CARTA DE BRAGA – “da crise e de coisas velhas” por António Oliveira

Este ‘corona’, prefiro dizer assim, pois ‘covid-19’ parece-me uma trapalhada a terminar em data de incorporação militar, não compensa a tristeza de o aturar, até por ameaçar manter-se ainda muito mais tempo, bem longe das pressas de alguns em retomar aquilo que dizem de normalidade!

Estou convencido de que uma parte substancial do nosso entorno económico e humano vai desaparecer, por transformado em consequência de medidas imprevisíveis, por situações globais impossíveis de calcular, envolvendo actividades económicas e humanas que, pela sua dimensão, vão pedir requalificações que poucos poderão entender e mesmo aceitar.

Foram muitas dezenas de anos de ‘festança’ ultraliberal, ‘jogadas’ e ‘golpes’ com capitais e fugas de impostos, com ou sem Holandas e Bermudas, alimentados também por alguma (muita!) conivência entre poderes políticos e económicos.

Este ‘corona’ está a obrigar-nos (a todos) a olhar para nós próprios, para o egoísmo em que (todos) temos estado a viver, esquecendo que cada um de nós não passa de um minúsculo grão de areia na praia infinita do universo.

Mas, um outro factor bem grave se vem juntar ao ‘corona’, as enormes distinções entre as grandes potências deste mundo, agravadas pelos níveis de incompetência bem visíveis nos seus lideres que, tirando algumas excepções, não são garantia de sossego nem esperança.

Parecem justificar as afirmações de Hannah Arendt ‘O poder nunca é propriedade de um indivíduo; pertence a um grupo e existe somente enquanto o grupo se conserva unido’, mas temos vindo a verificar que ‘Em nome de interesses pessoais, muitos abdicam do pensamento crítico, engolem abusos e sorriem para quem desprezam. Abdicar de pensar também é crime’, diz ainda a filósofa.

O economista Joseph Stiglitz, afirmou ao em 28 de Abril último, ‘A pandemia voltou a demonstrar que as nossas economias estão pensadas para crescer por ambição, mas não para prevenir por solidariedade’.

E, contundente ‘Quem mais morre por elas são os mais pobres, a deixar indiferentes os que se sentem a salvo, por poderem pagar os melhores serviços de saúde. E, agora o ‘trump’ ataca o melhor dos nossos sistemas, a ciência!

Aliás, são muitas as ‘cabeças’ importantes que, nas últimas décadas, não deixaram de fazer alusões sobre à importância vindoura de crises como esta, por poderem provocar graves alterações nos procedimentos económicos, políticos, sociais e humanos e também sobre as suas eventuais e danosas consequências.

Começando mesmo pela antiga Roma, Cícero salientou, já naquele tempo, ‘Se conseguirem encontrar vida em outros planetas, os Humanos destruirão toda a galáxia’.

A propósito de galáxia, Aldous Huxley deixou-nos uma pergunta algo inquietante ‘E se este mundo for o inferno de outro planeta?

George Bernard Shaw traz as coisas de novo cá para baixo ‘As epidemias tiveram mais influência que os governos, no desenvolvimento da nossa história’.

E bem cá em baixo, o Papa Francisco afirmou nos últimos dias de Março, ‘Deus perdoa sempre, nós de vez em quando, a Natureza não perdoa nunca!

Também podemos juntar aqui um pouco da ironia cáustica da jornalista e escritora brasileira, Clarice Lispector, ‘Ter nascido arruinou-me a saúde!’ e, até por esta afirmação, não podemos esquecer como os mais velhos são os alvos preferidos do ‘corona’ e dos seus derivados económicos, políticos, sociais e humanos.

E ainda dá para juntar uma outra reflexão, mas do escritor e crítico literário, Émile Faguet, (final séc XIX, princípio séc XX), referindo cinco óptimas coisas antigas e muito consolo nos acartarem

Esposas idosas

Velhos amigos para conversar

Lenha velha para aquecer

Vinhos velhos para beber

Livros antigos para ler

 Ámen!

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 

 

 

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