Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
A França deve mudar de política
Os tempos de Lawrence da Arábia ou de Sykes-Picot já não existem !
Michel Lhomme, LA FRANCE DOIT CHANGER DE POLITIQUE – Les temps de Lawrence d’Arabie ou de Sykes-Picot sont révolus !
Revista Metamag, 29 de Abril de 2015
A persistência de conflitos antigos ao Médio Oriente alimenta tensões e ódios tenazes que se combinam com conflitos transnacionais novos. Existem interacções complexas e múltiplas entre o lancinante conflito israelo-palestiano, as consequências devastadoras da intervenção americana no Iraque de 2003, a questão da energia nuclear com o Irão, a guerra civil na Síria, as rivalidades multi-seculares entre o mundo sunita e chiita, (a guerra civil actual no Iémen e o antagonismo entre o Irão e a Arábia Saudita), a questão dos Curdos e o desenvolvimento “do Estado Islâmico”, movimento terrorista niilista, frequentemente instrumentalizado pelas potências da região e pelo Ocidente.
O conjunto destas rivalidades e destes conflitos, complicados pelas segundas intenções e pelo jogo de póquer mentiroso de certos Estados da região mas também pela batota feita pelos Estados Unidos fazem do Médio-Oriente um barril de pólvora cujos efeitos de guerra serão destruidores para o futuro, ameaçando directamente Estados estáveis como a Jordânia ou mais ainda o Líbano, e atingindo directamente a França, por conseguinte a Europa, colocando até em perigo a estabilidade do mundo.
Voltemos ao conflito israelo-palestiano.
Recentemente, o relatório da missão de informação sobre o Médio Oriente redigido pela Comissão dos Negócios Estrangeiros da Assembleia Nacional propôs recolocar no jogo diplomático o Conselho de Segurança a fim de elaborar uma solução para o conflito israelo-palestiano. Com efeito, os Estados Unidos, único actor de peso implicado nas negociações de paz desde o abandono pela Europa de uma política internacional autónoma e, sobretudo, desde o alinhamento da França sobre Israel, parecem incapazes de conseguir alcançar um acordo de paz. Parece claro que só uma iniciativa internacional firme e concertada, com objectivos e um calendário claramente identificados, estará em condições de revitalizar um processo de paz moribundo. É reposicionando-se num quadro multilateral que a França deve, com os seus parceiros europeus e os Estados árabes trabalhar em prol da resolução deste conflito com base no reconhecimento mútuo de dois Estados, vivendo em paz e segurança.
Reatar com o Irão e a Síria
Neste quadro, a Comissão da Assembleia Nacional recomenda também reintegrar no jogo diplomático o Irão, potência regional, favorecendo uma solução ao processo nuclear sem estar a ceder sobre o fundo do problema. É uma boa via. Só um acordo equilibrado com, por um lado, o Irão que se comprometeria a dar garantias para permanecer no limiar e do outro os 5+1 que aceitariam que o Irão desenvolva em toda a transparência o seu programa civil, permitiria estabilizar a região. É necessário também procurar o mais rapidamente possível uma solução política para a guerra civil na Síria sem estar a pôr como condição prévia a eliminação de Bachar El-Assad dado que é agora evidente que uma solução militar parece impossível e que o Exército Sírio Livre, dividido, está totalmente diminuído.
De mais, a França teria todo o interesse em restabelecer o mais rapidamente possível as suas relações diplomáticas com Damasco no interesse da sua luta contra o terrorismo. dado que deveria com a Síria laica melhor coordenar a luta contra “o Estado islâmico”, o núcleo do terrorismo, e proteger as minorias cristãs. A França entrou numa nova cruzada que não lhe diz respeito em nada, que não corresponde a nenhum dos seus interesses vitais. Acreditou sem dúvida ( o sonho israelita do Eretz bíblico) que poderia remodelar à sua vontade sobre uma ponta da mesa o mapa da região.
Fazer uma viragem de 180° e mudar de ministro
É imperativo que a França redefina o mais rapidamente possível toda a sua política externa na região. As suas responsabilidades específicas tanto no exterior como no interior a isso a devem obrigar, particularmente (o famoso “Islão da França”). Na falta disso, perderá toda e qualquer influência mas sobretudo e isto é o mais grave, perderá todo o respeito na região
Numa só palavra, a França deve reencontrar uma política estrangeira independente e conforme aos seus interesses: deve desistir do seguidismo atlantista e europeu que é hoje a sua linha de conduta, abandonar as suas posturas e rigidezes ideológicas estéreis, e ter em conta as realidades geoestratégicas novas da região.
Ora, em Paris e contra a expectativa dos diplomatas, mantém-se o dinossauro Fabius nos Negócios Estrangeiros, paralisando de facto toda e qualquer mudança urgente de posição diplomática no Médio Oriente. A realidade está aí. Com um Bandar saudita que intrigando em Jerusalém, um Líbano que recebeu na segunda-feira passada a primeira entrega de armas francesas financiadas “por um donativo” saudita de 3 mil milhões de dólares, certas peças do jogo de xadrez oriental moveram-se e avançaram pouco a pouco para o fim da partida, e este será necessariamente com um novo Irão, um Irão que se terá de uma certa maneira finalmente “americanizado” e “achinesado”!
Michel Lhomme, Revista Metamag, LA FRANCE DOIT CHANGER DE POLITIQUE – Les temps de Lawrence d’Arabie ou de Sykes-Picot sont révolus ! Texto disponível em :
http://www.metamag.fr/metamag-2864-LA-FRANCE-DOIT-CHANGER-DE-POLITIQUE-.html
Imagem no princípio do artigo: O Emir Faycal e Lawrence da Árabie, um tempo que já não existe.