Trickle-down, trickle-up, eis a questão. E qual tem sido a opção? – Parte I – 4. Pronto ou não para uma nova recessão? Por Barry Eichengreen

Uma nova série sobre as novas tempestades que se vislumbram já no horizonte

Imagem 2 Trickle-Down CADILLAC

Seleção e tradução de Júlio Marques Mota

Parte I – 4. Pronto ou não para uma nova recessão?

Por Barry Eichengreen  barry eichengreen

Publicado por Project Syndicate em 10 de janeiro de 2018

Trickle down Texto 4 1

Os responsáveis políticos normalmente respondem às recessões cortando taxas de juro, reduzindo impostos e impulsionando transferências para os desempregados e outras vítimas da recessão. Mas, devido a uma combinação de razões políticas e económicas, os EUA, em particular, estão singularmente mal preparados para responderem normalmente.

COPENHAGUE – Copenhaga-um dia ensolarado é o melhor momento para verificar se o telhado é estanque. Para os decisores políticos económicos, chegou o dia ensolarado: com os especialistas a preverem um forte crescimento, agora é o melhor momento para verificar se estamos ou não preparados para a próxima recessão.

A resposta, para os Estados Unidos em particular, é um não retumbante. Os responsáveis políticos normalmente respondem às recessões cortando nas taxas de juros, reduzindo impostos e impulsionando transferências para os desempregados e para outras vítimas da crise. Mas os EUA estão singularmente mal preparados, devido a uma combinação de razões económicas e políticas, para responder normalmente.

Mais obviamente, a meta da Reserva Federal dos USA para a taxa dos fundos federais é ainda somente de 1.25%-1,5%. Se nenhuma recessão está iminente, o FED poderá conseguir aumentar as taxas de três vezes até ao final do ano, para cerca de 2%. Mas isso deixaria ainda pouco espaço para a flexibilização monetária em resposta às tendências da recessão antes que a taxa de juro diretora atinja zero novamente.

Nas últimas três recessões, os cortes de taxa de juros cumulativos do FED foram próximos de cinco pontos percentuais. Desta vez, porque a recuperação lenta permitiu apenas uma normalização gradual das taxas de juros, e porque parece ter havido uma tendência para as taxas de juros descerem de forma mais geral, o FED carece de espaço para reagir.

Em princípio, o FED poderia lançar outra ronda de flexibilização quantitativa. Além disso, pelo menos uma das figuras nomeadas pelo presidente Donald Trump para o Conselho de Administração do Federal Reserve tem sugerido a ideia de taxas de juros negativas. Dito isto, o Diretório do FED, com os seus três nomeados por Trump, é provável que seja menos ativista e inovador do que o seu antecessor. E as críticas pelo Congresso dos EUA de qualquer expansão adicional do balanço do FED seriam certas e intensas.

A política orçamental é a alternativa óbvia, mas o Congresso cortou nos impostos no pior momento possível, não deixando espaço para o estímulo económico quando este for necessário. Adicionar 15 milhões de milhões mais à dívida Federal irá criar uma relutância compreensível para responder a uma recessão com mais cortes de impostos. Como os meus colegas de Berkeley, Christina e David Romer, têm mostrado, a política orçamental é menos eficaz na luta contra as recessões, e menos provável de ser utilizada, quando um país já incorreu numa elevada dívida pública.

Em vez de estimular a economia na próxima crise, os republicanos no Congresso muito provavelmente irão responder de forma perversa. Como as receitas caem e o défice aumenta ainda mais rapidamente, eles vão insistir em cortes nas despesas públicas para fazer regressar a trajetória da dívida à sua tendência anterior.

Os republicanos do Congresso provavelmente começarão por cortar no programa de assistência nutricional suplementar, que fornece comida a lares de baixos rendimentos. Este programa já está na mira dos republicanos. Depois procederão a cortes no Medicare, no Medicaid e na Segurança Social. A carga destes cortes de gastos cairá sobre os consumidores já a viverem em extrema dificuldade e que e serão assim forçados a reduzir as suas despesas em dólares levando a que a procura agregada também ela diminua.

Pela sua parte, os governos estaduais, forçados pelos novos limites sobre a dedutibilidade de impostos estaduais e locais a reduzirem os seus orçamentos, muito provavelmente avançarão ainda mais na direção de limitar o período de tempo a que os desempregados tenham direito ao subsídio de desemprego e a reduzirem a extensão da sua própria assistência alimentar e nutricional.

Nem as condições globais irão favorecer os EUA. Os bancos centrais estrangeiros, da Europa ao Japão, têm igualmente escasso espaço para cortarem nas taxas de juros, por já estarem tão baixas. Mesmo depois de ser formado, finalmente, um governo na Alemanha, os seus responsáveis políticos continuarão a mostrar a sua relutância característica em utilizar a política orçamental. E se a Alemanha não utilizar o seu espaço orçamental, haverá pouco espaço para os seus parceiros da zona euro o poderem fazer.

Mais do que isso, a disponibilidade para o tipo de cooperação internacional que ajudou a travar a contração de 2008-2009 foi destruída pela Administração Trump com a sua agenda de “A América em primeiro lugar” que toma os seus aliados por inimigos. Outros países poderão colaborar com o governo dos Estados Unidos para se oporem à recessão seguinte, mas isso somente se confiarem no seu discernimento e nas suas intenções. E a confiança nos Estados Unidos é algo que agora começa a escassear.

Em 2008-2009, o FED criou linhas de swaps em dólares para apoiar os bancos centrais estrangeiros, mas ficaram imediatamente sob a linha de fogo do Congresso por estarem “a dar aos estrangeiros” dinheiro tão duramente ganho pelos americanos. Por essa altura, na Cimeira de Londres do G20 no início de 2009, a administração do Presidente Barack Obama assumiu um compromisso de coordenar o seu estímulo orçamental com o de outros governos. Hoje, quase uma década depois, é difícil imaginar a administração Trump sequer a aparecer numa reunião deste tipo.

A duração de uma expansão económica não é um estimador de confiança de quando virá a próxima desaceleração da economia. E a profundidade e a forma dessa recessão vai depender do evento que a desencadeie e este é igualmente incerto. A única coisa que sabemos com toda a certeza, porém, é que as expansões não duram para sempre. Uma tempestade certamente virá e, quando isso acontecer, nós estaremos mal preparados para o dilúvio.

 

READY OR NOT FOR THE NEXT RECESSION, texto disponível em https://www.project-syndicate.org/commentary/world-unprepared-for-next-recession-by-barry-eichengreen-2018-01

Barry Eichengreen é Professor de Economia na Universidade de Califórnia, Berkeley, e um antigo consultor político senior no Fundo Monetário Internacional. O seu ultimo livro é Hall of Mirrors:The Great Depression, the Great Recession, and the Uses – and Misuses – of History.

Leave a Reply