39. Caderno de notas de um etnólogo na Grécia-Uma Estação a chegar ao fim II

Falareconomia1

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

Revisão Flávio Nunes

 

(conclusão)

Mais o grande defeito da Unidade Popular é de ser um movimento iniciado a partir do topo de Syriza na precipitação através de todos estes acontecimentos do Verão 2015, no entanto previsíveis. O seu programa, enfim, é (praticamente) é liberto das escórias europeístas de SYRIZA, e os seus economistas, Kóstas Lapavítsas à cabeça (eleito deputado SYRIZA em Janeiro) trabalham no bom sentido, sem, no entanto, estarem a acariciar as orelhas dos Gregos. O dracma não resolverá os nossos problemas por milagre, mas é indispensável para encarar outra coisa que não seja o cemitério do euro, era tempos de o dizer assim.

O que não é presságio em nada, dos bons (ou menos bons) resultados eleitorais do novo movimento, sob a direcção dos antigos da Plataforma de Esquerda. Veremos então qualquer coisa de tudo isso no espaço de duas semanas.
Em contrapartida, numerosos são aqueles que à esquerda, prevêem já um reforço do PC grego, o KKE. Tempos no entanto agrestes. Assim, Panagiótis Lafazánis acaba de dar uma longa (e interessante) conferência de imprensa, na terça-feira 8 de Setembro sobre a Unidade Popular, quando lhe é posta a seguinte questão por um jornalista: “Porque é que um eleitor de esquerda escolheria a Unidade Popular… em vez do KKE, que não alterou a sua posição e além disso teve razão sobre SYRIZA e sobre a UE?»; o chefe do movimento respondeu… sem estar a responder precisando que: “o KKE não é o adversário da Unidade Popular, salvo que infelizmente, para os líderes do KKE, é a Unidade popular que toma a forma de um adversário político manifesto. Infelizmente, numa recente brochura do KKE, descobre – se uma página inteira consagrada a uma muito viva crítica dos argumentos da Unidade Popular e apenas três linhas… que se escrevem então contra o discurso da Aurora dourada, é triste” – cito de memória (Rádio 105,5, o 8 de Setembro).

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Autocolante em Atenas. Setembro 2015

 

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Edifício onde foi pronunciado o discurso da Libertação por Georges Papandréou em 1944. Praça da Constituição, Setembro de 2015

 

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Nostalgia de uma época. Atenas, Setembro de 2015

O quotidiano compõe-se e decompõe-se apesar desta campanha eleitoral simultaneamente muito dramática e muito pesada de suportar. No Peloponeso, as laranjas por vender às vezes são atiradas fora enquanto na capital, os visitantes, da mesma maneira que os habitantes, ignoram visivelmente os quiosques eleitorais dos partidos e preferem fazer-se fotografar na Praça da Constituição.
Ninguém referencia a placa comemorativa renovada, do discurso da Libertação (em Outubro de 1944) e de Georges Papandréou então um Primeiro-ministro muito ligado … à poderosa Grã-Bretanha. O seu neto, depois de ter… com valentia trabalhado a favor do memorando I, não se apresentará às eleições de Setembro de 2015. A sua missão foi realizada, na época (2010), ele afirmou mesmo que o seu memorando seria provisório e que duraria apenas um ano, antes da retoma e da saída da crise.
Cinco anos após, Alexis Tsipras retoma este sofisma por sua conta, além da lista de argumentos da chamada … “Esquerda verdadeira”. Mentalidades portanto voláteis, vida então a voar. É bem estranho, somente, quando discuto com alguém através de uma certa Grécia em Atenas ou noutro lugar, já não ouço a mais pequena palavra de simpatia em defesa de Alexis Tsipras. Bem pelo contrário, no Peloponeso ou em Ática (em certos bairros), os que se pronunciam abertamente em prol da nostalgia dos Coronéis são suficientemente numerosos, “porque tudo aí era mais simples, melhor controlado e além disso, tínhamos trabalho e sem esta dívida do Estado e sem mais esta imigração ”. Estereótipos retrabalhados com um molho muito azedo por agora e ao mesmo tempo, maneira de dizer… aqueles que assim se exprimem, votariam a favor dos neonazis da Aurora dourada. Impossível saber se é está certo… excepto na noite do 20 de Setembro.

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Reunião pública do Conselho de Ática. Setembro de 2015

 

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A Grécia quer viver e viverá. Frase do século XIX. Monumento ateniense. 2015

 

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Produção grega. Atenas, Setembro de 2015

A Grécia quer viver e viverá” pode ler-se sobre um monumento ateniense à memória da famosa… da grande frase do século XIX, pronunciada aquando de um discurso na Câmara por Charilaos Trikoupis, em 1885. Para a pequena história, Charilaos Trikoupis (1832 – 1896), morto em Cannes na França, foi um homem político que ocupou a função de Primeiro-ministro por sete vezes de 1875 a 1895.

O seu sexto mandato como Primeiro-ministro (1892 – 1893) foi o mais dramático. Apresentou-se ao Parlamento onde teria dito a outra frase famosa que lhe é atribuída (mas que não consta nas Ata dos debates): “Infelizmente, estamos arruinados”. E a Grécia… assim se declarou em falência.
Em 2015, as falências de outrora são ignorados e quanto à nossa, a de agora, ela faz parte do regime político da meta-democracia e da “ governança” pela dívida. Quase que nos habituaríamos a isso, e é talvez nisso que algumas… reuniões de rotina, as do Conselho regional de Ática por exemplo, se desenrolam às vezes num ambiente… rodado e quase amigável.

 

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Homenagem a Ángelos Terzakis, Atenas, Setembro de 2015

 

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Pela dignidade e pela liberdade . Atenas, Setembro de 2015

Durante esta semana, o Terceiro Programa, a nossa única rádio pública cultural e musical, teve a excelente ideia de repetir excertos lidos do caderno pessoal do romancista Ángelos Terzakis (1907-1979), datando da época da Ocupação (dos anos 1940) e dos inícios da Guerra civil (1944). Curtos, sombrios e infelizmente justos sobre a condução humana.
Recordar-nos-emos do romance de Ángelos Terzakis “Princesse Isabeau”, um do clássicos da literatura grega moderna, publicado em 1945, em que se põe em cena o Peloponeso medieval do fim do século XIII século ocupado pelos Francos para assim evocar a Ocupação da Grécia pelos Alemães.

As páginas do seu caderno pessoal escritas durante as longas semanas da batalha de Atenas (entre a Esquerda e o Monarquista incluindo os colaboradores, nunca censurados e reforçados pelas Forças armadas britânicas entre Dezembro de 1944 e Janeiro de 1945), fazem-nos então reviver este período “ em que ninguém se mostrou… à altura da história”, depois de … tanto sangue vertido pela dignidade e pela liberdade.

“Pela dignidade e pela liberdade”; é também um slogan sobre os muros de Atenas neste Verão de 2015. Tempo curioso, tempo húmido sob os últimos ventos etésios. Nas ilhas arrumam-se já as mesas e as cadeiras, uma estação que termina… em cumprimento de um verão que chegou ao fim, ou quase.

 

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Nas ilhas arrumam-se já as mesas e as cadeiras . Fim de Agosto de 2015
Uma colectânea de alguns dos textos publicados por Panagiotis Grigoriou
Tradução Júlio Marques Mota
Texto original publicado pelo sítio greek crisis
Panagiotis Grigoriou, Carnet de notes d’un ethnologue en Grèce, une analyse sociale journalière de la crise grecque. Texto disponível no site greekcrisis, cujo endereço é : http://www.greekcrisis.fr/

39. Caderno de notas de um etnólogo na Grécia – Uma Estação a chegar ao fim I

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