Derrotas, ou sucessos eleitorais doutros, seriam mais ou menos passáveis, suportáveis e explicáveis se houvesse referentes, continuidade, uma estrutura política, uma rede de ativistas, militantes e votantes, consolidada, em vias de consolidação ou em desenvolvimento esperançado.
Não é doado competir com o Estado, com as estruturas políticas consolidadas de grandes partidos do sistema, aparatos, poder territorial, redes fortemente imbricadas com os interesses, cultura, promoções e prebendas das oligarquias e classes dirigentes. Não é doado competir contra os mass média nem contra equipas profissionais com campanhas levadas por grandes empresas de comunicação, sistemas informáticos, assessores e gênios da análise de dados e propaganda.
Podemos, reconheço, nem me interessam a respeito da Galiza: bailam na lógica do capital, da Capital e do centralismo. Não entenderam que boa parte do seu sucesso foram as mensagens: República e federalismo e que boa parte do seu apoio e garantia de sucesso era, nessas chaves, o voto progressista das nações sem Estado. Ciudadanos é um partido catalano-madrileno, marciano na Galiza para além da novidade e moda dos senhoritos bem das cidades, incômodos com esse PP de boina, leitor de La Voz de Galicia e satélites, representante do poder local, fiel a Madrid, suicida e atado à terra. Agora, os mais fachitas deles, e nostálgicos de Fuerza Nueva, até têm os de VOX. Minorias.
Na Galiza apenas o PP tem uma estrutura territorial, política e mediática, sólida e consolidada. Infelizmente a sua progressiva integração no aparato espanhol, foi dando conta e arrastando com ela a Galiza, o jeito tradicional galego de fazer política e de comunicar: contribuindo nesta nacionalização e madrilenização centralista de interesses, discursos e debates inexistentes e alheios, a devastar a rica e variada cultura política, organizativa, discursiva do país e a identidade.
Mareas afundam. O BNG resiste, justo pelo mesmo que os novos partidos, com todas as suas individualidades midiáticas, carecem: pela sua militância, pela estrutura territorial e rede institucional, mas não amplia (para além de uns mínimos e em função do trabalho lento e admirável de equipas locais) base nem voto.
O PP-G, desorientado entre a sua alma galega e a sua fidelidade a uma Espanha mesetária, perde cidades e diputações; a favor de um PSOE-G, delegação local de Madrid, e no efeito do seu sucesso na Espanha. O poder local fica na esquerda espanhola, que representa a voz e voto da moderação.
Mas a questão não é essa. Outra questão importante é o da perca de valiosos recursos humanos: é a devastação após uma década de enfrentamentos e cisões devastadoras nos partidos políticos do galeguismo: dos partidos e correntes nacionalistas, soberanistas, independentistas.
A explicação de tanta miséria, sofrimento, fragmentação e enfrentamento continuado é complexa, e tem as suas raízes por uma banda no genocídio da Guerra Civil, com extermínio e dispersão sistemática de referentes e programas e na rotura com ele do galeguismo dos anos 50. E, por outra, no enfrentamento entre esse galeguismo culturalista no franquismo nado a partir do ano 50 (autoproclamado de galeguismo único e continuador) contra o novo nacionalismo marxista de base anti-imperialista, anti-colonialismo aparecido nos anos 60. Ambos os dous, por sua vez, sem memória histórica consciente, nem relação explícita, com o galeguismo de Pre-guerra.
Os alicerces foram maus, as escolas políticas piores, o modos não bons, e os mandarinatos célebres. Com isto definiram dous caminhos diferentes: culturalismo assessor nos Partidos do sistema e roturismo marxismo-estalinista de aparato. Centralismo, jeitos, modos e referentes espanhóis, exclusivismo, pessoalismo, culto ao líder, purgas, purismo, e cisões definem desde os 60 a política galega.
Os últimos 20 anos também não são bons. A análise eleitoral, eleição e eleição é nenhuma. As divisórias, diferenças, purgas, enfrentamentos, feridas, concorrências, protagonismos, ofensas e fracassos liquidaram muitos ativos. Perdeu-se tempo imenso em políticas de patação e guerras de símbolos, e em seguir o ritmo e os temas à moda da política de Madrid, que não criaram massa social, consciência nacional, escola, instituições, nação e língua.
O mais triste é que, pelo momento, nem é possível re-começar de zero. A conclusão é três gerações de ativistas queimados, feridos, espalhados, comestos pelo rancor, irreconciliáveis, incapazes de conformarem projetos coletivos para além dos espaços pequenos e reduzidos de âmbito local ou do interesse específico técnico, sindical, gremial ou cultural.
Enfim. Paciência. Imos fazendo-nos velhos e a aniquilação da Galiza é uma realidade. Patrimônio, território, cultura, língua, população, vão desaparecendo em nome do progresso e da construção absurda do estado espanhol centralista, monolingue e monocromo.
Afinal, com tudo, e por não fechar completamente a negro, termino sempre admirando-me da genial capacidade de Castelao para sintetizarmo-nos em alegorias programáticas, construtivas e esperançadas:
