Os altos e baixos do Brasil – The Economist

Falareconomia1

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

Os altos e baixos do Brasil
(Brazilian waxing and waning)

Texto disponível em:
http://www.economist.com/blogs/graphicdetail/2016/03/economic-backgrounder

The Economist
Mar 31st 2016, 11:04 BY THE DATA TEAM

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Nos últimos anos a economia do Brasil tem decepcionado e não é pouco. Cresceu, em média, 2,2% ao ano durante o primeiro mandato da Presidente Dilma Rousseff, de 2011 a 2014, um ritmo de crescimento mais lento do que na maioria dos países seus vizinhos, para não falar de outros como a China e a Índia. No ultimo ano, o PIB contraiu 3,8% e prevê-se que venha ainda a encolher num montante semelhante em 2015. O consumo privado registou a primeira queda anual desde que o partido de esquerda de Rousseff, o Partido dos Trabalhadores (PT), alcançou o poder em 2003. Ao mesmo tempo, a despesa pública disparou em 2014, quando Dilma procurava ser reeleita, o défice orçamental duplicou para 6,75% do PIB e, desde então, aumentou mais quatro pontos percentuais. Este ano, é provável que seja o terceiro ano consecutivo nesta senda, quando o governo não conseguir pôr de lado nenhum dinheiro para pagar aos credores: a meta para o excedente primário, qui exclui os juros da dívida pública, foi reduzida de um valor pouco ambicioso de 0,5% para praticamente nada e o governo está a tentar ganhar espaço para apresentar um novo défice primário. A dívida pública bruta do Brasil, de 70% do PIB, pode parecer insignificante em comparação com os 197% da Grécia ou os 246% do Japão. Mas as altas taxas de juros, cerca de 14%, tornam os empréstimos mais pesados em termos do serviço da dívida. Os pagamentos da dívida pública consomem actualmente mais de 8% do PIB. Para permitir que as empresas e os consumidores possam recorrer ao crédito a taxas menos exorbitantes, os bancos públicos têm vindo cada vez mais a preencher a lacuna, concedendo empréstimos baratos, subsidiados. Estes empréstimos passaram de 40% de todos os empréstimos concedidos em 2010, para cerca de 55%.

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Uma vez que o governo relaxou a política orçamental, o banco central reduziu prematuramente a sua taxa de juro de referência em 2011-12. Isto fez subir a inflação, que está agora bem acima do limite superior auto – imposto pelo banco de 6,5% e acima do objectivo fixado de 4,5%. O corte da taxa de juro foi pois revertido. A partir de Julho passado, os responsáveis pela politica monetária do banco fixaram a taxa em 14,25%, quase dois pontos percentuais acima do que era antes da decisão do corte. Com a inflação nos dois dígitos, não podem arriscar afrouxar a política monetária no futuro próximo. Além da falta de rigor no plano macroeconómico, houve também muita intromissão a nível microeconómico: o governo conduziu uma política industrial desajeitada e defraudou o sector privado, como por exemplo ao insistir em taxas de rentabilidade absurdamente baixas em concessões públicas para a realização de projectos de infra-estruturas. Não é assim de estranhar que a confiança dos homens de negócios tenha caído fortemente.

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A burocracia, a falta de infra-estruturas e uma moeda sobrevalorizada tornaram grande parte da indústria sem competitividade. Assim, os consumidores têm sido a principal fonte da procura. A baixa taxa de desemprego fez subir os salários. Nos últimos dez anos, os salários no sector privado cresceram mais depressa do que o PIB (os trabalhadores do sector publico terão conseguido ainda mais). Isso permitiu aos consumidores contraírem mais empréstimos, o que incentivou ainda mais a despesa. Agora, o círculo virtuoso está a tornar-se vicioso. Os salários reais têm vindo a diminuir desde Março de 2015 (em comparação com o ano anterior), principalmente porque a produtividade dos trabalhadores brasileiros nunca justificou as subidas anteriores. As pessoas estão a voltar a procurar trabalho e há menos postos de trabalho a que recorrer: o desemprego nas principais regiões metropolitanas, que tem vindo a cair desde há muito tempo e que se situou abaixo de 5% durante quase todo o ano de 2014, aumentou para 8,2% em Fevereiro. Um cálculo mais geral situa-o em 9,5%. Os economistas estimam que ultrapasse os 10% este ano.

Para melhorar as contas públicas o governo cortou na despesa da Segurança Social com o desemprego (que tinha aumentado, mesmo quando a taxa de desemprego estava a cair) e noutros benefícios sociais. Os impostos, nomeadamente o imposto sobre os combustíveis, foram aumentados. O que também aconteceu com as facturas da água e da electricidade (dois terços da qual é produzida em centrais hidroeléctricas). O objectivo era reduzir a procura, depois de uma seca recorde em 2014, e corrigir a política de manutenção de preços baixos regulados para manter a inflação sob controlo (e os eleitores felizes). Mas estes aumentos inflamaram a inflação

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Tudo isso está a degradar o rendimento disponível, uma grande parte do qual é gasto no reembolso dos créditos ao consumo obtidos nos bons tempos. A confiança dos consumidores caiu para o nível mais baixo desde que a Fundação Getulio Vargas, uma escola de gestão, começou a calculá-lo em 2005. O governo não tem dinheiro para impulsionar o investimento. A Petrobras, a gigante do petróleo controlada pelo Estado brasileiro e que é o maior investidor do Brasil, está no meio de um escândalo de corrupção que paralisou a despesa: o investimento sacrificado pode ter feito reduzir o crescimento do PIB em um ponto percentual no ano passado. É difícil ver de onde é que virá o crescimento .

Pior de tudo, as alavancas das políticas da Presidente Rousseff estão esgotadas. A incapacidade em conter a despesa já levou todos as três grandes agências de rating a retirar o Brasil do seu apreciado rating de crédito. Agora, os economistas temem que a política monetária pode tornar-se impotente: com a factura dos juros a disparar, o Banco Central poderá ser forçado a ajustar as taxas para tornar gerível a situação, em vez de de manter os preços sob controlo. O aguerrido ex-ministro das Finanças, Joaquim Levy, cortou cerca de 70 mil milhões de reais no âmbito dos cortes discricionários previstos para 2015 (no topo das modestas reformas sociais). Mas isso foi um corte apenas marginal: cerca de 90% dos gastos do governo está autonomizado e precisa de aprovação do Congresso (ou, por vezes, uma alteração constitucional) para os alterar. Mas o Congresso está a braços com uma moção de destituição (impeachement) da Presidente Rousseff (de entre tudo, por causa da duvidosa contabilidade do governo para esconder a verdadeira dimensão do défice orçamental), o que pode ainda vê-la afastada do cargo antes do final do ano.

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Nem o Banco Central pode aliviar a política monetária: isso iria, uma vez mais, minar a sua credibilidade e correria o risco de fazer disparar as expectativas de inflação. Como se isso não bastasse, a depreciação do real está a contribuir para aumentar a pressão sobre os preços, embora a perspectiva de queda da Presidente Rousseff tenha animado os mercados: o real e a Bolsa de São Paulo recuperaram quando a probabilidade de destituição aumentou. Mas não sem antes tornar mais caros os cerca de 230 mil milhões da dívida do Brasil expressa em dólares. A Presidente Rousseff não consegue fazer ressuscitar uma dinâmica de crescimento do Brasil, através de mais despesa e taxas de juro mais baixas. Ela estava à espera que um regresso à ortodoxia económica faria dar a volta. Infelizmente, não dispõe do capital político – e, possivelmente, da convicção – para o aplicar com grande força, face à oposição à austeridade, que não é menor do seu próprio partido de esquerda, o PT, de cujo apoio ela precisa desesperadamente para evitar a destituição. Em resultado, a economia do Brasil vai levar algum tempo a sarar.

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