhum Estado deve ter um desemprego superior a 10% em média sobre três anos. Na Grécia, a taxa de desemprego é de 26%, na Espanha de 24%, em Portugal de 13%, na Itália de 11%. A média da própria zona euro é superior à11 %. E o que é que se faz? Prescreve-se aos países em crise das medidas de austeridade incluindo a particularidade…. de aumentar o desemprego. Mas ninguém se vai queixar dessa prescrição porque isso poderia ser bem pior. Estes países poderiam com efeito ser sujeitos a sanções por causa de tais derrapagens. Tem-se finalmente essa possibilidade, [ a de estar calado}]porque como diz Pierre Moscovici “a Europa não é feita para punir, não é feita para forçar”. E como nos dizia George Orwell em 1984, “ a Oceânia sempre esteve em guerra contra a Estasia”.
Pierre Moscovici sur le budget 2015: “il n’y a pas de sanctions contre la France, il y a des incitations”
Pierre Moscovici était l’invité de RTL ce vendredi matin. Le Commissaire Européen aux Affaires économiques et financières a notamment évoqué le délai de deux ans accordé à la France sur son déficit public. Selon lui, le pays est censé trouver environ 4 milliards d’euros supplémentaires en 2015.
Pierre Moscovici était au micro de RTL ce vendredi matin. ©Capture d’écran RTL
A França sob vigilância apertada pela Comissão Europeia
“Não se trata de modo nenhum de uma vigilância apertada. A França é um país da União Europeia e por conseguinte como tal, deve respeitar as regras comuns. Estas regras não foram respeitadas no passado, devem ser respeitadas em futuro”.
“O que é dado à França é um caminho, não é uma punição, uma sanção. Sempre considerei, como Comissário, que as sanções são sempre um erro. A Europa não é feita para punir, para forçar, ela é feita para incentivar um país a mudar, , a reformar-se e restabelecer também a situação das suas despesas públicas”.
“Houve uma discussão complicada na Comissão Europeia. Penso que no fim a decisão finalmente tomada é perfeitamente equilibrada. Não há sanções contra a França, há sim estímulos. A França tem necessidade de reformas, de uma economia mais competitiva. A França tem necessidade de restabelecer o seu comércio externo”.
“Vou pedir ao governo francês que apresente um plano nacional de reformas no mês de abril”.
Plano de reformas
“A lei Macron é um primeiro passo mas é necessário continuar [ para além dela e no mesmo sentido, isto é, mais reformas na liberalização dos mercados]. O Primeiro-ministro está a considerar reformas sobre o diálogo social, talvez reformas sobre o mercado do trabalho. Não estou lá para falar em nome do governo”.
“Não se pede ao país que se reforme desta ou daquela maneira. Pede-se-lhe que se reforme. Respeita-se as soberanias nacionais mas é necessário que estas soberanias se inscrevam num quadro comum”.
“Não falo de sanções mas de estímulos. Mas estes estímulos são urgentes. Diz-se-lhes firmemente que é necessário fazê-las, estas reformas, como todos os países da Europa muito simplesmente”.
“Agora é necessário pôr as reformas no papel, [ na lei e aplicá-las] ”.
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http://l-arene-nue.blogspot.pt/2015/03/la-commission-europeenne-est-forte-avec.html