Eu sou, confesso como é sabido e bem destaca o professor Beramendi um torcedor pela Irmandade da Crunha e portanto dos anti-risquianos ideológicos mais perigosos e viscerais que já tenham escrito sobre galeguismo nos últimos 20 anos.
Porém, e como não podia ser menos em sendo galego, na minha biblioteca e entre os livros de culto e fetiche, anda algum dos textos da posguerra de Vicente Risco que fui topando, e ainda pior, lendo com deleite.
Esses, quanto os textos da pre-guerra que li (mas os meu aforros me não permitiram ainda senão em fotocópia) formam parte desse património que vou deixando para vender em garante do meu aposentamento. E aí se andam, sem qualquer pudor, diria, remexendo e baralhando com outros escritores que têm como comum (ainda na discrepância ideológica) reconhecerem a importância e valor do estilo quando combina com a erudição.
E Risco, para além de fenómeno de erudição e alimento de freaks, é um sedutor, prosista exemplar com um raciocínio feijoniano não isento de humor. Os seus relatos e artigos são uma magistral maravilha; e a sua correspondência especialmente a dos anos 19-25 sobre temas político organizativos (por meio da que vai tecendo uma aranheira centralizada nele pela que passa toda a informação e com a que se pretende elevar em árbitro da estética e Conselheiro Supremo de uma organização e rotura que emerge ao alento das suas seduções nas palavras doutros) é apenas comparável às memórias de Casanova.
Efetivamente, que Vicente Risco, como dizem, foi o teórico mais importante do nacionalismo de preguerra e todos aqueles que a tradição galeguista considera, empezando por Castelao e as principais figuras teóricas do galeguismo, bebem dele.
Isso é indubitável, e a cousa não é rebaixar a importância de Risco nestas figuras e em geral nos artistas e intelectuais que o seguiram na ING, porque aí está a ING como projeto para o confirmar.
Agora, a questão não está em teimar em quanto ou quanto não, ou fingir que se lamenta, mas deve se estudar o quanto o nacionalismo de preguerra deve a Risco, ou apenas só considerar o seu magistério de “quando Risco, era Risco” e dividir a sua obra em três cómodas partes das que salvar a primeira e parte da terceira. Risco, eu diria, seguindo a Antón Capelán, sempre foi Risco.
A cousa está em considerar se realmente no conjunto orgánico do movimento e no seu desenvolvimento político, os artistas e intelectuais que seguem a Risco, (que fazem, indubitavelmente desde a morte de Porteiro até algum dos chanços que marcam ó percurso e quedas risquiano) em realidade ocupam essa centralidade no movimento nacionalista.
Consideremos antes de concluir qualquer cousa, se que a chave da questão não estará porém nem em Risco nem em Castelao, nem no Nacionalismo de Pre-guerra; se a chave do desentendimento (ou a chave das chaves) não estará mais na transmissão que o galeguismo de pós-guerra fez do nacionalismo de Pré-guerra com a justificação da proposta culturalista e escolhas de Galáxia definida pelos herdeiros da Direita Galeguista que magnificou (ao tempo que se ocultavam as linhas centrais do discurso político) o papel e influência de Vicente Risco e dos intelectuais e artistas debruçados no cultural-artístico na Geração Nós e na interpretação negligenciada das Irmandades (em especial da da Crunha tão política e republicana).
É dizer que, obviamente o culturalismo pinheirista devia procurar no passado fontes justificativas da centralidade da sua trajetória e projeto e obviamente seria indigno de Castelao não reconhecer no Sempre em Galiza o magistério. Mas o galeguismo não era apenas Castelao e o Sempre (para além que a Risco) cheira aquele divino contista celta do Chateaubriand.
O truque para integrar Risco, com normalidade no imaginário galeguista e na cultura galega passa pela lição de Castelao. Lição que penso tinham claro desde início Viqueira, Penha Novo, Ánxel Casal, Amado Carvalho, Picalho, González López. Lição que terminaram por entender cada um no seu momento os Vilar Ponte, Manoel António, Blanco Amor, Diaz Valinho, ou Alberte Vilanova
Castelao, o mesmo que Risco, são grandes figuras intelectuais, humanas e sociais, mas não motores, pois ambos reagem a um chamado ambiente e, já maduros e com trajetória, optam com colaborar com um movimento associativo de base.
E por isso mesmo: e se tanto Castelão, como Risco, como maior parte dos intelectuais e artistas da época de prata da nossa cultura, não são guieiros, nem motores? senão intelectuais e artistas, criadores e inventores do suporte artístico, filosófico e intelectual do movimento nacionalista. Não convinha saber então quem são os motores?
Para sabe-lo há talvez primeiro que desfechar o debate e destacar que ainda há muito que rascar por sobre tudo o dito, pois dá-se o caso que nos últimos 50 anos a analítica da política galeguista e da sua história são intelectuais, historiadores-professores e artistas os que à tem posto baixo os seus olhos de intelectuais e sob a sua lupa de historiadores.
Porém normalmente os intelectuais, os artistas e os historiadores, que entendem e valorizam muito a sério e bem o papel dos intelectuais, os artistas e os professores, especialmente quando em aras do seu mesmo tempo se lhes evidencia a preminência do cultural, adoitam não sabe ler bem as contabilidades e trabalhos da militância, as notas dos ativistas e os desenhos de conjunto dos políticos.
Por isso a questão não é como integrar um super-Risco na definição do Nacionalismo democrático e entender como foi possível a centralidade de tamanho reacionário (ainda a simpatia) na história do galeguismo da Preguerra. A questão é devolver a Risco e os artistas e eruditos de Nós ao lugar que lhes corresponde, como apoios e complementos intelectuais de um movimento social e político que também propugna e pretende construir a soberania estética, histórica, cultural e literária.
E a questão a estudar é, para mim, logo e aí sim há que estudar e questionar a transmissão e ainda, e a análise atual, como o Nacionalismo democrático e a linha democrática “dos militantes de a 1 peseta”e de ação política dominante foi quem – uma e outra vez – de reconhecer o valor intelectual, abrir as portas e integrar a fenomenal erudição, capacidade teórica de síntese e engenhoso estilo de figuras como Vicente Risco (e muitos outros de Losada a Valle-Inclán, passando por Fernández Flórez, Torrente ou mesmo a Pardo Bazán) no seu projeto de construção nacional.