Selecção e tradução por Júlio Marques Mota

Q&A: O acordo italiano sobre o mau banco
James Politi em Roma e Jim Brunsden em Bruxelas, Italy’s ‘bad bank’ deal
Finantial Times, 27 de Janeiro de 2016

Roma e Bruxelas têm-se desentendido ao longo de vários meses sobre os planos da Itália para criar um chamado “banco mau ” para livrar os bancos do país dos seus créditos de cobrança duvidosa ou mesmo quase impossível – e talvez rejuvenescer a sua capacidade de conceder empréstimos. Um acordo foi finalmente alcançado na terça-feira depois de uma reunião entre Pier Carlo Padoan, ministro italiano das Finanças, e Margrethe Vestager, o comissário para a concorrência da UE, em Bruxelas. Este acordo irá permitir que o governo italiano possa garantir créditos de cobrança duvidosa na mãos dos bancos para os tornar mais atraentes para os investidores privados que os queiram comprar.
O que é um resgate?
Tecnicamente não é. Idealmente, a Itália teria gostado de avançar com um plano sobre o “bad bank”, mais abrangente em que os fundos públicos seriam utilizados para adquirir créditos de má qualidade que estão na posse de bancos em dificuldades. Mas isso teria saído fora das regras da UE contra os auxílios estatais, de modo que Roma teve que refazer o seu plano e redesenhar um outro esquema. O novo mecanismo de garantia foi aprovado pelo gabinete de Ms Vestager, que considerou que este estava em conformidade com as regras dos auxílios estatais. A Itália também disse que o programa não deve custar nada ao contribuinte e deve mesmo gerar alguma receita líquida. Mas certamente representa a intervenção mais agressiva desencadeada por Roma para ajudar o seu sistema financeiro desde o rebentamento da crise.
O que é que está em jogo?
Os bancos italianos sofreram um venda maciça de títulos nas últimas semanas no meio de uma turbulência no mercado global. Eles têm estado particularmente vulneráveis porque permaneceram prisoneiros de um volume enorme de créditos mal parados de mais € 350 mil milhões – um resultado da longa recessão que atingiu a terceira maior economia da zona do euro. A remoção desses empréstimos de má qualidade dos balanços dos bancos pode reavivar a confiança nas instituições financeiras italianas. Isso, por sua vez, permitir-lhes-ia aumentar os empréstimos, adicionando combustível para o que tem sido uma recuperação económica modesta.
Qual é o objectivo?
O principal objectivo do programa é alimentar um mercado privado em termos de empréstimos bancários que, actualmente, é praticamente inexistente. O governo italiano poderia fornecer uma garantia para os empréstimos de má qualidade, cobrindo assim as perdas de potenciais compradores, que são mais provavelmente os hedge funds e outros gestores de activos alternativos.
Como é que isso é feito?
Os bancos italianos vão reempacotar os seus créditos de má qualidade, separá-los por parcelas (tranches) e comprar uma garantia do governo que pode seduzir potenciais investidores para uma compra destes mesmos créditos maus. O preço da garantia – o que constituiu um grande ponto de atrito nas negociações relativas aos auxílios estatais com Bruxelas – será baseado no preço dos CDS, o seguro de crédito, de empréstimos similares ou na taxa de mercado. O preço da garantia será inicialmente baixo e irá subir ao longo do tempo numa tentativa de atrair à partida os investidores para a referida compra de títulos e de acordo com este esquema.
Qual vai ser a dimensão do programa?
O programa não irá cobrir toda a pilha de empréstimos de má qualidade, loans non-performing, que pesam nos balanços dos bancos italianos. A Itália disse que a garantia só cobrirá as tranches seniores dos pacotes de empréstimos, e só se aplicará a títulos com notação de investimento, ou seja, os títulos de mais risco não serão incluídos, o mesmo é dizer que não serão considerados os empréstimos de classificação inferior.
Quanto vai custar?
O custo do programa dependerá do interesse que suscite junto dos investidores. Mas, mesmo se houver uma grande participação, a Itália não acredita que isso vá pesar significativamente nas finanças públicas, uma vez que as receitas para os cofres das garantias devem ultrapassar quaisquer perdas. No entanto, se as condições económicas italianas piorarem e os incumprimentos aumentarem, essa hipótese poderá ser considerada optimista.
O que é que faz a diferença?
As autoridades italianas estão a reduzir as expectativas, argumentando que o esquema não será a “panaceia” para o sector bancário, especialmente tendo em conta que este não é tão expansivo quanto se desejaria. O mais provável, dizem eles, é que este esquema vá incentivar a consolidação no sector bancário e permitir que os bancos mais fracos se possam fundir nos mais fortes, bem como levar à realização das reformas de governança para algumas das instituições financeiras mais pequenas e mais vulneráveis. Finalmente, crucial para o sucesso do esquema é que a economia italiana continue a crescer, conforme é esperado este ano, e não venha a cair novamente em recessão.
James Politi em Rome e Jim Brunsden em Bruxelas, Financial Times, Italy’s ‘bad bank’ deal. Texto disponível em:
e também:
http://www.ft.com/intl/cms/s/0/2a057c30-c374-11e5-b3b1-7b2481276e45.html#axzz41VOMrWSc