E se o défice orçamental fosse menor do que aquilo que se diz? – por Arnaud Parienty e Júlio Mota III

Falareconomia1

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

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(conclusão)

 

 

O texto de Arnaud Parenty de que se partiu para esta peça é de Novembro de 2014. Achámos por bem completá-lo com um texto de Chavagneux da revista Alternatives Economiques de Abril de 2015 que aparece portanto na sequência do texto de Arnaud Parenty e em que se enriquece a informação prestada pelo texto deste último autor ou até pelos nossos acrescentos ao mesmo tempo texto, devido aos acontecimentos entretanto ocorridos. Isto mostra igualmente que na União Europeia navega-se apenas à vista, ao sabor dos acontecimentos pontuais, ao sabor da capacidade de cada governo se poder opor à Comissão Europeia. Mais uma prova de que chamar a este grupo de países União Monetária só por esquecimento do prefixo (DES) União, só pode ser por ironia pura. Por isso, incluímos esta caixa, já depois da peça estar feita, pois só hoje e por mero acaso tomei conhecimento do texto de Chavagneux aqui incluído.

Júlio Mota

O défice estrutural : o idiota útil da Europa

CHRISTIAN CHAVAGNEUX-Alternatives Economiques, 17 de Abril de 2015

Numa situação típica de ser considerada um “ tiro no pé “, os peritos de Bercy acabam por querer levar a Comissão Europeia a uma situação igual. Entregando na quarta-feira o seu programa de estabilidade orçamental, o governo tomou a liberdade de fazer e apresentar um pequeno cálculo que lhe permite devolver o argumento tradicionalmente utilizado pela Comissão para forçar os Estados a mais austeridade.

Os dois défices

Quando se acompanham os debates – os combates? – orçamentais entre a França e a Europa, cai-se rapidamente sobre duas definições do défice: o défice nominal, o que se verifica ( a que chamamos efectivo)   e que a Europa nos exige que coloquemos sob a barra dos famosos 3% do PIB; e o défice estrutural, o défice que teríamos se não tivéssemos problemas de crescimento e se a economia francesa se situasse a utilizar plenamente a sua capacidade produtiva, ou seja seria o défice que a França teria se a economia francesa estivesse a trabalhar ao nível do seu PIB potencial .

O problema, é que o PIB potencial de um país e o seu crescimento, o crescimento potencial por conseguinte, não são observáveis. É necessário calculá-lo [ estimá-lo por métodos relativamente sofisticados] e, como o mostrou recentemente o Banco de França, há múltiplas maneiras de fazer essa estimativa cálculo que não conduzem ao mesmo resultado, dependendo das hipóteses colocadas . É por isso que os economistas não estão de acordo sobre que constitui o crescimento potencial de um país, as estimativas podem ir para a França, do simples ao dobro!

Um cálculo político

Um instrumento económico tão pouco científico podia apenas deixar lugar à tentativas de utilização política. Os partidários da austeridade na Comissão insistiram para se recorrer à noção de défice estrutural. Assim, os partidários da austeridade na Comissão insistiram para recorrer à noção de défice estrutural. Estes dizem que a diferença entre o crescimento potencial e o crescimento efectivo francês é fraca e que se existe défice este é sobretudo estrutural: mesmo que a conjuntura melhore, as tendências de fundo da economia estão em défice, não se deve portanto afrouxar a austeridade.

Defendendo a posição contrária, Bercy avança que a diferença entre o crescimento potencial do país e o seu crescimento efectivo é importante: se a conjuntura voltar a ficar melhor, o défice vai-se reduzir por isso mesmo, por efeito da melhoria da conjuntura. Não vale a pena estar a sacrificar a economia com uma cura pela austeridade.

Uma pitada de crescimento potencial

Nas suas previsões orçamentais entregues em Bruxelas, o governo prevê por conseguinte uma pequena retoma e um pequeno aumento do crescimento potencial devido ao facto que as empresas vão-se colocar a investir e a aumentar o volume de emprego. Mas, no final, a diferença entre crescimento efectivo e potencial permanece forte (- 3,5% de 2015 à 2017; -3,2 em 2018).

Em suma, para Bercy o défice é sobretudo conjuntural, vai melhorar   sem se ter necessidade de mais austeridade.

O picante de tudo isto está no facto de que no final de 2014, com a moral em baixo, a França tinha reduzido o nível considerado de crescimento potencial porque Bercy acreditava que a França estava à beira da deflação… Com a melhoria da conjuntura, as perspectivas de crescimento efectivo melhoraram e Bercy… sobe três meses depois o nível de crescimento potencial para manter a diferença entre os dois níveis e justificar o caracter conjuntural do défice!

A Comissão quis-se armar em esperta para forçar os Estados, a França em especial, a aplicar mais austeridade. A França está, também ela e em sentido contrário, a fazer a mesma coisa.

CHR

 

Ora, as autoridades europeias consideram que o essencial do desemprego que apareceu depois da crise de 2008 é de natureza estrutural, o que é muito contestável: o que é um desemprego estrutural cujas variações seguem a conjuntura? Esta visão pessimista incita-os a minimizar a diferença de produção, por conseguinte, a minimizar o défice orçamental conjuntural e por conseguinte a exigir mais austeridade… que , por sua vez, aumenta a diferença de produção .

A OCDE e o FMI publicam as suas próprias estimativas, mais optimistas do as da Comissão (ver gráfico). Certos autores sugerem mesmo que a diferença de produção seja bem mais elevado do o que estes três organismos sugerem. Os economistas do banco JP Morgan consideram assim que a diferença de produção é de cerca de – 6 % em 2014, o dobro do que calcula a Comissão.

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A cada um a sua estimativa — A diferença de produção em 2014 segundo as três fontes em percentagem

Paul Krugman, do seu lado, observa que, de acordo com os cálculos da Comissão, em 2007, a França tinha uma diferença de produção positiva de 2,8 % e o Reino Unido de 3,7 %. Por outras palavras , estes dois países operavam largamente acima das suas capacidades de produção. E sem nenhuma inflação, o que é uma espécie de milagre económico, que a Comissão não se dignou a explicar!

Uma revisão do modo de cálculo teria efeitos importantes. De facto, tendo em conta os aumentos de impostos e as economias realizadas sobre as despesas públicas, seria sem dúvida suficiente que houvesse um pouco de crescimento de modo que o orçamento esteja na situação de equilíbrio nestes dois países.

É tempo de acabar com a histeria austeritária .

ARNAUD PARIENTY, Júlio Mota.

 

 

Nota de edição –  O texto de base é um texto de Parenty, aqui utilizado na íntegra.  O seu a seu dono. Fomo-lo alargando e daí o ter ficado com outra dimensão. Daí portanto o ter adicionado o meu próprio nome.

E se o défice orçamental fosse menor do que aquilo que se diz? – por Arnaud Parienty e Júlio Mota II

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