A CRISE AUSTERITÁRIA E A QUADRATURA DO CÍRCULO – REFLEXÕES SOBRE A CRISE DA ECONOMIA, DO PENSAMENTO ECONÓMICO E DA DEMOCRACIA – TEXTOS DE REFERÊNCIA PARA ENTENDER A REALIDADE PRESENTE – A) SATYAJIT DAS – A CORRIDA AO COLAPSO: PARTE 2. A LOUCURA MONETÁRIA

Obrigado ao blog do tirloni.
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Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

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A Corrida ao Colapso: Parte 2. A loucura monetária

Satyajit Das

Satyajit Das, Monetary Madness

Economonitor, 24 de Março de 2016

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photo: againstcronycapitalism 

Os bancos centrais reduziram as taxas de juro oficiais para níveis historicamente baixos, diríamos perto de zero (conhecidos pela sigla em inglês ZIRP ou Zero Interest Rate Policy). As taxas a longo prazo das obrigações estão igualmente a níveis historicamente baixos. Em algumas partes do mundo, as taxas de juro são agora negativas; isto é, paga-se menos do que o que se levanta de empréstimo e paga-se para se depositar o dinheiro à guarda do banco.

Com as taxas de juro limitadas a zero, os banqueiros centrais viraram-se para a facilitação quantitativa (“QE”), os bancos centrais compram títulos, especialmente da dívida publica para injetar liquidez no sistema financeiro. Os balanços de bancos centrais expandiram-se de uma situação em volta de $5-6 milhões de milhões em 2007/2008 para cerca de $18 milhões de milhões atualmente. Em muitos países desenvolvidos, os ativos de banco central constituem agora entre 20% e 30% dos respetivos produtos internos brutos (“PIB”). No Japão e de acordo com o seu Banco Central relativamente à última ronda da QE o saldo do Banco está neste momento colocado em 70 % do seu PIB e as novas compras de títulos da divida pública do Japão estão a decorrer e num valor próximo de 15% do PIB. .

As políticas assumem como alvo uma mais elevada taxa de crescimento e mais elevada taxa de inflação. A premissa é de que mais baixas taxas de juro prontamente farão crescer os empréstimos e a despesa dinamizando por aí a atividade económica e o emprego. Os empréstimos concedidos pelos bancos aumentarão dadas as mais baixas taxas hipotecárias que incentivam o refinanciamento e que impulsionam o setor de imobiliário para habitação.

Menores taxas e o aumento da oferta de moeda estabilizaram os mercados financeiros, mas não se forneceu um impulso significativo para a atividade económica. Os agregados familiares em dificuldade pelos existentes elevados níveis de dívida, os preços das casas a descerem ou já mesmo baixas, reduzindo as perspetivas de emprego e aumentando a incerteza quanto a quem tem emprego, os níveis de estagnação dos rendimentos estão a reduzir não a aumentar os níveis de créditos concedidos

As taxas oficiais mais baixas tiveram menos efeito do que o previsto sobre os custos de empréstimos de alguns devedores, tais como empresas de pequeno e médio porte (“PME”) dependentes de bancos para o financiamento. Os bancos em muitos países aumentaram as margens de crédito, compensando a queda nas taxas de juro gerais.

A ausência de procura e a capacidade produtiva em excesso significa que as baixas taxas de juros não tem incentivado a que se façam novos investimentos. As grandes empresas têm beneficiado destas baixas taxas, aumentando a sua dívida de longo prazo para refinanciarem empréstimos existentes, para recomprar ações ou para amortizarem capital junto dos acionistas. As recompras por empresas E.U. e do Reino Unido atingem 2-3% do PIB por ano. As baixas taxas também têm estimulado a atividade de fusões e aquisições. As empresas também possuem grandes quantidades de liquidez excedentária, refletindo a falta de oportunidades de investimento e preocupações sobre as condições do mercado financeiro para o futuro. Nos Estados Unidos, Europa e Reino Unido, o investimento diminuiu significativamente e está abaixo dos níveis pré-2007.

Num artigo publicado em Novembro de 2012, Monetary Policy Will Never Be the Same, o economista-chede do FMI Olivier Blanchard reconheceu o problema: “Sobre a armadilha de liquidez: descobrimos, infelizmente, a grande custo, que o limite inferior de zero para a taxa de juro pode de fato ser restritiva e permanecer assim por um longo período de tempo — cinco anos neste momento… e continua a ser um facto que em relação à política convencional os efeitos da política monetária não convencional são muito limitados e incertos. “

Os reais efeitos das políticas monetárias inovadoras são diferentes. Os bancos centrais tornaram-se cruciais no financiamento dos governos. Nos últimos 5 anos, a Reserva Federal dos Estados Unidos adquiriu mais 50% dos títulos emitidos pelo governo dos EUA. No Japão, sob o novo governador Haruhiko Kuroda, o Banco do Japão “(BoJ) planeia comprar 70% da emissão de dívida do governo, duplicando a base monetária de 29% para  56% do PIB até 2014.

O Banco Central Europeu (“BCE”) está teoricamente proibido de financiar diretamente os governos. Em vez disso, o BCE tem canalizado abundante liquidez para os bancos europeus diretamente ou através de bancos centrais dos países membros para comprar títulos do governo, que são dados como garantia junto do BCE para os empréstimos.

Anunciando ao QE3, o presidente da Reserva Federal dos EUA, Ben Bernanke admitiu que a política, monetária,  por si só não poderia aumentar significativamente a atividade económica diretamente. Em vez disso, o plano foi dirigido a aumentar o preço das casas e de ativos através das compras de títulos garantidos por hipotecas. Baixas taxas juros significam custos de oportunidade mínimos na detenção de ativos, conduzindo a um ponto de mudança para investimentos de maiores riscos, aumentando os preços dos ativos. A estratégia baseia-se no efeito riqueza que os banqueiros centrais esperam que se venha a traduzir num maior consumo e por aí impulsionar a atividade económica.

Os dados empíricos sugerem uma ligação fraca entre aumento dos preços das ações e o aumento do nível de consumo. A ligação ligeiramente mais forte entre os preços das casas e o consumo também pode ser comprometida, refletindo os efeitos de um período historicamente único quando os detentores das casas contraem empréstimos contra o valor do investimento depois de décadas de consumo financiado por empréstimos.

As baixas taxas fornecem implicitamente subsídios ao sistema financeiro. Baixas taxas reduzem o custo de depósitos, que podem então ser reinvestidos em títulos do governo de baixo risco e com lucro. As instituições financeiras também beneficiam do aumento dos preços dos ativos financeiros impulsionados por taxas baixas, que reduzem as perdas sobre os investimentos que desceram drasticamente em valor durante a crise. Embora os lucros das instituições tenham vindo a ser beneficiados, estas não têm aumentado significativamente a oferta de crédito, significando que o efeito sobre a economia real é limitado.

Juros baixos e as condições da QE também são concebidas como um mecanismo  de depreciação das respetivas moedas. Por exemplo, um dólar mais fraco ajudará a melhorar a competitividade de exportação da América, permitindo que as empresas dos EUA ganhem competitividade num mundo de menor nível de procura. Mas uma tal política corre o risco de retaliação, a chamada “guerra das divisas”. Em última análise, não podem ser todos os países a ter a moeda mais barata, eliminando o efeito de tais políticas.

Com a política fiscal restringida, os decisores das políticas confiam cada vez mais na política monetária. Mas a sua eficácia é, no mínimo, duvidosa…

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Ver o original em:

http://www.economonitor.com/blog/2016/03/part-2-monetary-madness/

 

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