CARTA DE BRAGA – “elos e corrente da vida” por António Oliveira

Fernando Valladares, ecólogo no Centro Superior de Investigação Científica em Madrid, afirmou há dias, literalmente, ‘Este verão será, possivelmente, um dos mais frescos no tempo que nos resta de vida’. 

Tem um ar tranquilo, cabelos e uma barba branca que lhe cobre o queixo e, adianta com uma sombra triste a pesar-lhe nos olhos, ‘Há muito tempo que vínhamos avisando, ser necessário reduzirmos a emissão de gases de efeito estufa, mas em vez de a diminuir estamos a aumentá-la. Entrámos numa dinâmica exponencial, a levar que os efeitos extremos se notem cada vez com mais intensidade’. 

A jornalista ficou sem palavras, olhei depois para os meus apontamentos e descobri esta citação de Viriato Soromenho Marques, numa das suas crónicas no DN, ‘Neste momento, a Europa volta ao carvão e por todo o mundo os projetos de expansão de petróleo e gás natural, incluindo a abertura de novas jazidas, vão, provavelmente, atirar para o rol das mais sinistras mentiras da história, as metas de redução dos gases de estufa, do Acordo de Paris’.

Mas este filósofo e professor vai ainda mais longe, ‘Quanto à esperança de que a humanidade seria capaz de evitar o aniquilamento nuclear, será mais pudente esperar pelo resultado do encarniçamento crescente do atual conflito. A Ucrânia está a ser devastada, mas como a Rússia e os EUA/NATO parecem já não partilhar o imperativo da contenção entre potências nucleares, uma escalada do conflito, cujos contornos estão para lá da adjetivação, permanece no horizonte do possível’.

Entrámos já num período de crise aguda e generalizada. Todos os organismos mundiais de vigilância, nos vinham avisando há muito tempo, com números cada vez mais ameaçadores e nada fizemos para parar tal crescimento. Crise mundial, se dizia, mas não tivemos em consideração que, neste campo, a solidariedade e o trabalho conjunto são um dom, pois nesta situação ou se salvam todos ou não se salva ninguém, nem aqueles que procuram desesperada e ricamente no espaço, arranjar a solução alternativa. 

Pode juntar-se a este panorama, o inacreditável número de 100 milhões, indicado pela ACNUR Agência das Nações Unidas para os Refugiados o número que representa a quantidade de pessoas afastadas das suas terras até ao passado mês de Maio, devido às guerras, perseguições, violência e violações dos direitos humanos; também se verificou um aumento gradual cada ano durante a última década, afirmou Filippo Grandi, o responsável máximo daquela instituição, adiantando mais, ‘Se a comunidade internacional não se unir para estancar esta tragédia com soluções perduráveis, aquela terrível tendência continuará’.

Mas há outro pormenor que a maior parte das pessoas nem repara, por viver nas cidades, grandes ou pequenas, tentando arranjar sossego entre as idas e vindas para o trabalho, mais o barulho do trânsito, quase sem reparar no imenso chapéu que a poluição lhe vai mantendo em cima das cabeças enquanto os céus vão ficando vazios de pássaros, com algumas espécies ameaçadas de extinção e até o humilde pardal, deixou de saltitar entre as poucas árvores que bordejam as ruas. 

Convém não esquecer que a vida é como uma maravilhosa corrente que pode romper quando falha algum dos elos, disse alguém que já não recordo e, da mesma maneira que o céu vai ficando vazios de pássaros, também os campos vão ficando cada vez mais vazios de vida, contrastando brutalmente, pelas suas ‘odes’ ao silêncio, com a violência do ruído nas ruas das cidades, que vai aumentando à medida que elas também vão crescendo.

E o desaparecimento dos pássaros, é acompanhado ainda com a ausência dos gafanhotos, do ‘cantar’ dos grilos ou das cigarras e do piscar dos pirilampos, mas estas são coisas que não parecem interessar, ocupadas que estão as pessoas a discutir cores de camisolas, os nomes de quem as veste, acrescentar alguns emojis, enquanto os governos criam mais grupos de estudos, comissões e outros lugares obviamente bem pagos mas nenhum deles capaz de repor ou substituir a falta de um só pirilampo.

E, como afirma no trabalho ‘O riso dos sobreviventes’, o filósofo Santiago Alba Rico, ‘Se a morte existe, tudo é risível, o riso é a coisa mais séria neste mundo e ao rirmos da morte, concedemos qualquer coisa como um indulto geral perdoamo-nos a vida’.

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 

 

2 Comments

  1. Meu amigo, a tua Carta agita as consciências, mas nas entrelinhas, está a mágoa de incredulidade e da impotência…O HOMEM há-de destruir-se…há-de destruir tudo…Continuo a lutar pela salvação do nosso planeta, mas já estou terrivelmente descrente…Parece que este não é,já, o nosso planeta azul…Entretanto, vai-se assobiando…O meu abraço! CL

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