A reforma das pensões ou a impossibilidade de transportar património monetário para o futuro – 1. A Europa também tem os comboios a descarrilar. Por John Mauldin

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Seleção e tradução de Júlio Marques Mota

1. A Europa também tem os comboios a descarrilar

john mauldin Por John Mauldin

Publicado por mauldin economics logo em 22 de junho de 2018 (ver aqui)

O dinheiro não está lá

A válvula de segurança ficou presa

Comendo o bolo

Reduzir tanto quanto for necessário

Pensamento mágico

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O ditador italiano Benito Mussolini, pelo menos, fazia andar os comboios à tabela, segundo a lenda. Mas outras fontes dizem que o sistema ferroviário italiano permaneceu horrível com ele no poder.

O mesmo pode ser verdade para os vangloriados programas de apoio social da Europa moderna (e do Canadá, da Austrália, e…). Certamente, estes programas têm ajudado muitas pessoas, mas não eliminaram a pobreza, nem permitiram que todos se possam aposentar com conforto. Será que poderiam muito simplesmente ter deslocado no tempo as despesas, deixando a fatura às gerações futuras? Hoje, vamos explorar essa questão como parte da minha série de textos intitulada “Descarrilamento dos comboios”.

Na semana passada, eu olhei para os fundos de pensões públicos dos Estados Unidos, muitos dos quais estão lamentavelmente subfinanciados e provavelmente nunca poderão pagar aos trabalhadores os benefícios prometidos – pelo menos sem emitirem uma enorme e indesejada fatura a ser paga pelos contribuintes. E os contribuintes são geralmente eleitores, por isso é duvidoso que estes venham a aceitar pagar a conta. (mesmo os suíços, como veremos abaixo, votaram contra uma suave reforma para pagarem para o seu sistema de pensões.)

Os leitores não americanos podem ter sentido um pouco de satisfação com isso. Lá estão aqueles americanos loucos outra vez, a gastarem descontroladamente além dos seus meios. E o leitor tem parcialmente razão; Não somos propriamente as pessoas mais poupadas na terra. No entanto, o seu país pode ser mais parecido com os EUA do que pensa.

Este texto é o sétimo da minha série “Descarrilamento dos comboios”:

Descarrilamento impulsionado pelo crédito (11 de maio)

Antevisão do descarrilamento (18 de maio)

Descarrilamento de alto rendimento (25 de maio)

O detonador italiano (1 de junho)

Relógio da dívida em andamento (8 de jumho)

O comboio das pensões não tem cintos de segurança (15 de junho)


O dinheiro não está lá

No ano passado, um estudo do Fórum Económico Mundial analisou seis países desenvolvidos (os EUA, Reino Unido, Holanda, Japão, Austrália e Canadá) e dois mercados emergentes (China e Índia) e encontrou um défice de poupança de $400 milhões de milhões para pagamento de pensões de reforma por volta de 2050. Isso é quanto é necessário a mais para garantir que todos os que estiverem em idade de reforma recebam 70% do seu rendimento de trabalho, incluindo o governo, empregadores, e poupanças pessoais, mas principalmente o governo.

Este impressionante número, mais do que o PIB anual do planeta inteiro, nem sequer inclui a maior parte da Europa. No entanto, a menos que esses países de alguma forma venham a encontrar o dinheiro, eles vão quebrar as promessas que fizeram aos trabalhadores de hoje.

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Fonte: análise Mercer

$400 milhões de milhões parece muito dinheiro. E é. Mas os oito países nesse total representam cerca de 60% do PIB global (um cálculo feito à pressa), de modo que o leitor poderia dizer que devemos adicionar outros $250 milhões de milhões para preencher completamente o buraco das pensões de reforma à escala global. A sua dimensão pode variar por país e por situação demográfica.

E para muitos países, como os EUA, isso não inclui os cuidados de saúde e outras obrigações. O último texto desta série começará com a somar total. Eu realmente ainda não fiz esse cálculo, mas nós podemos assustar-nos com mil milhões de milhões de dólares, com um “Quatrilião”. E isto é com uma economia global que hoje representa menos de 80 milhões de milhões.

Lembre-se do que eu disse nesta série até agora: promessas como estas são dívida, mostrem-se elas no balanço ou não. Não as pagar é equivalente ao incumprimento da dívida. Os credores (trabalhadores) certamente o entenderão assim, no mínimo.

Como eu também observei, o crescente aumento da esperança de vida está a impulsionar este problema. Atingir a idade dos 100 anos já é menos notável do que costumava ser. Essa tendência vai continuar. A boa notícia é que também estaremos com melhor saúde nessas idades avançadas do que as pessoas estão a ter agora. Poderão os 80 anos corresponder aos 50 de agora? É melhor esperar que seja assim, porque a matemática é sombria se as pessoas deixam de trabalhar aos 65-70 anos de idade, que é precisamente o que o Wall Street Journal escreveu esta semana na sua primeira página. E vemos isso na falta de trabalhadores disponíveis no mundo real.

Dito isto, penso que veremos uma grande variação nacional nestas tendências. Alguns países têm planos governamentais robustos sobre pensões, outros dependem mais das contribuições dos empregadores e das contribuições individuais. No quadro de conjunto, porém, o dinheiro simplesmente não está lá. Nem aparecerá magicamente quando for necessário.

No quadro de conjunto, o dinheiro simplesmente não existe. Nem irá aparecer magicamente quando for necessário.

No Forum Económico Mundial chegou-se à mesma conclusão a que eu cheguei há já muito tempo: esta ideia de passar décadas em lazer até à beira da morte é simplesmente inviável e está rapidamente a atingir os seus limites. A maioria de nós irá trabalhar bem mais para além dos 65, quer queiramos quer não.

Que problema há quanto aos milhões atualmente na situação de reforma ou quase a lá chegarem? Isso é um grande problema, especialmente para os trabalhadores dos EUA do setor público, como eu o escrevi na semana passada. Devemos também salientar que somos todos trabalhadores do sector público de uma certa forma, uma vez que temos de pagar para a segurança social e só podemos esperar que Washington, eventualmente, nos dê algo de volta.

E isto vai piorar à medida que as novas tecnologias ante envelhecimento se difundem. Alguns estão aqui agora. Aqui está o gráfico da esperança de vida atual, via Wade Pfau publicado pela FORBES.

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Fonte: Wade Pfau

Quando as tecnologias anti-envelhecimento entrarem em ação, nós precisaremos de deslocar aquelas curvas para a direita dez anos (pelo menos!!!!). E então eu acho que a reversão de idade vai aparecer no início de 2030 e será omnipresente pelos anos 2040.

Isso é uma grande notícia para aqueles que querem viver mais tempo, mais jovens e de forma mais saudável, mas vai forçar a mudanças radicais na nossa passagem à reforma e no trabalho. Entretanto, a automação estará a destruir milhões de empregos. (por esta via o nosso colega Patrick Cox está em cima de tudo isso e estamos a planear alguns textos de Maudlin Economics este Outono em que se irá esboçar as possibilidades de aumentar a nossa esperança de vida com saúde.)

Agora, vamos olhar individualmente para alguns países


A válvula de segurança ficou presa

Vamos começar com o nosso aliado europeu mais próximo, o Reino Unido. O estudo de WEF mostra o Reino Unido com um défice de poupança na ordem dos 4 milhões de milhões de dólares para as reformas a partir de 2015, projetada para subir 4% por ano e atingir o valor de 33 milhões de milhões por volta de 2050. Num país cujo PIB total é de cerca de $2,6 milhões de milhões, o défice já é maior do que o PIB do país e, com a inflação mesmo modesto, a situação vai ainda piorar.

Além disso, estes valores foram calculados antes de o Reino Unido ter decidido deixar a União Europeia. Este grande realinhamento económico poderia certamente mudar as perspetivas. Se seria melhor ou para pior, eu não sei ainda. A resposta depende de a qual dos meus amigos é que eu coloco a questão, e se estes estão do lado do Permanecer na UE ou do lado do Sair da UE.

Um estudo da OCDE de 2015 diz-nos que os trabalhadores dos países desenvolvidos poderiam, em média, esperar que os programas governamentais substituíssem 63% do seu rendimento auferido em idade ativa. Não é assim tão mau. Mas no Reino Unido, esse valor é de apenas 38%, o mais baixo de todos os países da OCDE. Isto significa que os trabalhadores britânicos devem poupar individualmente mais ou alternativamente cortarem severamente nas despesas quando se aposentarem.

Os regimes de poupança dos empregadores do Reino Unido também não estão assentes em bases particularmente sólidas. De acordo com o Fundo de proteção das pensões do governo, cerca de 72,2% dos planos de benefícios definidos no setor privado do país estão em défice e as carências totalizam $257,9 mil milhões de libras esterlinas. Os passivos governamentais para as pensões de reforma passaram de um nível de capitalização elevado em 2007 para um défice de $384 mil milhões de libras esterlinas dez anos depois e não há nenhuma dúvida que cresceu ainda mais desde então. Mais uma vez, que é uma quantidade bastante grande para uma economia de menos de $3 milhões de milhões.

Até este ponto, os reformados do Reino Unido tiveram uma espécie de válvula de segurança: a capacidade de se aposentarem e passarem a viver em países da UE com menor custo de vida. Essa opção pode desaparecer depois do Brexit.

Um relatório do ano passado publicado pelo International Longevity Centre sugeria que os trabalhadores mais jovens no Reino Unido terão necessidade de economizar 18% dos seus ganhos anuais, a fim de terem um rendimento “adequado” aquando da sua passagem à reforma, e este rendimento é calculado como inferior ao que os aposentados de hoje desfrutam. Isto é só pura fantasia. Nada disto vai acontecer, de modo que o Reino Unido está a caminhar em direção a uma implosão das situações de reforma que poderia ser pelo menos tão caótica como nos EUA.


Comendo o bolo

Os americanos têm muitas vezes uma visão romântica da Suíça. É certamente um dos meus países favoritos. Achamos que é a terra da disciplina fiscal e da independência robusta. Até certo ponto é, mas a Suíça tem a sua quota de problemas, também. O plano nacional de pensões tem estado a sofrer de défices à medida que a população envelhece.

No verão passado, os eleitores suíços rejeitaram um plano de reforma do regime de pensões que teria fortalecido o sistema, elevando a idade de passagem à reforma das mulheres de 64 para 65 e aumentando os impostos e as contribuições exigidas ao trabalhador. Estas leves mudanças inflamaram os suíços com 52,7% dos eleitores a votarem não a estas reformas.

Os eleitores à escala mundial geralmente querem em simultâneo conservar o bolo e comê-lo, também. Exigimos benefícios generosos, mas não gostamos de pagar o seu preço. Os suíços, apesar de sua reputação, não parecem assim tão diferentes como se quer crer. Considere o que escreve o Financial Times.

Alain Berset, Ministro do interior, disse que o voto no Não não é ” fácil de interpretar”, mas que não estava “tão longe da maioria” e que o trabalho iria começar em breve sobre as propostas de reforma revistas.

Bern tinha procurado repartir o fardo das mudanças para o sistema de pensões, disse Daniel Kalt, economista-chefe do UBS na Suíça. “Mas é difícil encontrar um compromisso para que todos possam dizer Sim”. A pressão para a reforma ser aprovada “ainda não foi suficientemente elevada”, argumentou. “A consciência de que algo tem que ser feito vai, a partir de agora, aumentar.”

Isso descreve a maior parte da atitude do mundo. Os políticos e os eleitores ignoram os problemas a longo prazo que sabem que um dia virão e não pensam senão nas eleições seguintes. Essa citação, “A consciência de que algo tem que ser feito agora vai aumentar”, pode ser literalmente verdade, mas há uma grande lacuna entre a consciência e a motivação – na Suíça e em todos os outros lugares.

Agora, a ironia é que mesmo com os  seus problemas, o Reino Unido e a Suíça estão em melhores condições do que muitos outros países na Europa. Eles realmente têm pré-financiamento obrigatório com a gestão privada e com uma modesta rede de segurança pública, juntamente com a Dinamarca, Holanda, Suécia, Polónia e Hungria.

(Nota à margem: as taxas baixas ou negativas em todos aqueles países tornam quase impossível que os seus fundos de pensões privados consigam alguma vez e em qualquer país cumprir os seus mandatos sem contribuições anuais grandes para aquelas empresas ou companhias de seguros, o que reduz os seus ganhos. E muitos são obrigados por lei a investir em títulos do governo com retornos insignificantes ou negativos.)

Por outro lado, a França, a Bélgica, a Alemanha, a Áustria e a Espanha são todos países em que o sistema de pensões é sobretudo financiado por um regime de repartição, em que nada é guardado nos cofres públicos para futuras obrigações do sistema de pensões. As prestações pagas aos pensionistas saem do orçamento geral todos os anos. A crise é bastante previsível porque o número de aposentados está a crescer, enquanto o número de trabalhadores que pagam para o orçamento geral está a cair. Além disso, a diminuição da fertilidade nesses países torna as realidades demográficas ainda mais difíceis.


Reduzir tanto quanto for necessário

A Espanha recuperou-se de crises recentes mais vigorosamente do que alguns dos seus parceiros do Mediterrâneo como, por exemplo, a Grécia. Isso é igualmente verdade relativamente ao seu plano nacional de pensões, que até há muito pouco tempo estava numa situação de excedente. Infelizmente, o governo “emprestou ” alguns dos excedentes para outros fins e rapidamente ter-se-á uma situação de um défice de dimensão considerável.

A ironia aqui é que, assim como nos EUA, o programa da Espanha é chamado de Segurança Social, mas tal como a nossa versão, não é nem social nem seguro. Ambos os governos meteram as mãos nos fundos públicos de pensões supostamente sagrados, e ambos utilizaram essas poupanças para o que os ventos políticos desejavam. 

A Espanha tem atualmente 1,1 milhão mais de pensionistas do que tinha há apenas 10 anos atrás, e como a geração de baby boom se vai aposentar, este número crescerá ainda mais. Com uma taxa de desemprego tão elevado quanto 25% entre os trabalhadores mais jovens, também isso não está a ajudar nada.

Dos dois, os EUA é o país que está em “melhor” forma, principalmente porque nós controlamos a nossa própria moeda e podemos desmaterializá-la tanto quanto for necessário para manter o governo à tona. Os cheques da Segurança Social dos EUA serão sempre cobertos, mesmo que não comprem tanto. A Espanha não tem essa vantagem se permanecer ligada à moeda euro. Essa é uma razão pela qual a zona euro poderia eventualmente afundar-se.

Em pelo menos alguns dos países em que o sistema de pensões é financiado por um regime de repartição, os planos públicos de pensões permitem a passagem antecipada para à reforma na idade 60 ou mesmo abaixo. A taxa de contribuição dos trabalhadores é geralmente inferior a 25%.

Pior, alguns governos pagam aos reformados mais do que eles receberiam se estivessem na verdade a trabalhar. Este gráfico da OCDE mostra os benefícios auferidos com as pensões em percentagem dos salários de trabalho. É mais de 100% na Croácia, na Turquia e nos Países Baixos, e acima de 90% na Itália e em Portugal.

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Fonte: OECD Pensions at a Glance 2017

Lamento muito, mas não há simplesmente nenhuma maneira de isto poder continuar. Estes governos têm legislado na base do arco-íris e de unicórnios. Eles não poderão pagar tais benefícios, a menos que seja porque os salários e os pagamentos de benefícios caiam para níveis inimagináveis baixos.

Um bastante sombrio relatório especial publicado pelo Wall Street Journal incidiu sobre os formidáveis desafios demográficos. A população europeia de reformados, que já é a maior do mundo, continua a crescer. Considerando os europeus com 65 ou mais velhos que não estão a trabalhar, existem 42 para cada 100 trabalhadores. Isto vai aumentar para 65 por cada 100 trabalhadores por volta de 2060, diz a agência de dados da União Europeia. Em comparação, os EUA têm 24 pessoas a não trabalharem com 65 ou mais anos por cada 100 trabalhadores, diz o Bureau of Labor Statistics que não tem nenhuma projeção para 2060.

Ao contrário da maioria das histórias financeiras europeias, este não é um problema norte-sul. A Áustria e a Eslovénia enfrentam desafios demográficos difíceis, juntamente com a Grécia. Este gráfico de WSJ compara a parte da população de Europa de 65 anos e mais idosas a outras regiões assim como a parte da população dos trabalhadores entre 20 e 64. São estatísticas nada agradáveis.

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Em toda a Europa, a natalidade caiu 40% desde a década de 1960 para cerca de 1,5 crianças por mulher, de acordo com as Nações Unidas. Nesse tempo, a expectativa de vida média aumentou de cerca de 69 anos para aproximadamente 80 anos.

Na Polónia, a natalidade é ainda mais baixa, e aí a desconexão demográfica é agravada pela emigração. Aproveitando a liberdade de circulação da UE, muitos jovens polacos em idade de trabalhar partem para outros países em busca de salários mais elevados. Um artigo publicado pelo Banco Central polaco prevê que por volta de 2030, um quarto das mulheres polacas e um quinto dos homens polacos terá 70 ou mais anos.

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Tudo o que li sobre os países na Europa com sistemas de pensões financiados em regime de repartição sugere que eles estão numa posição muito pior do que a dos Estados Unidos. Além disso, as suas economias estão estagnadas, e a carga fiscal já está perto de 50% do PIB.

Além disso, muitos fundos de pensões privados estão em estado altamente calamitoso, também. As taxas de juros baixas e negativas têm devastado a capacidade de os ativos crescerem. Combinada com o passivo dos fundos públicos de pensões, o custo total para satisfazer as necessidades de rendimentos e de cuidados de saúde dos aposentados como percentagem do PIB vai aumentar drasticamente em toda a Europa.

Pense nisso por um momento. Eu não estou a falar acerca da percentagem de receitas fiscais. Estou a falar de uma percentagem do PIB que, na Bélgica, será de 18% em cerca de 30 anos. Que representarão cerca de 40 – 50% das receitas fiscais totais. Isso não deixa muito espaço para outros itens no orçamento. Grécia, Itália, Espanha? Não estão muito atrás…

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Alguns estudos fazem com que os números acima pareçam otimistas. A maioria das economias europeias já está massivamente endividada e estas têm taxas de tributação elevadas. E os países na zona euro não podem sequer imprimir a sua própria moeda.

O Presidente francês Emmanuel Macron e alguns outros parecem estar a lançar as bases para a mutualização de toda a dívida da zona euro, que presumo irá acabar no balanço do BCE. No entanto, isso ainda não enfrenta os passivos não capitalizados. Será que eles se vão endividar mais ainda? Ao que nos parece o plano é chutar o problema um pouco mais para a frente, coisa em que a Europa se está a tornar boa.

No quadro seguinte, a linha que passa por cada um dos países mostra a sua dívida em termos de pensões como percentagem do PIB. A Itália já está acima de 150%. E este é um gráfico mais antigo. Um novo gráfico seria apenas ainda mais feio.

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Source: Citi GPS

Este problema é muito maior do que até mesmo os governos mais disciplinados, orientados para o futuro, e as empresas poderão ser capazes de tratar com alguma facilidade. Não se limita a um país ou a um continente. O problema existe em toda a parte, diferindo apenas na severidade e nos detalhes.


Pensamento mágico

Veja o que estamos a tentar fazer nos EUA e na Europa. Pensamos que um número crescente de pessoas pode gastar 35-40 anos a trabalhar e a poupar e, em seguida, parar de trabalhar e continuar por mais 20-30-40 anos no mesmo nível de conforto, tudo isto quando passa a haver menos trabalhadores a pagarem para o sistema, ano após ano. Sinto muito, mas isso é um pensamento mágico no seu pior. Isto não é, de forma nenhuma, o que os primeiros esquemas de reforma tiveram em linha de conta nos seus cálculos. Tentaram satisfazer as necessidades de um número relativamente pequeno de pessoas idosas que eram incapazes de trabalhar. A expectativa de vida era tal que a maioria dos trabalhadores não chegaria a esse ponto, ou pelo menos viveria apenas alguns anos entre a passagem à reforma e a morte.

O simples facto é que a família alargada, que era a base de apoio para aqueles que tiveram a sorte de chegar à velhice, desapareceu. Como a expectativa de vida aumentou e a dimensão das famílias encolheu desde 1950, o governo tornou-se o zelador paternal/maternal daqueles que atingiram a idade mágica dos 65 anos.

Como eu referi em textos anteriores, quando Franklin Roosevelt criou a Segurança Social para pessoas com mais de 65 anos, a esperança de vida era aproximadamente à volta de 56 anos. A idade de passagem à reforma nos Estados Unidos poderia agora estar situada em torno de 82 anos se a idade da aposentação mantivesse a mesma relação com a esperança de vida. Tente vender isso aos eleitores.

Pior, gerações de políticos convenceram o público de que não só isso é possível, como isso é garantido. Muitos acreditam por si mesmos. Com este tipo de posição estarão menos a mentir do que a mostrar uma profunda ignorância da realidade. Mas essa ficção dá-lhes votos. Eles muitas vezes superam-se uns aos outros em corridas políticas a disputarem a ideia de qual deles é o mais generoso. Isso não é apenas a nível federal. É visto mais frequentemente ao nível local em que se prometem serviços públicos sempre mais generosos enquanto vão também tapando os buracos financeiros. Os políticos fizeram promessas que possivelmente não podem manter, mas o povo organiza as suas vidas supondo que o impossível aconteça. Mas não vai acontecer.

Como vamos sair disto? Vamos todos fazer um grande ajustamento. Se a longevidade aumentar, o que espero que aconteça em breve (como nos próximos 10-15 anos), poderemos ser capazes de o fazer com menos dor, mas ainda vai exigir grandes e significativas mudanças de estilo de vida. O período de tempo de reforma será mais curto, mas melhor, porque seremos mais saudáveis.

Esse é o melhor cenário, e acho que temos uma boa oportunidade para o conseguir mas não sem que em primeiro lugar se tenha levado a cabo um conjunto de ajustamentos. Como conseguimos passar por esse processo é a questão mais importante.

Não estou otimista porque o compromisso está-se a tornar uma arte fora de uso. A política nos EUA e em grande parte da Europa, é uma câmara de ressonância onde falamos principalmente para nós mesmos e para aqueles que pensam como nós. Ignoramos o outro lado, tratando-os como leprosos socialmente inaceitáveis. Todos nós já perdemos a capacidade de discordar amigável e racionalmente. Não há muito tempo, Ronald Reagan e Tip O’Neil podiam sentar-se e trabalhar sobre as questões da Segurança Social. Bill Clinton e Newt Gingrich podiam sentar-se e não só modificar a ajuda social como também procurar equilibrar o orçamento. Esse tempo já foi.

Quando alguns bibliotecários pensam que os livros para crianças do Dr. Seuss são racistas e por conseguinte inaceitáveis numa biblioteca pública, o discurso civil está em espiral rapidamente descendente.

Não gosto disso.

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