CARTA DE BRAGA – “de eucaliptos e rosas” por António Oliveira

Tudo como dantes, quartel general em Abrantes.

Respondia assim o povo português sempre que perguntado como iam as coisas, no tempo da primeira invasão francesa, em 1807. Junot instalara, o quartel-general em Abrantes e em Lisboa nada se fazia, com intenção de se opor ao avanço do general francês’.

Foi assim que Orlando Neves registou e explicou aquele dito, no Dicionário de Expressões Correntes, publicado em 1999.

Lembrei-me disto porque, agora, tudo parece continuar como dantes, com o eucalipto a ser, de muito longe, a espécie mais autorizada cá no Eucaliptal, pois entre Outubro de 2013 e Junho de 2020, conseguiu validar uma área de 81.475 ha para novas plantações, enquanto o sobreiro, em segundo lugar, só teve 5931.

A monocultura que já deu origem a desastres vários, continua a favorecer os produtores do papel higiénico, o produto mais vendido para aliviar os temerosos do ‘corona’, mas também a produzir odores estrategicamente distribuídos pelo país, sempre à beira rio ou à beira mar.

Sabemos sempre onde estamos a passar, mesmo sem lhes olharmos as altas chaminés pelos inevitáveis e ‘merdosos’ fumos e cheiros.

Curiosamente, são as zonas Centro e Lisboa e Vale do Tejo, as regiões mais procuradas, talvez por na zona Norte haver já pouco terreno livre para isso, muito mais do que por acreditar que as pessoas tenham aprendido ou ‘importado’ alguma dose de consciência actualizada, a ver pelo que se tem passado com o tal ‘corona’, que teimam agora em querer desconfinar!

E também se devia ter em conta aquilo que uma das pessoas que mais respeito, o ex-presidente uruguaio, Pepe Mújica afirmou há poucas semanas, ‘Esta crise é um desafio da biologia para recordarmos que não somos os donos do mundo’.

E levando as coisas um bom bocado mais longe, até ao escritor Herman Hesse (Prémio Nobel de Literatura em 1946), que deixou escrito ‘Quando tivermos aprendido a escutar as árvores, nos sentiremos em casa e isso é a felicidade’.

Mas Henry David Thoreau dá outra dimensão a este tema, num poema bem simples

Fui à floresta porque queria viver de verdade.

Eu queria viver profundamente e tirar toda a essência da vida.

Fazer apodrecer tudo que não era a vida, e não, quando eu morrer

descobrir que não vivi

O mesmo faz Fernando Pessoa

Segue teu destino, rega tuas plantas, Ama as tuas rosas.

O resto é sombra de árvores alheias….

Vê de longe a vida. Nunca a interrogues.

Ela nada pode dizer-te. A resposta, está além dos Deuses

Não acredito que os fabricantes dos rolos de papel higiénico, mais todo o poder que têm atrás, estejam dispostos a mudar de rumo, mas lembro-me também de uma simples frase de Machado de Assis, que deveria servir de motivo de meditação, ‘Para as rosas, escreveu alguém, o jardineiro é eterno’.

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

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