CARTA DO RIO – 101 por Rachel Gutiérrez

 

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Precisamos louvar o brilho, a competência, a determinação e a coragem de uma professora universitária de 41 anos, doutora em direito penal econômico pela Universidade de São Paulo, que tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal defendeu, com arrebatamento, o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

A advogada e jurista Janaína Paschoal, em 1º de setembro de 2015,  acompanhada por dois famosos jurisconsultos: Hélio Bicudo, veterano defensor dos direitos humanos e fundador do Partido dos Trabalhadores, e Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardozo, protocolou na Câmara o pedido que, uma vez aprovado em 17 de abril de 2016, por 367 dos deputados, passou a ser discutido pelos senadores, na estrita obediência ao rito constitucional.

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Na reunião do Senado iniciada às 10 da manhã da última quinta-feira, 28/04, em que Reale e Paschoal deveriam apresentar seus argumentos em favor do impeachment, os senadores petistas fizeram de tudo para impedir a continuidade dos trabalhos, o que obrigou o primeiro a se pronunciar já no fim da tarde, precisando atrasar, em muito, sua viagem de retorno a São Paulo; Janaína, então, apesar de visivelmente adoentada e cansada, desempenhou com extraordinária determinação e surpreendente resistência a discussão que só se encerrou na madrugada de sexta, à 1,30h.

É verdade que ela é exaltada, apaixonada, implacável na lógica de seu discurso, mas também sabe ser tolerante, respeitosa e democrática quando procura compreender opiniões contrárias às suas e soube mostrar-se menos agressiva do que os que a contestaram. A moça, cujo temperamento forte nos leva a pensar num misto de Joana D’Arc com o Davi bíblico, vem sendo atacada de forma virulenta tanto nas redes sociais quanto na imprensa. Sua veemência e sua impetuosidade talvez não pareçam muito “femininas”, mas o que mais deve assustar é seu destemor e sua segurança no debate.

Nada disso importará, no fim de contas, se o objetivo de aprovar o impeachment for atingido. Como nesta altura já não importa se o documento entregue pela Câmara ao Senado traz a assinatura do arquicorrupto deputado Eduardo Cunha, réu da Lava Jato, porque o documento obteve o Sim de 367 dos 503 deputados.

A luta dos que defendem o impeachment vai continuar, assim como as tentativas desesperadas dos governistas que o qualificam de golpe na falta de melhores argumentos.

E a situação em que se encontra o nosso país não tem merecido a atenção dos supostos defensores da inclusão social e do combate à pobreza. Em seu artigo Por um debate fecundo, do Globo deste sábado, a escritora Ana Maria Machado diz:

Faltam metáforas. É mais que um atoleiro. Não se trata apenas de constatar que o país está paralisado ou congelado rolando morro abaixo. A situação de emergência obriga a estabelecer prioridades. Não se pode ficar esperando (…) que o país quebre de uma vez, enquanto não se faz nada e os aposentados continuam sem receber, os hospitais sem atender, os alunos sem aulas, a segurança pública se deteriorando mais do que nunca, as obras interrompidas e um cortejo de horrores se sucedendo. Já que a realidade não tem nada a ver com o mundo de mentirinha que a propaganda governamental insistia em mostrar, era óbvio que a conta dos desmandos ia chegar. Chegou.

E em sua lúcida análise do que chama de Esquerda nostálgica,  o senador Cristovam Buarque conclui:

Para sair da perplexidade, uma nova esquerda precisa fugir da nostalgia por siglas partidárias que tiveram a oportunidade de assumir o poder e construir seus projetos, mas traíram a população, os eleitores e a história, tanto na falta de ética, quanto na ausência das transformações sociais prometidas.

Só podemos desejar é que o Vice-Presidente, no eventual sucesso do impeachment, ao ter de assumir a presidência, que nunca deixe de se inspirar no exemplo de Itamar Franco que, em situação semelhante embora não tão grave, soube reerguer o Brasil e mantê-lo em ordem até as  eleições seguintes previstas pela Constituição.

Em entrevista a Jorge Bastos Moreno, Michel Temer disse: “Eu não posso errar”. E o jornalista comenta:

Temer quer dizer que não terá condescendência com eventuais desvios de conduta dos integrantes do governo, sejam amigos ou fiéis aliados. Aí vai adotar Ulysses Guimarães com seu “o bom político é geralmente mau amigo e mau parente”. Já deu exemplo: Mariz, homem de sua estreita amizade, pisou na bola e não será mais ministro. Vale para todos.

Trata-se de Antonio Claudio Mariz de Oliveira, amigo de longa data de  Michel Temer, previamente cotado para o Ministério da Justiça, que foi descartado por ter criticado em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, métodos da operação Lava Jato, principalmente no que diz respeito às delações premiadas. Continua Moreno:

O vice é um homem preocupado, como professor, com o Direito, como político, com a História. (… ) seu compromisso é passar como um presidente de transição, que tirou o país do buraco e resgatou a credibilidade das instituições políticas.

Oxalá!

 

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