CARTA DE BRAGA – “de bosques e solidão” por António Oliveira

Dia 21 de Março comemorou quem soube disso e teve ânimo para o fazer o Dia Internacional da Árvore e da Floresta. Dizia a mensagem que recebi uns dias antes ‘O contacto directo com os bosque melhora a resposta imunológica do nosso organismo, baixa a tensão arterial, o ritmo cardíaco, o stress e a ansiedade, aumenta autoestima, favorece o descanso e aumenta a  capacidade de atenção e desenvolvimento mental e social das crianças’ .

Pouca é a diferença, relativamente a um qualquer folheto publicitário de um novo iogurte, uma nova papa para jovens e menos jovens, um refrescante novo de guacamole foi este o primeiro palavrão que me veio à cabeça e nem sei se haverá, mas sei, comprovadamente, que os aromas que lá se respiram são um potente antidepressivo. 

Lá, nos bosques, estamos no meio e, em contacto pleno com as madeiras, a das árvores mais entroncadas e ‘soberanas’, bem acima das outras mais frágeis e ‘humildes’, mas cumprindo todas a missão para que nasceram, a de nos aquecer com o fogo a propósito, e com a sombra a tapar os ardores do sol. 

E aprendi também que ‘A conselho ruim, sino de madeira’, qualquer coisa como ‘Nunca atentar ao que digam os idiotas’, e passaram-me ainda estes versos do poeta asturiano Ángel González, ‘Se tivéssemos a força suficiente/ para apertar como devido um pedaço de madeira,/ só nos restaria nas mãos/ um pouco de terra’.

A terra dos bosques e das árvores, por frutos serem também, frutos da terra, bem longe dos tóxicos fumos, alcatrões e cimentos urbanos!

Mas talvez seja bom pensar nos bosques como uma alternativa para a ‘epidemia de solidão’ que vai grassando por esse mundo fora, como mostra uma série de estudos e trabalhos levados a cabo por organizações e institutos em todos os continentes; um terço das pessoas tem muitos poucos amigos, ou mesmo nenhum em que possa confiar alguma coisa importante, mais os solitários que se negam a falar disso ou,  mais prejudicial, ‘É, principalmente, não ter com quem falar’, afirma o neurocientista argentino Mariano Sigman, um dos mais destacados da especialidade. 

Já Carl Jung tinha referido esta situação, ‘A solidão não é a ausência de pessoas, a solidão é a incapacidade de expressar o que é mais importante para cada um’, ou querendo explicar de outra maneira, diz Jung ‘A solidão é perigosa e viciante. Quando alguém dá conta da paz que lá existe, não quer mais lidar com pessoas’.

Mas a rodear tudo isto, existe sempre um silêncio imponente, aquele das conversas que nem quase existem, como se a pessoa tivesse uma qualquer mácula na vida ou no carácter, um problema que origina ver a solidão como sendo rejeiçãoestamos sós, cada vez mais sós, adiantam tais trabalhos e estudos, por os inquiridos confessarem ter-se sentido bastante ou muito sós, durante o último ano. 

Mas, nos últimos tempos, temos assistido a um confronto real, espalhado no (e pelo) mundo da comunicação, qualquer que ela seja, desde os mais modestos jornais até aos grandes ecrãs, entre o elogio da autenticidade, frente ao ‘domínio’ das máscaras, do conformismo e da hipocrisia; autenticidade a exigir uma procura diferente para cada um, mas difícil por arrastar também à questão do sentido da existência. 

Estas duas questões autenticidade e existência podem levar a um conflito interior, maiormente individual e solitário, bem longe do mundo exterior onde predomina a autoajuda corriqueira, mais a selfie narcisista dos ‘likes’ e das centenas de ‘amigos’. 

António M. Oliveira

Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor

 

 

 

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