HOJE, A ITÁLIA. AMANHÃ SE VERÁ QUEM SE SEGUE – 14. OS BANCOS QUE METEM MEDO, OS BANCOS DO TERROR – 3ª PARTE – por VINCENZO COMITO

Falareconomia1

Selecção e tradução por Júlio Marques Mota

sem nome

Os bancos que metem medo, os bancos do  terror, 3ª Parte

Vincenzo Comito, Banche da paura,

Sbilanciamoci.info, 8 de Fevereiro de 2016 

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(conclusão)

Os bancos italianos estão entre os piores no que diz respeito ao nível que rentabilidade, apresentam o triplo de créditos altamente degradados relativamente à média dos países da União Europeia e mesmo a capitalização média permanece entre as mais baixas.

comito - III

O início da união bancária foi na altura estimulado pela consciência da fraqueza dos bancos europeus e pela vontade de quebrar a relação entre dívida pública e dificuldades na banca.

 A operação devia consistir em três capítulos: um sistema de supervisão dos bancos confiado ao BCE; um procedimento comum de gestão e resolução das crises; um sistema, por último, ainda comum de seguros dos depósitos. Mas devido sobretudo à oposição alemã o projeto foi redimensionado.

A supervisão do BCE referir-se-á diretamente apenas às grandes instituições bancárias, a partir do momento em que Berlim quer continuar a gerir em privado as questões dos seus bancos regionais e locais; no entanto em diversos casos são os bancos pequenos que estão na origem das crises. A garantia comum para os depositantes está eliminada porque a Alemanha não quer contribuir para garantir os depósitos dos outros países. Por último, o sistema de resolução das crises foi iniciado com horizontes apenas de longo prazo e o fundo que lhe está relacionado foi dotado de recursos largamente insuficientes, deixando a gestão de uma grande parte dos problemas aos países individualmente.

Em todo o caso, desde o primeiro dia de Janeiro de 2016 os custos das crises serão suportados em primeiro lugar pelos accionistas, obrigacionistas, pelos depositantes, (bail in-ou resgate interno) e por esta ordem. Neste quadro, incidentalmente, parece singular que o nosso país, que no seu tempo aprovou plenamente o mecanismo, diga agora alto e bom som que o quer  voltar a rediscutir.

Deve ser sublinhado como é que a união bancária, para além de ser incompleta, tal como está concebida, corre o risco de conduzir a uma escalada do processo de centralização dos capitais bancários na Europa, em prol dos países do Norte, tendo à cabeça a Alemanha (Fazi, 2016).

Os problemas do sistema bancário italiano

Numa análise recente da autoridade de controlo europeia (Eba), são tomados em consideração os dados relativos à 109 bancos do continente. Resulta que as instituições bancárias do nosso país não brilham pelas suas prestações sobre nenhuma frente. As instituições italianas são as piores, com exclusão de Chipre, no que diz respeito ao nível de rentabilidade; apresentam seguidamente o triplo de créditos altamente degraddos relativamente à média dos países da EU e mesmo a capitalização média situa-se entre as mais baixas. A posse de títulos públicos nacionais na carteira de títulos dos bancos italianos aparece bastante mais acima da média.

A existência de créditos de cobrança duvidosa ou difícil, em inglês non performing loans, do sistema de crédito italiano estava estimado pelo fundo monetário, ainda a meio dos anos de 2014, como igual a  330 mil milhões de euros (200 mil milhões de insolvências e outros 130 restantes são de créditos degradados), correspondentes no conjunto a 16,7% do activo bancário total do país, contra uma média de  5,6% na UE. Hoje fala-se de 350 mil milhões. Tem-se seguidamente uma informação resultante de um inquérito do BCE sobre os créditos degradados de seis bancos italianos, e em paralelo  os títulos bancários perdiam terreno em Bolsa. As dúvidas parecem muitas.

Trata-se de uma enorme carga que bloqueia a retoma da economia.

Como uma consolação muito parcial podemos, por outro lado, dizer que os bancos italianos estão muito menos expostos que os bancos dos outros estados europeus quanto a créditos concedidos aos operadores dos países emergentes e sobre os produtos derivados, duas áreas neste momento de alto risco.

O projeto de BAD bank

Pensava-se resolver de toda a maneira o problema dos créditos degradados com a criação de um ou mais BAD bank, partindo da constatação de uma diferença considerável entre as avaliações de mercado, que estimam os créditos de cobrança duvidosa entre os 20% e os 30% do seu valor nominal e os valores claculados pela banca , que hoje conseguem apenas  cobrir com os fundos desvalorizados apenas um pouco mais de metade do total dos créditos em dificuldade.

 Mas as relações impostas pelas autoridades de Bruxelas têm, por fim, obrigado o governo a aceitar um resultado final muito pouco convincente e , por fim, certamente não resolutivo da questão. Assim o sistema bancário encontra-se ainda a debater-se com  incertezas de considerável peso.

O caso Unicredit

Que as coisas não vão bem no nosso sector bancário pode ser demonstrado com o caso de Unicredit (Sanderson, 2016), para o qual muita gente olha com apreensão.

O banco era em 2004 um dos mais rentáveis na Europa. Num período onde a economia parecia ir muito bem, o administrador delegado, Alessandro Profumo, inicia um plano ambicioso de desenvolvimento, criando em pouco tempo uma empresa centrada sobre o Centro e o Leste da Europa (Alemanha, Áustria, Polónia, mesmo a Ucrania), com uma ponta no Cazaquistão. Virá seguidamente a compra de Capitalia, para ter o controlo quanto à concorrência movida por Intesa-San Paolo. Mas, com o rebentar da crise, as contas deixaram de estar equilibradas. No ano de 2010,  Profumo será substituído por Ghizzoni. Entre o ano de 2009 e o de 2012 são necessários três aumentos de capital para um total de 15 mil milhões de euros, embora as participações sejam desvalorizadas para 14 mil milhões. Entretanto procura-se vender as sucursais na Ucrania e no Cazaquistão, com consideráveis perdas, embora aqui se libertam também as actividades de gestão de patrimónios. Na Itália o banco encontra-se com 84 mil milhões de produtos brutos de qualidade duvidosa, quase 20% do total dos créditos. O último plano, lançado em Novembro de 2015, para além da eliminação de muitas participações, prevê uma redução de pessoal na ordem dos 18.000 postos de trabalho.

Mas o plano não convenceu o mercado, em particular, muitos analistas e muitos acionistas, uma vez que não está claro como é que vão desembaraçar-se dos créditos fortemente degradados enquanto a rentabilidade continua a ser baixa. Assim, o valor das acções na bolsa de valores dois meses após o lançamento do plano diminuiu em cerca de 35% e perdeu mais de 90% de seu valor desde 2007. Aguardamos novos desenvolvimentos, a possível substituição de Ghizzoni assim como mais um aumento de capital.

Basta com a banca?

À parte os valentes defensores da ideia de  que se deve deixar o mercado funcionar, de que se deve deixar que seja o mercado a decidir, entre a maioria dos peritos do sector está já amadurecida e desde há muito tempo a convicção da necessidade de uma reforma profunda do sistema financeiro. Neste âmbito,  salientem-se duas principais escolas, duas linhas de reformas.

A primeira pretende em princípio uma acção que restitua ao sector bancário o seu papel de antes da grande deriva dos anos noventa, por conseguinte através das prescrições sobre as quais se tem discutido desde há já bastante tempo (mais capital próprio, separação dos bancos comerciais dos bancos de investimento ou de trading, redimensionamento das instituições financeiras to too big to fail, etc.). Assim o candidato democrático às presidenciais, Bernie Sanders, pede o restabelecimento do Glass Steagall Act e o desmembramento dos bancos sistémicos, bem como dos hedge fund e de algumas seguradoras.

⌈La seconda scuola mira invece a una messa in discussione radicale delle banche come le conosciamo ancora oggi. Indichiamo tre varianti dei possibili mutamenti.⌋

A segunda escola procura a mudança, mas sem um questionamento radical em massa dos bancos como os conhecemos hoje. Indicamos três variantes das possíveis mudanças:

O sistema bancário mais restrito, narrow bank

Uma velha proposta que tem sido avançada desde há muito tempo e que agora volta a estar na actualidade é a referência à criação de organismos que são definidos como narrow bank ou safe bank (bancos limitados a dadas operações). Manteriam os depósitos dos clientes e geririam o sistema dos pagamentos, mas empregariam tais depósitos somente em actividades líquidas ou em obrigações públicas muito seguras. Não poderiam desenvolver actividades em derivados, nem ter actividades fora dos seus balanços e deveriam pôr limites nas remunerações dos seus dirigentes. É eliminado a ligação entre depósitos e intermediação financeira, actividade confiada aos outros organismos financeiros.

O referendo suíço

Uma segunda hipótese pretende um referendo que se terá muito em breve na Suíça (Ponsot, 2016) e que pretende eliminar a criação monetária por parte dos bancos. Prever-se-ia que os mesmos institutos cubram integralmente os depósitos, que seriam hoje propriedade dos clientes (eles têm a natureza de simples créditos sobre os bancos), ao mesmo tempo que se pretende que estes bancos actuem  como executores de ordens de pagamento dos clientes; inversamente, os depósitos deixariam de estar no seu balanço. O poder de criação de moeda viria reservado ao banco central, segundo as linhas já determinadas nos anos trinta, depois do rebentamento da grande crise, segundo linhas expressas pela escola de Chicago e por Irwin Fisher.

Assim restabelecer-se-ia o controlo público sobre a moeda; o banco central agiria no quadro de objectivos de médio prazo definidos constitucionalmente; o sistema monetário seria assim posto ao serviço da economia real e da sociedade, se bem que hoje cerca de 90% da criação de moeda está mãos de privados. Os bancos poderiam continuar a conceder crédito, mas utilizando apenas os recursos do banco central, das outras instituições bancárias ou financeiras, dos seguros, ou de meios próprios ou autorizados pelos depositantes.

Um mundo sem banca

McMillan (McMillan, 2014) projecta um sistema financeiro sem bancos, ou sem a criação de moeda através do crédito e utilizando a inovação tecnológica como meio para apoiar a mudança. Para os depositantes, nada mudaria e o sistema dos pagamentos e de manusear o dinheiro permaneceria como hoje. As instituições agiriam como simples custódia para os seus clientes. Distribuir-se-iam os depósitos confiados à sua guarda a plataformas electrónicas de empréstimo peer-to-peer; quando um depositante utilizasse a sua carta de débito para compras o mecanismo forneceria a liquidez vendendo sobre o mercado instantaneamente um qualquer activo financeiro detido pelo mesmo cliente; se colocasse moeda em conta, o algoritmo numérico encontraria rapidamente adequadas oportunidades de investimento. E assim chegaríamos, por outras vias, a Gurley e de Shaw.

Conclusões

Não queremos entrar a fundo nestas propostas. De qualquer modo cada uma de per si ou todas elas tomadas em conjunto poderiam constituir a base para uma reforma detalhada do sistema bancário. O importante é ter êxito em mobilizar as forças de mudança, como parece que se vai conseguir na Suiça

Textos citados neste artigo

-Fazi T., Tutti i pericoli dell’unione bancaria, www.sbilanciamoci.info, 9 gennaio 2016

-McMillan J., The end of banking : money , credit and the digital revolution, Londra, 2014

-Ponsot J-F., Réguler la finance sans abolir les banques, Le Monde, 16 gennaio 2016

-Sanderson R., Unicredit : Too big to thrive ?, www.ft.com, 10 gennaio 2016

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Ver o original em:

Banche da paura/3

 

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